Cortes de árvores sem compensação ambiental detalhada vira rotina na cidade de Porto Alegre, com impacto direto no clima com a redução dos espaços verdes. Obra de acesso da Rua Anita Garibaldi até a João Wallig, para dar acesso ao Shopping Iguatemi e Bourbon Country, começou no meio de Dezembro de 2021 e é mais um dos diversos projetos com licenciamento ambiental apressado e sem medidas compensatórias explícitas.
A duplicação da Rua Anita Garibaldi, na altura dos shoppings Iguatemi e do Bourbon Country, no bairro Passo D’areia, prevê a supressão de mais de 460 árvores. As obras iniciaram no final do ano passado, no dia 10 de dezembro. A área que acolhe a duplicação está situada em um dos quatro cantos do Country Club, cujo regime urbanístico foi alterado para a construção de empreendimentos imobiliários (PLCE 001/19). Aproveitando a cidade esvaziada pelas viagens de final de ano, a remoção de mais de 400 árvores acontece sem que a população seja informada corretamente sobre quais são as compensações ambientais previstas para a obra.
A supressão e o transplante de árvores devem seguir a Lei Complementar N° 757/15, a qual estipula detalhadamente medidas compensatórias. Toda a vida vegetal é protegida legalmente, ou seja, qualquer tipo de intervenção nas espécies de plantas, seja em área privada ou pública, deve ser regulamentada. No entanto, na placa informativa da intervenção de duplicação da Rua Anita Garibaldi não há um detalhamento das espécies vegetais existentes no local que foram suprimidas, assim como não há um detalhamento da compensação ambiental de contrapartida. A placa apenas informa que haverá o plantio de espécies não especificadas em via pública, sem quantificar as árvores ou detalhar o local.
Seguindo a Lei Complementar, e considerando a maturidade da pequena floresta localizada naquele canto do Country Club, a medida de compensação ambiental deveria ter levado em consideração a idade de cada espécie de grande porte assim como a análise detalhada das manchas vegetais. Contraditoriamente ao que afirmou Germano Bremm, Secretário do Urbanismo, Meio Ambiente e Sustentabilidade em Porto Alegre, em sua participação na COP 26, a 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas em Glasgow em Outubro de 2020, de que haveriam medidas em curso para conter a mudança climática. Bremm apresentou, na ocasião da conferência, um programa de redução da emissão de CO2, e um vídeo produzido pela prefeitura de Porto Alegre no qual se anuncia o plantio de árvores cujo programa, porém, se desconhece. Contudo, que circula pela cidade de Porto Alegre percebe mudança na paisagem com a derrubada drástica de uma quantidade de árvores significativa em pouco tempo.
O secretário insiste que a revisão do Plano Diretor da cidade está alinhada com as novas metas sustentáveis. O que não se constata pelas ações de fatiamento do plano diretor: privilegiam a realização de empreendimentos imobiliários, aumentando o potencial construtivo e de exploração econômica, e ainda abandonando a especificidade ambiental, seja no trato das águas, das vidas vegetais ou animais.
Porto Alegre registra a maior quantidade de licenciamentos ambientais já vista, técnicos contabilizam mais de 600 empreendimentos licenciados em seis meses.
Uma matéria publicada em de Julho de 2020 pelo Jornal Já contabiliza a maior quantidade de licenciamentos já vista em Porto Alegre: mais de 100 por mês, totalizando 626 empreendimentos em 6 meses. A velocidade do licenciamento significa, contudo, o não cumprimento da legislação e a falha na compensação ambiental devida. O desmonte da Secretaria Municipal do Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (SMAMUS) com a redução de técnicos que avaliam esse tipo de impacto é um dos fatores da compensação indevida. As ações de redução de emissão de CO2 alardeadas pela prefeitura e pelo secretário tais como soluções de sustentabilidade nas edificações como os “rooftops” verdes, desenhadas para acontecer num futuro próximo – porém desconhecido, servem mais como um paliativo e como ação publicitária do que ações efetivas contra a mudança climática quando colocamos na balança os impactos geridos diretamente pela prefeitura nos empreendimentos em curso e já licenciados.
O recuo da política ambiental na SMAMUS vem sendo construída a partir das gestões anteriores de Nelson Marchezan Jr. O desmonte paulatino da Secretaria ocorre também com a diminuição de servidores para a avaliação das solicitações. A mudança na regulamentação das solicitações — aprovada na gestão de Marchezan — alterou para a autorização automática após 60 dias caso não haja avaliação por um técnico. Ou seja, a municipalidade estabelece o descontrole dos impactos na sociobiodiversidade de Porto Alegre — o que corresponde a um modelo de “autolicenciamento”. Sem cumprir com a responsabilidade ambiental e social, as empresas multiplicam os lucros e privilégios às custas dos impactos que recaem sobre o cotidiano da população.
O impacto climático da alteração de uso do solo urbano em relação à cobertura vegetal é grande. As árvores e raízes contribuem para a contenção das encostas em terrenos planos ou acidentados e a permeabilidade do solo contribui com a drenagem evitando enxurradas. As diversas espécies de animais que constituem a fauna das regiões onde se ampliam as cidades dependem das árvores para procriarem, se abrigarem, e equilibrarem a cadeia alimentar. Além disso, as árvores formam bolsões de umidificação e refrigeração do ambiente, podendo-se verificar que a sombra das árvores reduz a temperatura do ambiente em até 5°C. O desequilíbrio e a redução da cobertura vegetal adequada tem sido conferido em desastres urbanos recentes (como em Belo Horizonte, 2019) e também rurais, como as enchentes na Bahia (dezembro de 2021). Em Porto Alegre poderemos testemunhar, nos próximos anos, a alteração da temperatura em várias localidades pelo déficit gerado na supressão até novas árvores crescerem, caso sejam replantadas.
O discurso que orienta a pressa desses licenciamentos é de que é preciso recuperar a economia em meio à pandemia. O licenciamento sem a fiscalização devida e a diretiva de que os empreendimentos comecem a construir no ano em que foram licenciados reforçam que diante de tantos privilégios concedidos às empresas construtoras, a sociedade civil não tem sido escutada e respeitada. Os veículos legais de participação social como o Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano Ambiental (CDMUA) têm sido ocupados por pessoas alinhadas com a política apressada do governo de Sebastião Melo, e a SMAMUS infelizmente tem sido absolutamente autoritária na condução de espaços que deveriam ser democráticos e funcionar efetivamente como contato entre a sociedade civil e o poder público, tendo a sociedade civil as devolutivas respeitosas aos apontamentos, estudos e queixas realizados. Urge uma condução democrática e respeitosa com as demandas e singularidades de cada bairro, para que se possa, de fato, realizar ações de controle da mudança climática e diminuição dos efeitos nefastos de nossos modos de vida na cidade.
Saiba como denunciar cortes de árvores indevidos em sua vizinhança:
De acordo com Cláudia Ávila, integrante do setor jurídico do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), as denúncias podem ser feitas em diversos órgãos. Qualquer cidadão, portanto, quando perceber irregularidades em supressão de árvores e áreas verdes pela prefeitura pode recorrer aos canais responsáveis pelo meio ambiente em Porto Alegre e do RS. As denúncias demandam a escuta da sociedade civil, e apoiam na luta para reverter o aparelhamento desses órgãos pela iniciativa privada capitalista e poluidora. Ainda, todo o habitante de Porto Alegre pode solicitar informações sobre os documentos que autorizam a supressão dos vegetais.
Veja abaixo os canais para denúncias e para pedidos de informação em Porto Alegre/RS:
- Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA). Número de telefone: 0800 061 8080, atendimento de segunda à sexta, das 07h00 às 19h00. E-mail para contato: linhaverde.sede@ibama.gov.br. Aqui é possível verificar a unidade do Ibama mais próxima de sua cidade. Em Porto Alegre, os telefones para contato são: (51) 3214-3401, 3214-3470 e 3214-3480 e os e-mails são: supes.rs@ibama.gov.br e gabinete.rs@ibama.gov.br.
- Secretaria Municipal do Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade de Porto Alegre (SMAMUS). Telefone para contato: (51) 3289.7500. E-mail para contato: smams@portoalegre.rs.gov.br. Endereço e horário de atendimento: Rua Luiz Voelcker, 55. Bairro Três Figueiras. Porto Alegre, RS, De segunda a sexta-feira, das 8h30min às 12h e das 13h30 às 18h.
- Fundação Estadual de Proteção ao Meio Ambiente Henrique Luiz Roessler (FEPAM). Telefones para contato: 3288.9444; 3288.9544 e 3288.9451. E-mail para contato e denúncias: denuncia@fepam.rs.gov.br. Localizado na Av. Borges de Medeiros 261 em Porto Alegre, RS. Outras formas de contato para denúncias podem ser acessadas aqui.
- Ministério Público – Promotoria de Justiça e de Defesa do Meio Ambiente de Porto Alegre. Telefone para contato: (51) 32958860. E-mail para contato: meioambiente@mprs.mp.br. Endereço: Rua Santana, 440/Torre B 6º Andar, Bairro Santana, Porto Alegre/RS.
- Central de Atendimento ao Cidadão. Telefone para contato: 156. E-mail para pedido de informação: 156poa@portoalegre.rs.gov.br. Aplicativo disponível para os serviços Android e iOS: 156+POA. OS serviços ficam disponíveis 24h por dia.
Precisamos de mais verde e respeito com a natureza.
Excelente matéria! Como integrante do COMAM – Conselho Municipal de Meio Ambiente, representando a AGAPAN – Associação Gaúcha de Proteção ao Ambienta Natural, testemunho o sucateamento da Secretaria de Meio Ambiente. Viceja a mentalidade arboricida – o Secretário de Meio Ambiente anterior foi processado por improbidade administrativa pelo abandono do Viveiro Municipal, até hoje inoperante. Não há política de arborização em execução em Porto Alegre. O Fundo de Meio Ambiente é desviado de sua finalidade, as diretrizes aprovadas no Conselho não são seguidas – há vários anos está reservado dois milhões de reais para a construção das sedes e cercamento das Unidades de Conservação, mas nada foi aplicado. O Secretário se preocupa mais em liberar novas construções do que zelar pelo Meio Ambiente da capital gaúcha. A patrola no COMAM e o citado CMDUA – Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano e Ambiental esmaga as representações sociais e ambientais – recentemente o secretário Germano chegou a ameaçar com processo judicial a ambientalista advogada Michela Rian pelas críticas feitas. Os tiranetes locais são incentivados pelo ‘destruidor-mor’ do Brasil, o psicopata nazista que infelicita o Brasil.