Em meio à mudança de chefia do Jardim Botânico de Porto Alegre, Governo do RS lança consulta pública para avançar com a privatização

camiseta com dizeres "A fzb não tem preço, tem valor!!"

A data limite para envio de contribuições da sociedade civil é 11 de fevereiro de 2022 e a previsão é de que ainda neste trimestre o governo lance edital para entregar a área pública para a iniciativa privada

Extinções das fundações geram atrocidades para o desenvolvimento do Brasil. Foto: Heitor Jardim

O Jardim Botânico da cidade de Porto Alegre, Rio Grande do Sul, é um espaço de natureza em meio à metrópole, dedicado a proporcionar ao cidadão porto alegrense experiências que ensinam. Entre as atividades comuns ao local, estão o estudo em prol da conservação de espécies vegetais nativas do RS, principalmente aquelas ameaçadas de extinção, pesquisas e ações de educação ambiental. A área de 36 hectares permite, além da realização de piqueniques pelos visitantes, trilhas e apreciação de paisagens como lagos e canteiros de flores, visitas ao Museu de Ciências Naturais (o qual inclui o Serpentário), a participação em atividades educativas e a compra de mudas no viveiro de plantas. O local demonstra autonomia de gestão dessa Unidade de Conservação, a qual já tradicionalmente cobra um valor simbólico de ingresso em prol de ajudar em sua manutenção. 

Ainda assim, foi aberta em dezembro de 2021 uma consulta pública sobre a concessão do Jardim Botânico à Iniciativa Privada. Segundo informações do governo do RS, o edital de concessão deverá ser lançado no primeiro trimestre de 2022 e o leilão está previsto para o segundo trimestre de 2022. Divulgado no Diário Oficial do Estado no dia 28 de dezembro de 2021, o aviso de consulta pública para o conhecimento da população acerca dos estudos, minutas de contrato e do edital de concessão de Porto Alegre, propõe análise e retorno popular até o dia 11 de fevereiro de 2022, por meio do formulário disponível aqui. Além disso, uma Audiência Pública será realizada em 03/02 de 2022, entre 9h e 12h, com participação presencial no Auditório do Centro Administrativo Fernando Ferrari — Av. Borges de Medeiros, 1501, térreo, Porto Alegre/RS.  Para quem não possa acompanhar no local, haverá transmissão no canal do YouTube da Secretaria de Planejamento, Governança e Gestão do estado.

A concessão do parque teve seu projeto arquitetado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), com apoio do consórcio Araucárias e do Instituto Semeia, com coordenação da Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura (SEMA), da Procuradoria-Geral do Estado (PGE), da Secretaria de Parcerias e Secretaria de Planejamento, Governança e Gestão. Mesmo formato utilizado para outras áreas a partir de um programa criado pelo Governo Federal para privatização de áreas públicas, que não ocorre sem a resistência popular neste processo, como é o caso do Parque do Jalapão em que o governo do estado do Tocantins desistiu da concessão frente à onda de protestos e da denúncia de desrespeito ao processo de Consulta Livre, Prévia e Informada às populações quilombolas da região que seriam atingidas pela privatização.

Ainda em 2015, apoiadores realizaram abraço ao Jardim Botânico de Porto Alegre em protesto contra a concessão. Foto: Heitor Jardim

Ainda em janeiro de 2021, vários parques nacionais e estaduais foram adicionados ao “Programa de Estruturação de Concessões de Parques Naturais” do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Por meio da consultoria da autarquia, o Governo Federal busca incentivar os governos estaduais a entregar para a iniciativa privada as áreas públicas. O programa é financiado por empresas como a Natura. O projeto do BNDES é voltado para a desestatização de serviços de visitação de Parques Naturais, mas para além disso alcança a proteção e gestão desses parques. É importante ressaltar que chamar desestatização significa o velho conhecido termo: privatização. Na prática, o projeto não é apenas para estruturar o turismo, mas para privatizar as áreas naturais. 

Agora, o governo do estado altera a chefia do Jardim Botânico e do Museu de Ciências Naturais colocando nas mãos de Patrícia Witt, nomeada no Diário Oficial  do estado do Rio Grande do Sul nesta sexta-feira, 21, para a Secretária do Meio Ambiente e Infraestrutura. Ela já é conhecida pela comunidade do Lami, na zona sul de Porto Alegre, por ter fechado a reserva para o público e enfrentou a resistência por restringir o acesso, inclusive, a pescadores que têm a sua subsistência a partir da relação com aquela área. Além disso, o dia também amanheceu com a nomeação no Diário Oficial de Ivo Lessa, que já foi consultor de Meio Ambiente para a Federação de Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul).

Para Fernando Costa, do Conselho Diretor da Amigos da Terra  Brasil (ATBr), “A novidade acaba com a dúvida das intenções do governo de Eduardo Leite e a relação promíscua com o agronegócio, tendo zero compromisso com a participação e a defesa dos bens comuns”.

O medo de extinção da originalidade do JB de POA está instaurado. Foto: Heitor Jardim

Em 1953, foi aprovada a Lei nº 2136, a qual demarcava um espaço de terra dedicado à criação de um Jardim Botânico em Porto Alegre. Dessa forma, foi então criada, pelo governador da época, Ildo Meneghetti, uma comissão para arquitetar o plano inicial de desenvolvimento do parque. O estudo foi apresentado em 1956 e o Irmão Teodoro Luis foi o escolhido para gerir os trabalhos de implantação do projeto. No dia 10 de setembro de 1958, o Jardim Botânico foi aberto ao público. Após décadas de funcionamento, em 2003, a Lei nº 11.917 estabeleceu o parque como Patrimônio Cultural do Estado do Rio Grande do Sul e, atualmente, o espaço é considerado um dos cinco maiores jardins botânicos brasileiros em posse de um acervo considerável da flora regional, possuindo categoria A na classificação. Nota A é a máxima na classificação de jardins botânicos nacionais e internacionais, e esta é concedida apenas a raros espaços, justamente em função de sua excelência de atividades desenvolvidas. 

A luta em defesa da Fundação Zoobotânica (FZB), que administra o Jardim Botânico, está viva desde 2015. Naquela época, as até então denúncias de desmonte culminaram no pacote propondo a extinção de 11 órgãos ligados ao Executivo, que foi enviado à Assembleia Legislativa, em novembro de 2016, pelo ex-governador José Ivo Sartori. O decreto de extinção da FZB, assinado por Sartori, determina que as obrigações e os servidores estáveis da fundação sejam incorporados no quadro da então Secretaria Estadual do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, atual Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura. Contudo, tramita na Justiça uma perspectiva contrária, que ainda cabe recurso. O Ministério Público estadual defende que a extinção da FZB não deve ocorrer até que o Palácio Piratini apresente um plano de como se dará a transferência dos bens e dos servidores do Jardim Botânico e do Museu de Ciências Naturais, com a garantia da manutenção dos trabalhos. 

Ainda em setembro de 2021, o Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais lançou uma carta aberta em que denuncia o estrangulamento de instituições que cumprem funções essenciais, como o Jardim Botânico, o Museu de Ciências Naturais e o Zoológico de Sapucaia do Sul (RS). O documento também destaca a continuidade das políticas neoliberais do governo Sartori pelo atual governo de Eduardo Leite sobre as questões ambientais e questionam a argumentação de “enxugamento da máquina administrativa” usada para a privatização: “São gastos proteger a biodiversidade e as pesquisas essenciais associadas a um tema que representa acordos internacionais assinados pelo Brasil?”.

No dia 29 de janeiro de 2021, foi lançada a PORTARIA SEMA nº 23, responsável por, após a extinção da Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul, estabelecer a Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura (SEMA) como nova gestora do Jardim Botânico. Meses depois, em dezembro de 2021, a conta chegou, e o resultado foi o Edital de Concessão. Para o Amigos da Terra Brasil, no caso do Jardim Botânico, a questão que mais preocupa é a falta de divulgação dos processos atualmente existentes dentro do parque, para que a população saiba que este espaço não é apenas um parque de lazer (um “parquinho” para passear em fins de semana).

“O JB é um local de estudos, de pesquisa, é um local de construção de conhecimento, que acumula conhecimento, e por isso tem que ser estatal”, explica Fernando Costa.

Trata-se de um local de conservação da flora gaúcha e, principalmente, de pesquisas que servem de apoio a diversas atividades nacionais e internacionais. 

A luta pela causa do Jardim Botânico é cada vez mais necessária. Foto: Heitor Jardim

O Jardim Botânico, da mesma forma que o MCN (Museu de Ciências Naturais), existe graças ao seu quadro de profissionais especializados e que atuam diretamente em suas especialidades há décadas. Não são trabalhadores que podem ser encontrados em qualquer ação de contratação ampla. A concessão do parque está dentro do quadro de extinção da FZB e seu processo, portanto, vem ao encontro de interesses privados que desejam se apoderar de espaços públicos. A Amigos da Terra Brasil compreende que conceder o parque significaria claramente a extinção de atividades que visam ampliar a base de conhecimentos científicos e conservação de elementos da biodiversidade de interesse local e internacional. Dessa forma, é possível enxergar que, na prática, o que se observa no caso de extinção da Fundação Zoobotânica e na concessão de seus espaços (aliás ninguém fala o que será feito do MCN e suas atividades que estão dentro do JB),  é o melhor exemplo de negacionismo do conhecimento e do saber que vem se instalando no Brasil nos últimos anos, mas amplamente incrementado no governo federal atual e expandido pelos Estados.

A ATBr deixa o alerta para a população em geral sobre a realidade do sistema de concessão de espaços públicos. Isso porque é imperativo que o povo se manifeste e continue tendo a sua disposição estes espaços em sua verdadeira função. Esta engloba a pesquisa, o lazer, a educação ambiental, entre outros. Não podem existir apenas para satisfação de alguns interesses privados, que poderão conduzir à total descaracterização da instituição e da perda de seus predicados e classificação internacional.

“Locais como o JB precisam ser estatais justamente pela produção de conhecimento que eles geram, não pode ser privado. Esse conhecimento precisa ser público, pois nele existe um investimento público em capacitação em profissionais, em preservar essas informações, essa biblioteca. Isso na mão das empresas pode ser desvirtuado, nós não temos segurança de que uma empresa vai manter a ética e a preservação de algo que é importante para todos. É papel do Estado garantir isso”, completa Fernando Costa.

A ATBr acredita que é importante que o Jardim Botânico seja e permaneça um espaço público e que seja um local financiado e garantido pelo Estado. Isso é assegurar o conhecimento e a informação correta e pública, coisa que as empresas têm histórico de desvirtuar para o seu benefício próprio,  principalmente às empresas de licenciamento, as quais têm interesses diretamente ligados a essas informações e a esse conteúdo técnico. Nunca foi tão importante a Fundação Zoobotânica para nós.

Prefeitura de Porto Alegre (RS) inicia obra que pode acabar com a Prainha de Copacabana

Local  está  ameaçado  por uma obra do DMAE sem consulta popular. Impactos seriam amenizados se tivesse mais investimento

A Prainha de Copacabana (Avenida do Lami, próximo ao nº 23), em Belém Novo, extremo sul de Porto Alegre (RS), sofre com as consequências da construção do novo Sistema de Abastecimento de Água (SAA) Ponta do Arado. O Coletivo Preserva Belém Novo já denunciou que o DMAE (Departamento Municipal de Água e Esgotos), órgão da prefeitura da Capital, não realizou estudos prévios nem divulgou relatórios acerca dos possíveis impactos ambientais que  a construção poderia provocar. O fechamento da prainha atinge diretamente a população local, como o caso dos cerca de 40 pescadores da região que obtém do Rio Guaíba, nas margens da Praia de Copacabana, seu principal meio de subsistência.

Além do trecho da prainha que abarca o porto, onde os pescadores atracam seus barcos, a pracinha infantil, a única da região com brinquedos adequados, ao lado direito da praia de quem vem da Avenida do Lami, a qual, segundo moradores locais é muito usada pelas crianças da área, também irá sumir. Isso porque, além da falta de estudos próprios para a construção do SAA, sequer foi feita uma consulta pública prévia para compreender qual seria o melhor lugar para o posicionamento da estrutura. Nos últimos anos, a população  tem crescido consideravelmente na Zona Sul do município, muito devido à   expansão  de novos empreendimentos, loteamentos e condomínios na região (apenas o projeto de loteamento privado da Fazenda do Arado Velho tem previsão de aumentar em 70% os habitantes do bairro), pressionando, desta forma,  por um sistema de abastecimento de água maior e mais eficiente. “É uma obra extremamente necessária para o bairro Belém Novo e para diversos bairros por conta da melhoria no abastecimento de água, mas a forma como ela está sendo feita viola os direitos dos cidadãos”, explica a coordenadora do Conselho Local de Saúde, delegada da Região de Planejamento 8 e moradora de Belém Novo, Michele Rihan Rodrigues. O procedimento junto ao Ministério Público, a ser direcionado pela Promotoria da Habitação e Defesa da Ordem Urbanística, é o de número 01629.002.243/2021.

Moradores do entorno relatam incomodos com o barulho das obras no leito do rio pra passar a tubulação. Foto: Carol Ferraz/ Amigos da Terra Brasil

O projeto de ampliação do sistema de abastecimento de água começou a ser manifestado em 2013, contudo, apenas em 2020, após anos de sofrimento e prejuízos sofridos pela comunidade periférica, privadas de um serviço básico à vida , a obra começou. Poderia ser uma boa notícia, se não fosse o fato de que a população foi surpreendida por um cercamento da região, sem aviso prévio. “É um processo entre a Prefeitura e a comunidade totalmente desrespeitoso, já que a Prefeitura teve tempo de sobra  para poder vir aqui dialogar com a população, desde que está prevista essa obra, que começou a ser vista em 2013, e só o fez quando iniciou as obras”, explica Rodrigues, e acrescenta que o tal “diálogo” sequer foi de fato considerado. Nos encontros realizados em 2021, com a participação de uma pequena parcela da população local, o DMAE apenas informou que, nos próximos tempos, os moradores conviveriam com incômodos. “Hoje, a população acorda com barulhos na noite porque as obras acontecem dia e noite, com uma draga dentro do Guaíba abrindo o leito do rio pra passar a tubulação. Isso causa transtornos à saúde”.

Quando se trata da vida dos cidadãos locais, a situação é ainda mais grave. Segundo o pescador Rosemar Soares da Costa, morador da região de Copacabana há 15 anos: “A água daqui agora queima as pernas, queima os pêlos das pernas, cai tudo, só de entrar na água. Eu já nem entro porque sou diabético”. Ele explica que com o produto colocado na água do rio, nunca mais foi possível encontrar peixes na área.  Dessa forma, o pescador, há 10 anos regulamentado, precisa andar mais de 2 km para encontrar os peixes, presentes na água corrente e limpa do Rio Jacuí, pois a bacia de Copacabana está tomada pela poluição do DMAE. “Começaram em outubro de 2020 a fazer essas obras. Eu sei porque eles avisaram de uma reunião e eu participei. Naquela época eu cantei a pedra, perguntei: vão fazer teste da água, vão analisar a água, como vai ser? Eles disseram: tá tudo certo, tudo como deve. Até hoje não recebemos nenhum documento que prove”, destaca Michele Rihan Rodrigues. Ela diz ainda que os poucos que participaram da conversa foram tratados inclusive como ignorantes. A problemática da saúde da população motivou a coordenadora do Conselho Local de Saúde a denunciar a questão da balneabilidade deficiente para a Promotoria de Direitos Humanos, a qual foi redirecionada para a Promotoria do Meio Ambiente, sob número 01304.001.124/2021. No processo, Michele sublinha a “ausência de exames e/ou de acessibilidade aos resultados dos exames que demonstrem as condições de banho nos balneários”. Mesmo com moradores constatando os problemas, o processo foi arquivado. “Não adianta eles perguntarem pra mim o que eu acho da obra. A assistente social vinha perguntar, mas chega lá e fala o que ela pensa, não o que ela me perguntou aqui”, diz o pescador.

Pescadores da região relatam precisar se deslocar precisa andar mais de 2 km para encontrar os peixes devido aos químicos utilizados na área. Foto: Carol Ferraz / Amigos da Terra Brasil

“É uma área que a população infelizmente vai perder. Tem um aviso de que, a partir de segunda-feira, dia 17 de janeiro, o DMAE vai remover a pracinha infantil sem aviso prévio à população, sem dialogar antecipadamente sobre todas essas obras e os impactos que  isso tem na vida da população”, relata Rodrigues. A área de lazer será simplesmente desmontada, e a condução do processo vem sendo inclusive agressiva: “Chegaram aqui com as crianças no balanço, mandaram as crianças saírem porque eles iam desmanchar a pracinha. Aquilo me doeu”, contou o pescador  Rosemar Soares. Portanto, já é possível constatar que a situação da Prainha de Copacabana vai de mal a pior, um total descaso com a população e, também, movida pela ganância. Segundo uma moradora local que participou de uma das apresentações feitas pelo DMAE e conversou com um engenheiro, “com R$ 20 milhões a mais, seriam feitas duas adutoras e não seria necessário acabar com a praia. Vão fazer todos os canos novos puxando de uma adutora que já tem, em média 40 anos, sendo que a vida útil desse tipo de cano é de no máximo 50”. Dessa forma, o DMAE está economizando R$ 20 milhões  e acabando com a Praia de Copacabana.

Fernando Costa, do Conselho Diretor da Amigos da Terra  Brasil, sublinha que, “mais uma vez, estamos vendo a Prefeitura atuar de forma autoritária, e não participativa, usando de uma  obra de infraestrutura importante para cidade como palco para uma “higienização”. Ali, a cultura popular está sendo excluída e desrespeitada”. Ele explica que a Praia de Copacabana tem uma característica cultural que se relaciona com a cultura dos pescadores, com os moradores locais. Isso porque, ali não são comuns pessoas que iriam veranear ou frequentariam o lugar esporadicamente. Costa relata que, “apesar de tudo, a cidade se reinventa e cria espaços de cultura, e esses são os espaços preferidos da prefeitura para serem ”higienizados”, ”limpos” e excluídos do mapa cultural da cidade”.

A obra do SSA na Praia de Copacabana já foi usada como “moeda de troca” para a aceitação do Condomínio do Arado Velho, e a situação vem piorando. O conglomerado imobiliário tem um acordo com a prefeitura que garante esse empreendimento. Dessa forma, tem sido feito um esforço nos últimos tempos para garantir a alteração de leis, de regulamentações específicas para o empreendimento, movidas na Câmara de Vereadores em prol do lucro. “Como não poderia faltar, aparece aqui novamente a velha tática de dividir para conquistar. Se coloca a situação da Lomba do Pinheiro ou da falta de infraestrutura de abastecimento de água da cidade como se elas fossem de responsabilidade dos moradores de Belém Novo. Como se devessem abrir mão do seu espaço cultural para garantir que a população da Lomba do Pinheiro tivesse água”, coloca Fernando Costa. Ele destaca que esta tática é bem comum tanto na iniciativa privada, para especulação imobiliária, quanto na prefeitura, pelo prefeito Sebastião Melo, o qual usa desses artifícios imorais para garantir o seu governo com o desgoverno.

A Amigos da Terra se posiciona terminantemente contra essa atitude da Prefeitura e se coloca a favor do diálogo, da discussão de uma solução na qual os moradores sejam ouvidos. É imperativo que a população seja escutada e que não haja fatos consumados. A Prefeitura não pode assumir essa postura autoritária que vem construindo nesse pouco tempo de governo.

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Foto: Carol Ferraz / Amigos da Terra Brasil
Foto: Carol Ferraz / Amigos da Terra Brasil
Foto: Carol Ferraz / Amigos da Terra Brasil

Enquanto Porto Alegre arde nos 40 graus, mais de 400 árvores são cortadas na Zona Norte

Cortes de árvores sem compensação ambiental detalhada vira rotina na cidade de Porto Alegre, com impacto direto no clima com a redução dos espaços verdes. Obra de acesso da Rua Anita Garibaldi até a João Wallig, para dar acesso ao Shopping Iguatemi e Bourbon Country, começou no meio de Dezembro de 2021 e é mais um dos diversos projetos com licenciamento ambiental apressado e sem medidas compensatórias explícitas. 

A duplicação da Rua Anita Garibaldi, na altura dos shoppings Iguatemi e do Bourbon Country, no bairro Passo D’areia, prevê a supressão de mais de 460 árvores. As obras iniciaram no final do ano passado, no dia 10 de dezembro. A área que acolhe a duplicação está situada em um dos quatro cantos do Country Club, cujo regime urbanístico foi alterado para a construção de empreendimentos imobiliários (PLCE 001/19). Aproveitando a cidade esvaziada pelas viagens de final de ano, a remoção de mais de 400 árvores acontece sem que a população seja informada corretamente sobre quais são as compensações ambientais previstas para a obra. 

Imagem de satélite explicitando a maturidade da pequena floresta localizada naquele canto do Country Club. Foto: Google Imagens

A supressão e o transplante de árvores devem seguir a Lei Complementar  N° 757/15, a qual estipula detalhadamente medidas compensatórias. Toda a vida vegetal é protegida legalmente, ou seja, qualquer tipo de intervenção nas espécies de plantas, seja em área privada ou pública, deve ser regulamentada. No entanto, na placa informativa da intervenção de duplicação da Rua Anita Garibaldi não há um detalhamento das espécies vegetais existentes no local que foram suprimidas, assim como não há um detalhamento da compensação ambiental de contrapartida. A placa apenas informa que haverá o plantio de espécies não especificadas em via pública, sem quantificar as árvores ou detalhar o local. 

Seguindo a Lei Complementar, e considerando a maturidade da pequena floresta localizada naquele canto do Country Club, a medida de compensação ambiental deveria ter levado em consideração a idade de cada espécie de grande porte assim como a análise detalhada das manchas vegetais. Contraditoriamente ao que afirmou Germano Bremm, Secretário do Urbanismo, Meio Ambiente e Sustentabilidade em Porto Alegre, em sua participação na COP 26, a 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas em Glasgow em Outubro de 2020, de que haveriam medidas em curso para conter a mudança climática. Bremm apresentou, na ocasião da conferência, um programa de redução da emissão de CO2, e um vídeo produzido pela prefeitura de Porto Alegre no qual se anuncia o plantio de árvores cujo programa, porém, se desconhece.  Contudo, que circula pela cidade de Porto Alegre percebe mudança na paisagem com a derrubada drástica de uma quantidade de árvores significativa em pouco tempo.

O secretário insiste que a revisão do Plano Diretor da cidade está alinhada com as novas metas sustentáveis. O que não se constata pelas ações de fatiamento do plano diretor: privilegiam a realização de empreendimentos imobiliários, aumentando o potencial construtivo e de exploração econômica, e ainda abandonando a especificidade ambiental, seja no trato das águas, das vidas vegetais ou animais. 

Porto Alegre registra a maior quantidade de licenciamentos ambientais já vista, técnicos contabilizam mais de 600 empreendimentos licenciados em seis meses. 

Uma matéria publicada em de Julho de 2020 pelo Jornal Já contabiliza a maior quantidade de licenciamentos já vista em Porto Alegre: mais de 100 por mês, totalizando 626 empreendimentos em 6 meses. A velocidade do licenciamento significa, contudo, o não cumprimento da legislação e a falha na compensação ambiental devida. O desmonte da Secretaria Municipal do Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (SMAMUS) com a redução de técnicos que avaliam esse tipo de impacto é um dos fatores da compensação indevida. As ações de redução de emissão de CO2 alardeadas pela prefeitura e pelo secretário tais como soluções de sustentabilidade nas edificações como os “rooftops” verdes, desenhadas para acontecer num futuro próximo – porém desconhecido, servem mais como um paliativo e como ação publicitária do que ações efetivas contra a mudança climática quando colocamos na balança os impactos geridos diretamente pela prefeitura nos empreendimentos em curso e já licenciados.  

O recuo da política ambiental na SMAMUS vem sendo construída a partir das gestões anteriores de Nelson Marchezan Jr. O desmonte paulatino da Secretaria ocorre também com a diminuição de servidores para a avaliação das solicitações. A mudança na regulamentação das solicitações — aprovada na gestão de Marchezan — alterou para a autorização automática após 60 dias caso não haja avaliação por um técnico. Ou seja, a municipalidade estabelece o descontrole dos impactos na sociobiodiversidade de Porto Alegre — o que corresponde a um modelo de “autolicenciamento”. Sem cumprir com a responsabilidade ambiental e social, as empresas multiplicam os lucros e privilégios às custas dos impactos que recaem sobre o cotidiano da população.

O impacto climático da alteração de uso do solo urbano em relação à cobertura vegetal é grande. As árvores e raízes contribuem para a contenção das encostas em terrenos planos ou acidentados e a permeabilidade do solo contribui com a drenagem evitando enxurradas. As diversas espécies de animais que constituem a fauna das regiões onde se ampliam as cidades dependem das árvores para procriarem, se abrigarem, e equilibrarem a cadeia alimentar. Além disso, as árvores formam bolsões de umidificação e refrigeração do ambiente, podendo-se verificar que a sombra das árvores reduz a temperatura do ambiente em até 5°C. O desequilíbrio e a redução da cobertura vegetal adequada tem sido conferido em desastres urbanos recentes (como em Belo Horizonte, 2019) e também rurais, como as enchentes na Bahia (dezembro de 2021). Em Porto Alegre poderemos testemunhar, nos próximos anos, a alteração da temperatura em várias localidades pelo déficit gerado na supressão até novas árvores crescerem, caso sejam replantadas.

O discurso que orienta a pressa desses licenciamentos é de que é preciso recuperar a economia em meio à pandemia. O licenciamento sem a fiscalização devida e a diretiva de que os empreendimentos comecem a construir no ano em que foram licenciados reforçam que diante de tantos privilégios concedidos às empresas construtoras, a sociedade civil não tem sido escutada e respeitada. Os veículos legais de participação social como o Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano Ambiental (CDMUA) têm sido ocupados por pessoas alinhadas com a política apressada do governo de Sebastião Melo, e a SMAMUS infelizmente tem sido absolutamente autoritária na condução de espaços que deveriam ser democráticos e funcionar efetivamente como contato entre a sociedade civil e o poder público, tendo a sociedade civil as devolutivas respeitosas aos apontamentos, estudos e queixas realizados. Urge uma condução democrática e respeitosa com as demandas e singularidades de cada bairro, para que se possa, de fato, realizar ações de controle da mudança climática e diminuição dos efeitos nefastos de nossos modos de vida na cidade.  

Corte de mais de 460 árvores em frente ao Shopping Iguatemi inicia duplicação da Rua Anita Garibaldi. 
Foto: Isabelle Rieger / Amigos da Terra Brasil 
Foto: Isabelle Rieger / Amigos da Terra Brasil 
Foto: Cris Ribas
Saiba como denunciar cortes de árvores indevidos em sua vizinhança:

De acordo com Cláudia Ávila, integrante do setor jurídico do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), as denúncias podem ser feitas em diversos órgãos. Qualquer cidadão, portanto, quando perceber irregularidades em supressão de árvores e áreas verdes pela prefeitura pode recorrer aos canais responsáveis pelo meio ambiente em Porto Alegre e do RS. As denúncias demandam a escuta da sociedade civil, e apoiam na luta para reverter o aparelhamento desses órgãos pela iniciativa privada capitalista e poluidora. Ainda, todo o habitante de Porto Alegre pode solicitar informações sobre os documentos que autorizam a supressão dos vegetais. 

Veja abaixo os canais para denúncias e para pedidos de informação em Porto Alegre/RS: 

  • Secretaria Municipal do Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade de Porto Alegre (SMAMUS). Telefone para contato: (51) 3289.7500. E-mail para contato: smams@portoalegre.rs.gov.br. Endereço e horário de atendimento: Rua Luiz Voelcker, 55. Bairro Três Figueiras. Porto Alegre, RS, De segunda a sexta-feira, das 8h30min às 12h e das 13h30 às 18h. 
  • Ministério Público – Promotoria de Justiça e de Defesa do Meio Ambiente de Porto Alegre. Telefone para contato: (51) 32958860. E-mail para contato: meioambiente@mprs.mp.br. Endereço: Rua Santana, 440/Torre B 6º Andar, Bairro Santana, Porto Alegre/RS. 
  • Central de Atendimento ao Cidadão. Telefone para contato: 156. E-mail para pedido de informação: 156poa@portoalegre.rs.gov.br. Aplicativo disponível para os serviços Android e iOS: 156+POA. OS serviços ficam disponíveis 24h por dia. 

Torres do Inter: especulação imobiliária avança na Orla da cidade de Porto Alegre/RS

Movimentos sociais, quilombolas, grupos de torcedores e torcidas organizadas do Inter, contrários ao projeto que institui duas torres gigantes no terreno do Estádio Beira Rio, realizaram reunião em 28 de dezembro de 2020 para pensar estratégias de resistências. Foto: Isabelle Rieger / Amigos da Terra Brasil

“As pessoas são expulsas do Quilombo Lemos, localizado próximo ao terreno do Beira Rio, na mesma movimentação da expulsão das pessoas da Ilhota para a Restinga nos anos 60, para fins do ‘progresso’. Chega com atropelo uma contrapartida que não contempla nada na situação de quem mora no entorno.” – Liderança do Quilombo Lemos

Previsto para entrar em votação na Câmara dos Vereadores de Porto Alegre, o projeto de lei complementar 004/19, que inclui um artigo na Lei 1.651, sancionada em 1956, institui as duas maiores torres do Rio Grande do Sul no terreno do Estádio Beira-Rio, cedido pelo Governo Brizola para a construção de um espaço de esporte e lazer. Como contrapartida para usar o espaço que hoje é ocupado por quilombos, escolas de samba e população em geral, o megaempreendimento movido pela especulação imobiliária coloca a duplicação da rua José de Alencar, a restauração do Asilo Padre Cacique, a remodelação do posto de saúde Santa Marta, no centro da Capital, e a instalação de um projeto cicloviário. Nada é falado sobre o terreno de escolas de samba tradicionais que integram o Carnaval de Porto Alegre e os quilombos que compõem a região – que provavelmente serão despejados e forçados a viver em regiões mais periféricas; sobre como ficará a situação do pôr do sol e da luminosidade no bairro, do aumento do número de veículos circulando, causando congestionamento; ou sobre os impactos ambientais causados pelos edifícios gigantes.

O projeto pretende autorizar a venda do terreno que hoje é o estacionamento do estádio, em frente à estátua do Fernandão e do Portão 7, ou seja, um terreno que pertence ao complexo do Beira Rio. Movimentos sociais, quilombolas, grupos de torcedores e torcidas organizadas do Inter contrários ao projeto querem evitar que aquele terreno seja vendido para a empreiteira construir prédios de luxo para moradia e escritórios de trabalho. Ou seja, prédios altamente elitizados, quem morará? Quem vai lucrar? Por que não houve debate sincero com a torcida colorada sobre o que fazer com um pedaço do seu patrimônio? Para o povão colorado que vai ver o jogo ao redor do estádio, que tenta entrar, vai diminuir consideravelmente o espaço e a capacidade de pessoas, e sabemos como é preconceituosa, racista, machista a “segurança” da elite. Se o território for vendido, o Inter e a torcida perderão para sempre um local que podem usar – e que está sendo vendido para a iniciativa privada a preço de banana. 

Em reunião realizada em 28 de dezembro pelos movimentos contrários à instalação das torres no terreno do Internacional, foi reiterada a necessidade de não aceitar nenhuma contrapartida que não beneficiasse toda a população do entorno. Para isso, estão sendo reivindicadas a regularização fundiária dos quilombos localizados nos arredores, a realização de um estudo de impactos ambientais e a entrega legal dos terrenos das escolas de samba para estas. Sendo assim, é visível o alinhamento do poder público com a burguesia, já que privilegiam nas compensações do projeto apenas serviços para a classe média, como o alargamento de uma faixa para automóveis. Nada se é falado sobre a construção de moradias populares para de quem será tirada a casa. 

O que se vê na cidade de Porto Alegre é uma constante entrega dos espaços públicos para a iniciativa privada. Como observado neste projeto, é a alteração do regime urbanístico em detrimento do ambiente e da sociedade, garantindo ganhos milionários ao proprietário privilegiado, da indústria da construção civil e da especulação imobiliária.

Situação semelhante ocorreu com a Fazenda do Arado Velho, uma área 4 vezes o tamanho do Parque Farroupilha (Redenção), no bairro Belém Novo, no Extremo Sul de Porto Alegre, em que foram realizadas incessantes mudanças do Plano Diretor da cidade para privilegiar este e outros tantos empreendimentos imobiliários, empreiteiras e construtoras. Essa especulação imobiliária fez o Barra Shopping Sul e o Pontal do Estaleiro, faz o novo projeto do Cais Mauá. Como já é de praxe, o Estado cede o espaço para a iniciativa privada sem ver a cor do dinheiro, tudo passa para as empresas. Estima-se que, por exemplo, no caso do Beira-Rio, o terreno valha R$1 bilhão. Assim, essa privatização não é benéfica nem para a população, nem para o poder público, só para os bolsos de quem detém os direitos de posse dos empreendimentos. 

É necessário, portanto, mobilizar-se contra mais uma entrega do patrimônio porto-alegrense para a iniciativa privada. Não às torres do Inter! Não ao PLC 004/19!

Movimentos contrários à implantação das duas maiores torres do Rio Grande do Sul. Fotos: Isabelle Rieger / Amigos da Terra Brasil

Festival Ambiental POA 2021: Carta Compromisso com a Porto Alegre ambiental e urbana que queremos

Documento foi debatido e redigido durante o 1º Festival Ambiental de Porto Alegre (RS), que aconteceu no final de Novembro. Entidades, entre elas a Amigos da Terra Brasil, assumem compromisso de priorizar a defesa do patrimônio socioambiental da capital gaúcha.

Leia, na íntegra, carta compromisso divulgada no Portal Sul 21

Coletivo de entidades (*)

Eu assumo o compromisso formulado durante o Festival Ambiental de POA 2021 para priorizar a defesa do patrimônio socioambiental da cidade de Porto Alegre e região metropolitana em concordância com a agenda ambiental e urbanística a seguir proposta, assim como trabalhar para reverter a vulnerabilidade dos mais carentes e reconhecer a luta nos territórios, já protagonizada pelos povos originários de diversas etnias e quilombolas.

Por esses objetivos, comprometo-me a dialogar, debater, propor e defender um plano urbanístico e ambiental para a cidade, que respeite os princípios condicionantes da atuação da administração pública e o atendimento dos interesses da população, efetivando assim a tão almejada gestão democrática da cidade. Visando reduzir as desigualdades sociais e assegurar a concretização dos direitos fundamentais garantidos pelo ordenamento jurídico pátrio, priorizo os seguintes temas para a agenda ambiental e urbanística do Porto Alegre:

– defesa e efetivação do direito ao ambiente saudável previsto na Constituição Federal, em seu artigo 225, por meio do monitoramento da qualidade do ar em todos os territórios da cidade como forma de avaliar e propor regras e políticas públicas que visem a melhoria das condições do ar para a redução de danos à saúde da população e à saúde pública. Garantia da circulação do ar e da umidade em todos os territórios da cidade, efetivando e construindo políticas públicas que resguardem as condições de conforto térmico para todos além da redução de danos à saúde da população e à saúde pública;

– defesa e efetivação do direito ao acesso e à qualidade da água, bem público essencial, como meio de materializar o direito fundamental à vida, nas suas mais variadas formas e usos. Buscando na diversidade da população, de seus territórios e de suas realidades, a lógica fundante do equilíbrio ao acesso à água nos variados espaços da cidade. Nesse sentido, enfatizo a urgente necessidade de defesa do Guaíba enquanto fonte de água e vida para boa parte da população sul-rio-grandense, que deve ser concretizada por todos os entes públicos competentes, em aliança com a sociedade civil, num esforço sociopolítico premente para garantia de condições de vida para as futuras gerações;

– proteção da biodiversidade do município, implantando-se de forma efetiva a Lei Complementar 679/2011, que institui o Sistema Municipal de Unidades de Conservação da Natureza de Porto Alegre (SMUC – Poa), com a valorização de suas áreas e ampliação das áreas naturais, incluindo corredores ecológicos previstos em lei, com programas municipais que visem reduzir a degradação dos ecossistemas naturais e os riscos de extinção da flora e da fauna;

– defesa e efetivação do direito ao ambiente saudável previsto na Constituição Federal, em seu artigo 225, por meio da elaboração de políticas públicas que resguardem, ampliem, monitorem, sinalizem e fiscalizem as áreas de preservação permanente (APP) da cidade em sua integralidade e da forma mais protetiva possível, em especial ao longo de cursos d’água como nas nascentes, arroios e em todas as margens do Guaíba;

– ampliação do plantio de árvores nativas na área urbana e a qualificação do manejo da vegetação, com a retomada deste serviço, por equipes de servidores concursados e qualificados, integrantes dos órgãos ambientais, fortalecendo-se a primeira Secretaria de Meio Ambiente do Brasil (SMAM), atualmente esvaziada em suas funções de proteção e gestão ambiental;

– retomada da produção de mudas nativas e demais trabalhos historicamente desenvolvidos pelo Viveiro Municipal de Porto Alegre;

– ampliação de investimentos para seleção, contratação e qualificação dos quadros técnicos de servidores públicos nas estruturas dos órgãos ambientais em todas as esferas do poder público, priorizando a realização de atividades de planejamento, licenciamento e fiscalização por servidores concursados;

– rejeição dos projetos recentemente propostos pelo executivo municipal para modificação dos regimes urbanísticos do Centro de Porto Alegre (PLCE 023/2021), de construção de torres de natureza residencial e comercial ao lado do estádio Beira Rio (PLCE 04/2019), da Fazenda Arado Velho em Belém Novo (PLCE 024/2021), que reduz a Zona Rural e a Área de Proteção do Ambiente Natural (APAN) para autorizar maior número de lotes em área de relevante interesse cultural, histórico, arqueológico e socioambiental da capital;

– rejeição de qualquer projeto de lei ou ação governamental que fira direitos humanos, direitos socioambientais e direitos relacionados à participação popular obrigatória e qualificada nos processos e discussões que envolvam a cidade, em especial àqueles que afetam os povos originários e quilombolas;

– criação de um Fórum de Entidades, Coletivos e Movimentos Socioambientais da cidade de Porto Alegre;

– reconhecimento da Assembleia Permanente de Entidades em Defesa do Meio Ambiente do RS (APEDEMA-RS) como instância legítima para indicar as ONGs, comprometidas com a pauta do setor ambientalista, para ocupar as quatro vagas das entidades no Conselho Municipal de Meio Ambiente de Porto Alegre (COMAM), como já reconhecido no Conselho Estadual de Meio Ambiente (CONSEMA-RS);

– exigir que se adote todas as medidas para garantir o uso seguro das praias de Porto Alegre, em especial nos balneários de Belém Novo e Lami, resguardando o direito da cidadania à informação clara e acessível, por todos os meios, sobre as condições de balneabilidade ao longo de todo o ano e os impactos negativos para a saúde no caso de utilização das águas quando estas estiverem impróprias para banho;

– aprimoramento de políticas públicas de manejo e destinação de resíduos com a garantia da participação da sociedade na construção de mecanismos que valorizem e insiram os trabalhadores autônomos e cooperativas de catadores e recicladores na definição de novas alternativas para a cidade e para a cidadania, visando a redução, coleta, separação, destinação e reaproveitamento máximo dos resíduos sólidos. Na esfera municipal urge a revogação das leis municipais nº 728/2014 e nº 10.531/2008 que proíbem a atividade de trabalhadores autônomos, em flagrante ilegalidade, considerando o que determina a Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº 12.305/2010, que em seu art. 18, § 1º, inciso II, prioriza acesso aos recursos da União para os municípios que implantem a coleta seletiva com a participação de cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa renda)

– promoção de uma gestão pública, compartilhada com a sociedade civil e corpo científico-social-cultural, para a ocupação cultural ambientalmente responsável do Cais do Porto de Porto Alegre, com programação acessível para todos os públicos, reafirmando a posição da UFRGS e do Observatório das Metrópoles. São necessárias garantias de que este espaço embrionário da cidade mantenha sua essência pública sob todos os aspectos legais e fáticos, com o resguardo do direito ao acesso e ao usufruto pleno daquela área por toda a cidadania. É primordial objetivar a integração do Cais ao Centro Histórico, mesclando a promoção, inclusão e integração social das diversas classes, camadas e grupos culturais que vivem e constroem a cidade. Descartamos qualquer hipótese de uso residencial da área do Cais do Porto;

– respeito e efetivação da regra prevista na Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), incorporada na legislação nacional pelo Decreto 10.088/19 que, no seu artigo 7º prevê a obrigatória participação dos povos na formulação, aplicação e avaliação dos planos e programas que possam afetá-los diretamente, mediante consulta livre, informada e de boa-fé  (através de audiências públicas, apresentações, conferências, debates, consultas, entrevistas, buscas ativas, e outros múltiplos meios, tanto presencial como virtual). Devendo ainda os governos zelar para que sejam efetuados estudos junto aos povos interessados com o objetivo que se avalie os impactos sociais, espirituais, culturais e sobre o meio ambiente que as atividades propostas possam desencadear sobre esses povos e seus territórios;

– exigir que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) cumpra com as suas atribuições legais e analise os Relatórios Técnicos de 6 (seis) Comunidades para identificar e delimitar os seguintes Quilombos localizados no estado do Rio Grande do Sul, quais sejam, Quilombo de Morro Alto, Fidelix, Rincão dos Negros, Arnesto Pena Carneiro, Picada das Vassouras/Quebra Canga e Costa da Lagoa, sendo hoje indispensável a atuação do Ministério Público Federal na defesa dos Territórios Quilombolas e dos povos originários;

– demandar que a prefeitura de Porto Alegre titule os Territórios Quilombolas no município que estejam em sobreposição com áreas de sua propriedade;

– respeitar e reconhecer a luta pela moradia de qualidade como parte da luta por justiça ambiental e social, visto que é também direito ao território e à dignidade de vida;

– promover a regularização fundiária na cidade de forma continuada, planejada e acelerada diante da vultosa demanda popular;

– reconhecer e incorporar nos projetos de habitação social ou de readequação de moradias os saberes acumulados pelos povos originários em relação às especificidades das comunidades e suas formas de vida, às técnicas socialmente conhecidas e utilizando  materiais ambientalmente sustentáveis;

– elaborar, com participação social ampla e diversa, projetos de lei, regramentos e políticas públicas que incentivem e viabilizem a adoção de tecnologias de impacto socioambiental positivo e baixo custo (voltados para a população, condomínios, estabelecimentos comerciais e indústrias) como tetos verdes, reuso das águas, energia solar e eólica, acesso à projetos de moradias que adotem técnicas de construção acessíveis e ambientalmente adequadas, inclusive para a população mais carente;

– valorizar e ampliar a Zona Rural e o apoio aos produtores agroecológicos, por meio da adoção e promoção de políticas públicas que incentivem e efetivem métodos ambientalmente adequados, sem a necessidade do uso de agrotóxicos, com acesso a linhas de crédito e suporte técnico especializado e continuado.

De acordo com o exposto acima, firmo o compromisso.

– AMPD – Associação Mães e Pais pela Democracia

– Movimento Preserva Belém Novo

– Coletivo Ambiente Crítico

– Campanha Preserva Arado

– Coluna Vermelha 

– AGAPAN – Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural

– FNL – Frente Nacional de Luta Campo e Cidade

– Programa Macacos Urbanos – UFRGS

– Grupo de Voluntários Greenpeace Porto Alegre  

– Preserva Zona Sul

– Amigos da Terra Brasil

– Quilombo Lemos

– InGÁ – Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais

– MTST – Movimento dos Trabalhadores Sem Teto

 – Movimento Laudato Si’ – RS

– Pastoral da Ecologia Integral-CNBB sul3

– SindBancários

– Sindicato dos Economistas do Rio Grande do Sul

– Sociedade de Economia do Rio Grande do Sul

– Associação do Pessoal da Caixa Econômica Federal do RS

– CIMI – SUL – Conselho Indigenista Missionário Sul

Foto: Carta Compromisso foi firmada no 1º Festival Ambiental de Porto Alegre (Facebook/Reprodução)

Fazenda Arado Velho: aprovada alteração do regime urbanístico para construir megacondomínio privado em Porto Alegre (RS)

Nesta segunda-feira (20/12), a Câmara de Vereadores da Capital gaúcha aprovou, por 24 votos a favor e 12 contra, o PLCE 024/21 do Executivo, que altera o regime urbanístico da região da Fazenda do Arado Velho, localizada no bairro Belém Novo, extremo sul da cidade.

O PLCE foi votado numa sessão extraordinária, com pouca participação popular e da comunidade local, sendo tocado às pressas e meio à pandemia do Coronavírus pelo governo do prefeito Sebastião Melo para atender aos interesses da empresa Arado Empreendimentos e demais beneficiados pela especulação imobiliária.

Vereadores apresentaram 9 emendas ao projeto, mas apenas 1 foi aprovada. Todas as demais, que tratavam de responsabilizar a empreendedora pelos danos ambientais causados pela construção, ampliavam as contrapartidas à comunidade local, buscavam maior salvaguarda ao meio ambiente e respeitar os direitos dos indígenas Mbya Guarani que habitam uma parte da fazenda foram REJEITADAS pela bancada governista.

Os projetos do condomínio ainda deverão passar por licenciamentos do município e do Estado, mas sabemos que esses governos atendem aos interesses do poder econômico. Precisamos seguir na luta em defesa do Arado Velho e de uma cidade para todos e todas!
#PreservaArado #PreservaBelemNovo

O que é o PLCE 024/2021 e seus impactos

A aprovação do PLCE 024/2021 viabiliza o loteamento de um número maior de terrenos do que o plano diretor permitia para ser construído no local, aumentando assim os lucros da empreendedora. O projeto da Arado Empreendimentos prevê mais de 2,3 mil lotes de média e alta renda, aumentando em 70% a população do bairro Belém Novo e colocando em risco a preservação de banhados importantes na Fazenda do Arado Velho que ajudam a evitar alagamentos na região.

Conheça mais sobre o Arado Velho neste especial da Amigos da Terra Brasil

Para implementar seu projeto de megacondomínio, a Arado Empreendimentos ameaçou e criminalizou integrantes de organizações ambientalistas e de moradores da região, que denunciaram ilegalidades no processo e os impactos ambientais e sociais. A empresa também usou de ameaças e de violência para expulsar indígenas Mbya Guarani que retomaram terras ancestrais em uma parte da fazenda, a Ponta do Arado.

Relembre:
Arado Velho: Violência contra indígenas e ameaças a ambientalistas para garantir projeto imobiliário

Arado Velho: confira nota do Movimento Preserva Belém Novo sobre agressão e intimidações sofridas em reunião que debateu projeto

Para conseguir o apoio da comunidade, prefeitura e empreendedora negociaram “contrapartidas” com custo bem aquém dos ganhos econômicos que os empresários terão, além de não impactar em melhorias significativas à população. A ampliação de água pelo DMAE na região não depende do empreendimento, como já assumiu o órgão em Arado Velho: DMAE esclarece que estação de tratamento de água NÃO depende de viabilização do condomínio fechado

Junto ao projeto de loteamento da Fazenda do Arado Velho avança a construção do Sistema de Abastecimento de Água (SAA) da Ponta do Arado pelo DMAE e prefeitura de Porto Alegre. Com estudos de impacto ambiental considerados falsos e sem diálogo com a população, a ampliação do fornecimento de água tão desejada pela comunidade, se seguir o atual projeto do Governo Melo, irá fechar o acesso público à Prainha de Copacabana na região e inviabilizar o sustento de pescadores locais:

Prainha de Copacabana em risco: obra de abastecimento de água avança sem diálogo com pescadores e comunidade de Belém Novo (Porto Alegre/RS)

Prainha de Copacabana em risco: uma nova estação de Tratamento de Água para Porto Alegre (RS) parece bom, mas não é!

Imagem da matéria: Regime urbanístico da área será modificado no Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Ambiental/ Crédito: Câmara de Vereadores de Porto Alegre (CMPA)

Há 3 meses, retomada Karanda’ty Mbya Guarani reivindica território em Cachoeirinha (RS)

A retomada ao território ancestral defende a área conhecida como “Mato do Júlio” contra projeto de especulação imobiliária

Quem acessa o município de Cachoeirinha (RS) vindo da BR-290 identifica uma área de mata fechada que pode ser vista já da estrada. A área de quase 300 hectares de floresta e banhados, berços da fauna e flora remanescentes do bioma Mata Atlântica, é moradia de famílias Mbya Guarani que retomam a terra ancestral localizada próxima à região central do município. As terras abrigam uma mata nativa que inclui vegetação em estágio inicial de regeneração, próximo à BR-290, e em estágio médio e avançado ao norte, onde é delimitada pela Av. Flores da Cunha, na região central da cidade, e torna-se abrigo também das famílias Guarani com a chegada da primeira “mitã”, neném, nascida na retomada Karanda’ty. O nome foi dado por Alexandre Kuaray, o xeramoi da retomada, ou seja o mais velho e sábio.

O retorno ao território ancestral ocorreu em 15 de setembro e, desde então, as famílias seguem ocupando e protegendo a área, que está em disputa entre município e os 13 supostos herdeiros da região, que mantêm uma dívida de IPTU com o município. A ocupação da área pelas famílias Guarani dá função social à propriedade, como define a Constituição Federal.

É importante sublinhar que a região metropolitana de Porto Alegre, seguida das missões e da região litorânea, são as áreas com a maior concentração de populações Guarani (sendo Mbya no sul  do Brasil, Ava-Katu-Eté no Mato Grosso e Nhandeva-Xiripa em São Paulo), como apontam os dados publicados pela Comissão de Cidadania e Direito Humanos da Assembleia Legislativa do RS (ALRS) no material “Coletivos Guarani no Rio Grande do Sul — Territorialidade, Interetnicidade, Sobreposições e Direitos Específicos”. Tanto hoje como no passado, o comportamento territorial dos povos originários tem sido mal compreendido pelos juruá (termo Guarani em referência aos não-indígenas) que invadiram seus territórios. Estes basearam sua conquista na expulsão das populações locais e defendem, com isso, o direito à posse da propriedade, sem levar em consideração o fenômeno conhecido como “itinerância” pelos povos originários. 

“Os povos autóctones platinos viviam, assim como quase todos os nativos das Terras Baixas sul-americanas, em regime de circulação sazonal entre aldeias e acampamentos. Conforme a época do ano, havia o deslocamento dos núcleos domésticos de produção por todo o vasto território tribal, independente da existência de aldeias e assentamentos “mais” permanentes ao estilo do que passaram a praticar os colonizadores”, descreve o pesquisador José Otávio Catafesto de Souza na obra Povos Indígenas na Bacia Hidrográfica do Lago Guaíba, lançada em 2008 pela prefeitura de Porto Alegre.

O debate é antigo, afinal os povos originários das Américas lutam há pelo menos quinhentos anos pelo direito de existir em comunhão com a natureza. Depois de expulsão, assassinatos e séculos de violência, a luta por ter seus modos de vida respeitados permanece. A disputa pelos territórios ancestrais é uma luta presente no país: está em trâmite no Supremo Tribunal Federal (STF) a decisão sobre a tese do Marco Temporal. A presença desse debate e do trâmite de Projetos de Lei que visam retirar os direitos indígenas com o PL 490 na Câmara Federal provam que nem mesmo os direitos adquiridos na Constituição Federal são permanentes. A tese do marco temporal é uma tese ruralista e que segundo esta interpretação, já considerada inconstitucional, os povos indígenas só teriam direito à demarcação das terras que estivessem em sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. A tese é defendida por empresas e setores econômicos do agronegócio que têm interesse em explorar as terras indígenas. 

A defesa da permanência dos Mbya Guarani na retomada de Cachoeirinha reafirma o direito secular sobre essas terras, além do resguardo da área de mata, fundamental para manutenção dos modos de vida dos povos tradicionais e para dar qualidade de vida aos próprios moradores do município de Cachoeirinha, uma vez que as áreas verdes mantêm o equilíbrio da umidade do ar e mitigam a poluição emitida pela urbanização. 

Segundo os Mbya Guarani, a retomada ocorre como forma de lutar pela preservação da área de mata. Seguindo o entendimento de que todos os seres têm direito à vida e precisam ser respeitados, tendo a retomada a finalidade de proteger fauna e flora em um ambiente de harmonia, diante do contexto de acelerado avanço da destruição sobre as áreas de preservação. Em especial quanto à especulação imobiliária, como os fatos levam a compreender o caso. 

Em uma live no Facebook, no dia 29 de setembro, promovida pelo Coletivo Sementes, em que participou o pesquisador José Catafesto, ele esclareceu que o conceito de cidadania não é algo que os indígenas almejam, pois remete à cidade e a um ideal de urbanização. O que os indígenas realmente almejam, explicou, é a “florestania” — conceito criado pelo historiador. A neologia apresenta uma relação com a terra e a sua “tekoá” (aldeia, na linguagem Mbya Guarani).

A área conta, há anos, com mobilizações da população em apoio à preservação da área, além de movimentos articulados como a Associação de Preservação da Natureza — Vale do Gravataí (APN-VG) e do grupo Salve o Mato do Júlio, que defendem o local como uma reserva ecológica e entendem que o local é fundamental para a qualidade do ar da cidade, como recurso hídrico e também para o controle de espécies animais.

Até agora, a prefeitura de Cachoeirinha não entrou em contato com as famílias e parece ignorar a existência da Retomada. A Secretaria Especial de Saúde Indígena se comprometeu em abastecer a retomada com água, porém nada fez até agora. Já a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) levou algumas cestas básicas em uma visita à retomada nesses 3 meses.

Confira a fala de Luiz Karaí sobre o que representa a retomada:


A disputa pela área

A área conhecida como “Mato do Júlio” é uma antiga fazenda que vai da Avenida Flores da Cunha até depois da BR 290. O único imóvel na área é a casa construída em 1815 pela família Baptista Soares da Silveira e Souza e é popularmente conhecida dessa forma, pois o último herdeiro a morar na casa foi Júlio, falecido no início dos anos 2000. A área que data do período colonial inclui uma antiga senzala. Como patrimônio histórico dessa região, casarão e senzala, ambos em estados de avançada deterioração, estão em processo de tombamento histórico pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). 

Um projeto capitaneado pelos herdeiros da área propunha a construção de um loteamento na região, incluindo duas ruas cortando o “Mato do Júlio”, ligando a Avenida Papa João XXIII ao Parque da Matriz e uma outra ligando a Flores da Cunha até a Perimetral Sul, que seria construída junto à BR 290. Além de vias secundárias loteadas e um parque no entorno da Casa dos Baptistas. Sem políticas públicas de habitação popular, a prefeitura construiu em 2020 o Projeto de Lei 4463. O PL foi questionado pela falta de debate público para uma pauta que pretendia alterar o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e culminou na recomendação do Ministério Público Estadual (MP), à Câmara Municipal, pela suspensão do processo de alteração do plano diretor.

Em entrevista ao site Seguinte, o vice-prefeito de Cachoeirinha, Maurício Medeiros, afirmou que esteve reunido com os herdeiros da área conhecida como “Mato do Júlio” no início de novembro. Segundo o vice-prefeito, os herdeiros da região estariam preocupados com a letargia do processo que define o destino da área. Contudo, estes nunca pagaram o IPTU sobre a área e a dívida soma o valor de mais de R$ 25 milhões. Segundo Medeiros, o Ministério Público orientou a prefeitura a contratar um estudo técnico para definir o que pode ser desenvolvido na região. A área está avaliada pela prefeitura em R$ 200 milhões. Segundo o mesmo site, um acordo foi firmado pelo governo Miki Breier com os herdeiros da área, em que o município receberia 10 dos 256 hectares da área privada, em troca de uma dívida judicializada de IPTU.

Maurício, agora, comanda o município após o afastamento do prefeito Miki Breier por processo do Ministério Público que o acusa de receber propina de empresas terceirizadas que prestam serviços no município. Ele afirma que pretende dar seguimento à política implementada por Miki para a área.

Abandono gera insegurança

Um dos motivos para a defesa de destruição da área de preservação foi um recente caso de tentativa de estupro a uma professora que passava pelo Parcão, em Cachoeirinha, região próxima ao chamado “Mato do Júlio”. A notícia reacendeu a discussão e motivou uma nota da prefeitura reiterando que reenviará o PL com proposta de alteração do plano diretor para incluir o projeto imobiliário na área de mata à Câmara do município: “A Prefeitura informa que irá reenviar o projeto à atual legislatura na esperança de que compreendam toda sua extensão e importância para a segurança da população de Cachoeirinha”.

O caminho adotado pela prefeitura para o problema estrutural de insegurança das mulheres para exercerem seu direito de ir e vir poderia ser trabalhado de forma transversal: com campanhas de conscientização, com educação nas escolas, trazendo o debate para a sociedade e capilarizando uma transformação real e a longo prazo junto à população. Ao contrário, escolhe-se utilizar deste motivo para apoiar a especulação imobiliária e destruir uma área que tem um papel fundamental de controle do clima do município, além de ser local de moradia de toda uma sociobiodiversidade.
Vale destacar que há um batalhão da Brigada Militar há uma quadra de distância do Parcão de Cachoeirinha, divisa com a área preservada. Além disso, ainda em 2016, o MP municipal já indicava a necessidade de cercamento da área: “O cercamento consta, inclusive, no Plano Diretor do Município e existe uma dívida ativa de R$ 10 milhões em IPTU”, afirmou a Procuradora-Geral do Município, Maria Loreny Bitencourt da Silva, citando os valores da época. Na referida reunião, foi o primeiro momento em que o município teve acesso aos dados dos 13 herdeiros para direcionar a execução dos tributos e a responsabilidade pela segurança e preservação ambiental no local.

#PreservaArado Justiça Estadual suspende votação do PLCE 024/2021 na Câmara de Vereadores de Porto Alegre (RS)

É uma pequena vitória frente  à luta que temos em defesa da Fazenda do Arado Velho no Extremo Sul da Capital, do meio ambiente e dos indígenas Guarani contra os interesses da  especulação imobiliária. Junte-se com a gente! 

Esperado para ser votado na última segunda-feira (6/12), o projeto da Fazenda do Arado Velho (PLCE 024/2021), que prevê alterações  no Plano Diretor  da cidade a fim de  viabilizar a urbanização massiva da área no bairro Belém Novo pela empresa Arado Empreendimentos,  teve seu trâmite suspenso pela juíza Nadja Mara Zanella, da 10ª Vara da Fazenda Pública de Porto Alegre. . A decisão  cautelar  é uma resposta à ação civil pública ingressada pelo Ministério Público Estadual (MPE), que pede que o prefeito não apresente o projeto  e que este deixe de tramitar na Câmara Municipal até que sejam elaborados todos os estudos, diagnósticos técnicos e debates sobre a alteração do perímetro e do regime urbanístico por ocasião da Revisão do PDDUA (Plano Diretor). No despacho, a magistrada convocou uma audiência de conciliação entre as partes no dia 13 de dezembro, às 15h, antes de decidir sobre o pedido do MPE. Não há mais detalhes sobre qual seria a conciliação possível entre indígenas que sofrem por milícias armadas, impedindo-os de usar um território que é seu por direito previsto na Constituição de 1988, e os milicianos. 

O megaempreendimento imobiliário não tem estudo de impacto ambiental verdadeiro. O estudo que a construtora tentou usar já foi considerado falso pelo Instituto Geral de Perícias pela Polícia Civil do Rio Grande do Sul, conforme noticiado pelo jornal Sul21. Além disso, um Sistema de Tratamento de Água (SSA), que já estava previsto desde 2010 pelo Departamento Municipal de Água e Esgotos (DMAE), foi usado como propaganda para promover o condomínio de média e alta classe planejado para a área da Fazenda do Arado  e colocá-lo a serviço da comunidade, obtendo o apoio dos moradores da região. O DMAE escreveu nota pública ratificando que a implementação da SSA sairá do papel porque é uma demanda antiga da região e arredores, que sofre com falta d’água constantes, e não depende da tentativa de construção do  bairro privado.

Esse ciclo vicioso de informações de difícil acesso à população e bastante confusas, que muitas vezes são desmentidas depois, geram uma enorme “cortina de fumaça” em cima do condomínio. Em processos anteriores já observados com os condomínios de luxo Terraville, também em Belém Novo, e no Alphaville I e II, no bairro Vila Nova, o poder público junta-se  a empresários em prol do lucro. Sobram  argumentos para que não se realize o empreendimento na Fazenda do Arado Velho: tentativas de aprovar mudanças  no Plano Diretor da cidade na surdina, sem consulta com à população; crimes nos estudos ambientais;  violência infringida  contra os indígenas que habitam o local; coloca em risco a preservação de banhados importantes que ajudam a evitar alagamentos na região; aumenta em 70% a população do bairro Belém Novo, sem prever investimento em infraestrutura pública para além da duplicação de trechos de ruas e de avenidas a fim de fazer o trânsito fluir .aso seja construído, não está prevista há nenhuma contrapartida que melhore, de forma concreta, a vida da comunidade como construção de escolas e mais postos de saúde, melhoria no saneamento, aumento na frota de ônibus, como se toda a população do condomínio e do entorno não precisasse desses serviços e fosse toda composta de pessoas que conseguem pagar pelos serviços que são direitos – ou a classe média. Na prática, é mais uma tentativa de higienização da cidade. 

Como aceitar a audiência de conciliação, então, se é para ouvir os dois lados com o mesmo poder de fala? É justo que quem está na mira da bala fale com o mesmo tempo de quem aperta o gatilho? Por que não há mais políticas habitacionais que compreendam o meio ambiente, a história,  as subjetividades das populações locais e que atendam à necessidade dos moradores da região, em sua maioria composta por trabalhadores e famílias de baixa renda? As respostas destas perguntas são: tudo isso ocorre porque o lucro está acima da vida. Essa lógica está presente em todo o sistema de Estado estruturado. Por isso, é de extrema importância que lutemos CONTRA o projeto da Fazenda do Arado e CONTRA a especulação imobiliária que faz desastres nas cidades. 

#NãoAoPldoAradoVelho #PreservaArado #PreservaBelémNovo

Festival Ambiental 2021: Porto Alegre pela Ecologia e pela Justiça

O Festival Ambiental POA 2021 pela ecologia e justiça social aconteceu no sábado, dia 27 de Novembro em Porto Alegre, no Parque Marinha do Brasil, bairro Praia de Belas. A Associação Mães e Pais pela Democracia, em parceria com os coletivos Amigos da Terra Brasil, MTST, Quilombo Lemos, AGAPAN, Coletivo Ambiente Crítico e Coluna Vermelha, Macacos Urbanos entre outras entidades, foram os responsáveis pelo evento, que se deu das 11h30min da manhã às 19h, pois teve um atraso motivado pelas chuvas constantes. O festival foi marcado por uma série de diálogos abertos, exposições, palestras, oficinas, uma feira de produtos sustentáveis e o lançamento de livros sobre a temática urbana e temas da regularização fundiária. Durante o evento, houve também a coleta de roupas, alimentos, lixo eletrônico, cadernos usados com folhas em branco e guarda-chuvas quebrados. Para fechar o dia, o Rafuagi deixou sua contribuição musical ao vivo para os participantes.

Leia no link: Carta Compromisso com a Porto Alegre ambiental e urbana que queremos

A Amigos da Terra Brasil se fez presente com uma banca montada junto ao Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST). A Organização ambientalista recebeu uma homenagem durante o festival por estar na resistência por uma Porto Alegre ecológica e justa socialmente, que foi entregue a Fernando Campos Costa, conselheiro do ATBr. “Existe a necessidade de o Plano Diretor ser feito de forma inteira, participativa, essa discussão da cedência diária das questões do município, a questão ambiental, que vem sendo precarizada desde o licenciamento ao quadro técnico”, explica Costa. Ele analisa  ainda que existe um “processo de exclusão por parte de uma elite, por parte de um setor do mercado imobiliário que se apropria do que é bem comum, que é o patrimônio da cidade, patrimônio imaterial, patrimônio social, cultural, ambiental, e que de uma forma ou de outra, acaba transformando Porto Alegre sem identidade, sem cultura, sem participação, sem envolvimento, principalmente com uma segregação social que nos mostra explicitamente a luta de classes da cidade”. O Festival Ambiental foi pensado com o objetivo de reunir, de forma presencial ao ar livre, militantes e pessoas envolvidas na questão ambiental da cidade de Porto Alegre. Segundo a ativista da ATBr e fotógrafa, Isabelle Rieger, o evento atingiu até mesmo a subjetividade dos participantes: “O pessoal do evento convocou uma meditação de 15 min com um monge com o objetivo de relaxarmos e promover uma conexão ainda maior com a natureza e a ecologia”. 

O foco do evento foi a visibilidade na luta pela moradia digna e por uma cidade ecológica e justa socialmente. Por esse motivo, foram trazidos, para integrar a formulação da carta “Compromisso com a Porto Alegre ambiental que queremos”, o Quilombo Lemos, os coletivos Preserva Belém e Preserva Arado, Vila Cai Cai, Vila dos Papeleiros, indígenas de Porto Alegre, torcedores e torcedoras antifascistas do Inter. O documento foi feito em plenária organizada durante a tarde do evento, com o propósito de colocar em pauta o posicionamento das entidades organizadoras. Este se coloca largamente contrário aos  projetos recentemente propostos para a modificação dos regimes urbanísticos do Centro de Porto Alegre (PLCE 023/2021), da Zona Sul, para viabilizar a construção de torres ao lado do estádio Beira Rio (PLCE 04/2019), da Fazenda Arado Velho em Belém Novo, o qual reduz a Zona Rural para autorizar loteamentos em área ambientalmente sensível (PLCE 024/2021). A carta ressalta ainda a aversão das entidades destacadas a qualquer projeto de lei ou ação governamental que fira direitos humanos, direitos socioambientais e direitos relacionados à participação popular nos processos e discussões que dizem respeito a Porto Alegre, em especial aqueles que afetam os povos originários e quilombolas.

Como resumo do evento e seus melhores momentos, o biólogo e ativista da ATBr, Heitor Jardim, destaca: “Tinha várias organizações presentes no local, várias falas bem importantes de militantes históricos do meio ambientalista e foi um momento de bastante comunhão e encontro entre lutas e frentes de resistência aqui de Porto Alegre”. O gestor Fernando Costa complementa: “Pra além das bancas, o encontro teve um espaço político de fala, a construção de uma carta e terminou com o lançamento dos livros sobre temas urbanos, temas de regularização fundiária e que dialogam com a questão dos sem-teto. Fechou com uma atividade cultural com o Rafuagi, teve um lado cultural legal também, abrindo essa possibilidade de atividades externas com participação e com cuidados de higiene necessários devido a pandemia”.

 
Abaixo, fotos da atividade. Cobertura de Isabelle Rieger:

Projeto das Torres do Inter: futebol ultrapassa limites esportivos

O por trás das câmeras da reivindicação das “Torres do Inter”

Na época em que a prefeitura de Porto Alegre era administrada  por  Leonel Brizola, em 1956, ele cedeu o terreno onde hoje está  localizado o Estádio Beira Rio para que o Sport Club Internacional pudesse construir seu estádio, sob cobertura da Lei nº 1.651. Naquele contrato, foi explicitado que o município concedia o terreno ao Inter para construir um estádio, na época chamado no texto de “praça de esportes”. Segundo a Lei nº 6.150, de julho de 1988, nada além do estádio, de equipamentos e do comércio de apoio ao fortalecimento da área poderiam ser estabelecidos ali. O projeto do clube prevê ainda lojas e restaurantes. Contudo, no presente momento, o Clube está pedindo autorização para que sejam construídas torres residenciais e corporativas, cujos apartamentos e salas poderiam ser vendidos em prol de geração de lucro, e uma delas tem previsão de medir 130 metros de altura. “O Inter está pedindo, na verdade, duas coisas que são proibidas: a primeira é construir ali, com uma finalidade diferente da esportiva. A segunda coisa é a seguinte: eles não querem um simples prédio normal como prevê o plano diretor, mas sim um edifício que hoje está proibido, querem fazer os maiores prédios do Rio Grande do Sul, com o objetivo de vender os apartamentos”, afirma o diretor do Sindicato de Arquitetos do RS, Pedro Araújo. 

A flexibilização é a política para amigos da prefeitura e de parte da Câmara de Vereadores, e é baseado no entendimento de entregar o Estado à iniciativa privada. Hoje, somos acometidos de diversas políticas que empregam esta máxima e comprometem  os bens públicos, que devem ter função pública. É o caso do Pontal do Estaleiro, que tinha função específica e acabou indo para o privado, assim como  o caso do Jóquei Clube, que também foi vendido e cedido à iniciativa privada com a desculpa de pagar as dívidas,  hoje atrofiado entre shopping e torres de luxo. Mas não ficamos aí, temos muitos imóveis nessa condição de estarem cedidos, há muitos anos, para associações de profissionais, times de futebol, enfim, com interesses públicos e que, numa manobra, transformam-se em privados na mão da especulação imobiliária – principalmente as áreas que ficam na  beira do Rio Guaíba, num momento em que o discurso de Porto Alegre de se virar para o rio ganha força e valor no mercado imobiliário.  

Neste esforço de trazer e desvendar essas realidades paralelas de Porto Alegre é que foi realizado o Festival Ambiental POA 2021 no último sábado, dia 27 de novembro, no Parque Marinha do Brasil. Movimentos e organizações sociais deram a cara para dizer que Porto Alegre é mais! É resistência. As organizações estão construindo a unidade na ação para mudar esta realidade, por isso, neste momento, retomamos os espaços de encontro e manifestação. 

Projeto das torres do Inter é criticado por grupo de torcedores. Crédito da Foto: Isabelle Rieger/ ATBr

Atualmente, tramita um projeto na Câmara Municipal, o qual pode ser votado a qualquer momento, para autorizar a construção das torres do Inter. Em 23 de setembro, o tema foi debatido em audiência pública virtual promovida pela Câmara de Vereadores. A próxima etapa consiste na análise e aprovação do assunto em plenário na Casa Legislativa, por enquanto sem data prevista. “O Inter não tem esse direito, mas à medida que o adquire, vai ganhar muito dinheiro. Supondo que o Sport Club Internacional quisesse comprar um terreno para construir essas torres, se a gente fosse dar um preço para esse espaço, seria de uma estimativa que não existe hoje em Porto Alegre, um valor absurdo. Mas vamos supor que a prefeitura poderia dizer isso: olha, lá naquela época, há 60 anos atrás, eu negociei contigo naqueles termos; agora, se tu quer alteração, nós vamos ter que renegociar. Então, o valor que seria o custo desse imóvel poderia ser repassado para prefeitura e ser investido em bairros como a Restinga, no Rubem Berta, no Sarandi… Seria o mínimo”, explica Araújo. O Clube alega que está em dificuldades financeiras, por isso  pede a liberação para construir  as torres e se recuperar. “Então, pegar um terreno público, que é de toda cidade, construir, vender e ficar com o dinheiro pra si, é absurdo. Então não é mais público, passa a ser privado, e o time embolsa enquanto a prefeitura nem vê a cor do dinheiro”, sublinha o arquiteto.

A constituição do projeto apresentado pelo Inter prevê como contrapartidas o alargamento da Avenida José de Alencar, a construção de um píer na área do Parque Gigante, localizada junto à Orla do Rio Guaíba, e a promoção de reformas no Asilo Padre Cacique e em uma unidade de saúde. Porém, “o valor do terreno chegaria perto de R$ 1 bilhão. Mas isso não está sendo discutido por ninguém, as pessoas discutem se é direito ou não, se é problema ou não, mas não percebem que a população está sendo engambelada. O prefeito diz que vão construir uma escola aqui, colocar uma lombada ali, mas é totalmente desproporcional ao que o time está adquirindo”, finaliza o arquiteto Pedro Araújo.

REFERÊNCIAS CONSULTADAS:

Jornal Zero Hora: https://gauchazh.clicrbs.com.br/esportes/inter/noticia/2021/09/projeto-de-construcao-das-torres-ao-lado-do-beira-rio-e-debatido-em-audiencia-publica-na-camara-de-vereadores-cktxo0j4x003u017lqp20dxvr.html

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