De um lado, a soja. Do outro, a soja também

Acima do Tiningu e do Bom Jardim, chega-se à região de Curuaúna. De lá escorre veneno dos vastos campos de soja em direção aos quilombos e às águas do Rio Maicá.

Andando pela região, Francinaldo Miranda, do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras Familiares de Santarém (STTR-STM), ensina a engenhosa arquitetura dos sojeiros, ou talvez a habilidade em design de ambientes – Esse é o puxadinho, que se resume a um pequeno avanço, não mais que dois ou três metros, do campo de soja em direção à mata em pé; queima-se aos poucos a floresta e, ano a ano, como se nada estivesse acontecendo, a soja toma todo o espaço disponível – como se precisasse crescer mais: pode se dizer, hoje, que no meio do campo de soja havia uma floresta (e havia uma floresta no meio do campo de soja) – E eles constroem esse muro pra que a visão da estrada seja bloqueada. Ninguém vê nada e parece estar tudo bem com a floresta. O muro em questão é uma fina faixa de árvores que, de fato, cumpre seu papel: é só ao dar a volta nela que se pode contemplar a imensidão da soja, soja a se perder de vista, de um lado, do outro lado, adiante e atrás. Porém, da estrada, é como se as árvores seguissem em pé, altivas.

Essa é uma das histórias da reportagem “História do cerco à Amazônia”. Navegue pelos conteúdos já publicados:

INTRODUÇÃO
Parte 1 (página central): A história do cerco à Amazônia
Parte 2: Quem é favorecido com as respostas de Bolsonaro às queimadas?
Parte 3: O “ganha-ganha” das empresas com a financeirização da natureza
Parte 4: Mas afinal, quem está por trás desses crimes?

HISTÓRIAS
1) O cerco explicado em um mapa
2) Um porto entalado na boca do rio
3) Antes do porto chegar (se chegar), chegaram já os impactos
4) Posto de saúde e escola quilombola: a luta muda a vida
5) [você está aqui] Curuaúna: de um lado, a soja; do outro, a soja também
6) O rosto estampado na camiseta

Os impactos na floresta e nas comunidades locais, obviamente, são tremendos: a soja representa grilagem, queimadas, desmatamento, agrotóxicos, além de necessitar de toda uma infraestrutura para seu transporte e exportação, o que também impacta os povos da região. Alguns casos, porém, beiram o absurdo: como a situação de uma pequena escola na comunidade de Boa Sorte (e o nome parece uma sádica ironia da vida). Ali, a distância entre a janela da sala de aula e o campo de soja não chega a dois metros, e o mais grave: o uso de agrotóxicos não respeita o horário escolar e se repete várias vezes ao ano. A contaminação das crianças é direta e repetida.

A região de Curuaúna é tão impactada pelo uso de agrotóxicos da soja (o principal é o glifosato – o Round-Up da Monsanto) que estudos com coleta de sangue de moradoras e moradores estão sendo realizados para dimensionar o tamanho do dano à saúde das pessoas. Os resultados dessa pesquisa ainda não foram divulgados. Outros estudos, entretanto, estão disponíveis: é o caso da dissertação de Nayara Luiz Pires, da Universidade de Brasília, que em 2015 pesquisou a expansão da fronteira agrícola na Amazônia e a contaminação por glifosato na região de Santarém. Nela, a pesquisadora afirma “um provável risco de exposição humana a agrotóxicos, principalmente pela via respiratória”.

Castanheira, árvore protegida por lei, sobrevive sozinha em meio a campo de soja. Foto: Carol Ferraz / Amigos da Terra Brasil
Escola cercada por soja: uso de veneno não respeita horário escolar e crianças são diretamente atingidas. Foto: Carol Ferraz / Amigos da Terra Brasil
Área queimada para a expansão do cultivo de soja: prática do “puxadinho” é muito usada na região amazônica, e consiste em aumentar o tamanho da terra aos poucos, queimando a floresta metro a metro, ano a ano, e avançando sempre à margem de qualquer tipo de controle. Foto: Carol Ferraz / Amigos da Terra Brasil
Com o avanço dos monocultivos na Amazônia, a floresta vira cinzas. Foto: Carol Ferraz / Amigos da Terra Brasil
Com o constante uso de agrotóxicos, pouca coisa cresce nas terras que antes eram bastante férteis. Foto: Carol Ferraz / Amigos da Terra Brasil

Fugindo da soja: cidades-fantasma e abandono
Muitas famílias, claro, não esperam para descobrir o quanto os agrotóxicos são danosos e a que velocidade estão os matando. Assim, as comunidades vão aos poucos sendo abandonadas, sumindo do mapa, deixando de existir – Ali era um campo de futebol, – Ali tinha um monte de casas, – Aqui era uma escola, mostra Francinaldo conforme se avança pela estrada que corta os campos de soja.

Mesmo as tradicionais partidas de futebol entre as comunidades vizinhas correm o risco de deixar de acontecer, simplesmente porque cidades-fantasma não têm times de futebol: ninguém mais poderá desafiar o temido São Jorge, equipe a ser batida na região. Francinaldo, natural da área de Curuaúna, era goleiro e conta quando – O centroavante tava a poucos metros de mim e era daqueles que chutava forte, meu amigo até, mas chutou com raiva, e a bola foi tão forte, mas tão forte, que rasgou a barriga de Francinaldo, e isso ele só descobriu mais tarde, depois do jogo, pois se arrastou com a bicicleta até em casa para não acusar a dor na frente do adversário. Precisou até de cirurgia e demorou anos a se recuperar plenamente. O mais importante, porém, conseguiu: defendeu o chute.

Isso que significa o avanço da soja: além da morte e da contaminação e da grilagem de terras, o fim da cultura e da vida local.

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Leia também as partes 2, 3 e 4 da introdução:
Quem é favorecido com as respostas de Bolsonaro às queimadas?
O “ganha-ganha” das empresas com a financeirização da natureza
Mas afinal, quem está por trás desses crimes?

E as histórias:
O cerco explicado em um mapa
Um porto entalado na boca do rio
Antes do porto chegar (se chegar), chegaram já os impactos
Posto de saúde e escola quilombola: a luta muda a vida
– [você está aqui] Curuaúna: de um lado, a soja; do outro, a soja também
O rosto estampado na camiseta

O rosto estampado na camiseta

Os olhos apontaram certeiros para a estampa na camiseta e ali se perderam, demorando a voltar – É a Maria do Espírito Santo? É ela, não é?, e a resposta foi que sim.

Quem indagava sobre a imagem que aparecia na camiseta de um dos presentes à celebração dos 46 anos do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras Familiares de Santarém (STTR-STM) era Maria Ivete Bastos dos Santos, 52 anos – sete deles dedicados à presidência da organização, entre 2002 e 2008. Chico Mendes, Marielle Franco, Irmã Dorothy, Berta Cáceres, entre outras e outros, também a encaravam desde o tecido branco da camiseta, retribuindo o olhar sério. A estampa, Maria Ivete soube em seguida, era uma homenagem às defensoras e defensores de territórios assassinados no Brasil e na América Latina nas últimas décadas, além de um protesto pela ausência de soluções para esses crimes.

Marielle Franco, Mestre Moa do Katendê, Berta Cáceres, Nicinha, Chico Mendes, Zé Cláudio, Maria do Espírito Santo, Irmã Dorothy Stang e Amarildo: essa era a estampa da camiseta que surpreendeu Maria Ivete. Arte: Amigos da Terra Brasil

A voz tremeu por um segundo antes de voltar à firmeza habitual: ver ali o rosto da amiga Maria do Espírito Santo pegou a outra Maria, a Ivete, desprevenida – Não esperava ver isso hoje, e a partir daí ela lembrou: e a lembrança às vezes é um fardo pesado, dói.

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INTRODUÇÃO
Parte 1 (página central): A história do cerco à Amazônia
Parte 2: Quem é favorecido com as respostas de Bolsonaro às queimadas?
Parte 3: O “ganha-ganha” das empresas com a financeirização da natureza
Parte 4: Mas afinal, quem está por trás desses crimes?

HISTÓRIAS
1) O cerco explicado em um mapa
2) Um porto entalado na boca do rio
3) Antes do porto chegar (se chegar), chegaram já os impactos
4) Posto de saúde e escola quilombola: a luta muda a vida
5) Curuaúna: de um lado, a soja; do outro, a soja também
6) [você está aqui] O rosto estampado na camiseta
7) A noite das motos

No estado do Pará, dos mais perigosos para quem defende os direitos dos povos, as duas lutaram lado a lado. Maria Ivete, presidenta do STTR-STM, além de outros cargos que desempenhou no sindicato ao longo dos anos; e Maria do Espírito Santo que, junto a seu esposo Zé Cláudio, trabalhava e vivia no Assentamento Agroextrativista Praia Alta Pirandeira, em Nova Ipixuna, região de Marabá. Por enfrentarem madeireiros ilegais e ruralistas da região, o casal recebia constantes ameaças. Zé Cláudio sabia já do seu destino, que ia morrer, e contou isso ao mundo sem que o esforço fizesse maior diferença: ambos foram assassinados ao serem emboscados por pistoleiros dentro da reserva na qual trabalharam e preservaram por 24 anos.

A covarde emboscada ocorreu em 2011. De lá pra cá, são nove anos de lamentação para Maria Ivete – Eu disse pra ela não pegar a moto naquele dia, embora a Maria Ivete saiba ser esse um mero detalhe – Não é ameaça o que a gente sofre: é sentença, e é quase como se fosse questão de tempo até que a morte encomendada encontre a encomenda. No entremeio, a ameaça é uma espécie de antecipação da morte à vida, uma absurda inversão na ordem natural das coisas. A sentença que paira sobre tantas cabeças impede que a vida seja vivida plenamente, por mais que, a rigor, se esteja vivo, e o coração ainda bata e ainda se respire e o cérebro ainda lembre, a duras custas.

Como o caso tomou grandes proporções e teve repercussão internacional, os dois pistoleiros que assassinaram Maria do Espírito Santo e Zé Cláudio foram condenados pela Justiça; o mandante do crime, após ser absolvido em 2013, foi a novo julgamento três anos depois e declarado culpado. A pena: 60 anos de prisão. Entretanto, apenas um dos atiradores está na cadeia. José Rodrigues Moreira (o mandante) e o irmão, Lindonjohnson Silva Rocha (executor), estão foragidos desde novembro de 2015 – Não sei falar de justiça, então eu falo é de injustiça, e essa é a referência, afinal: a injustiça é o que se conhece e se experiencia, restando ao seu oposto – à justiça – algum lugar no horizonte, distante e irreal.

Maria Ivete foi presidenta do Sindicato Rural de Santarém entre 2002 e 2008. Fotos: Carol Ferraz / Amigos da Terra Brasil

Proteção a defensoras e defensores dos direitos dos povos ainda é insuficiente
Somente no Pará – e ainda em 2017 -, 90 pessoas estavam em lista para ingresso no Programa de Proteção a Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) – o estado é o terceiro com maior número de pessoas dentro do programa. Para Maria Ivete, já são cerca de dez anos convivendo com escoltas, restrições de horários e de movimentos: hoje, ela é acompanhada pelo Programa Estadual de Proteção a Defensores de Direitos Humanos no Pará, que acompanha 77 pessoas no estado. Não é segurança o que ela sente, pelo contrário: conviver com a proteção é lembrar diariamente da ameaça – Não vou em festas, nos lugares que a gente vai a gente não sai pra ir na esquina, num barzinho, nada.

O PPDDH, embora um avanço importante (surgiu como reação ao assassinato da irmã Dorothy Stang, também no Pará, em 2005), ainda é bastante precário. Ele precisa de articulação nos estados; contudo, tem programas implantados por meio de convênios em apenas seis — Bahia, Rio de Janeiro, Pernambuco, Ceará, Minas Gerais e Maranhão. No Pará, a operacionalização se dá por meio de uma central em Brasília.

A principal questão, entretanto, é outra: o programa se mostra útil quando a situação já é extrema, em casos de perseguição e ataques. Imagina-se que a vigilância por parte do Estado possa em um mínimo constranger o trabalho dos assassinos. Contudo, acabar com os ataques às defensoras e defensores dos direitos dos povos exige uma resposta estrutural: regularização fundiária das pequenas e pequenos agricultores, demarcação de terras indígenas e das comunidades tradicionais. Em suas recomendações ao Estado brasileiro, o Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores dos Direitos Humanos fala em “políticas de garantia do direito a terra e território”, que incluem o respeito a convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho); a garantia da participação das comunidades nos processos de licenciamento de grandes projetos; a demarcação de terras indígenas e quilombolas; a reestruturação do Incra e da Funai, para melhor atendimento à população; o avanço da reforma agrária.

Assim, com medidas estruturais de defesa dos territórios, que menos rostos estamparão camisetas em homenagens tardias a quem perdeu a vida em nome dos direitos dos povos.

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Leia também as partes 2, 3 e 4 da introdução:
Quem é favorecido com as respostas de Bolsonaro às queimadas?
O “ganha-ganha” das empresas com a financeirização da natureza
Mas afinal, quem está por trás desses crimes?

E as histórias:
O cerco explicado em um mapa
Um porto entalado na boca do rio
Antes do porto chegar (se chegar), chegaram já os impactos
Posto de saúde e escola quilombola: a luta muda a vida
Curuaúna: de um lado, a soja; do outro, a soja também
– [você está aqui] O rosto estampado na camiseta
A noite das motos

A noite das motos

Vruuuum vruuum vruuuuuum e o barulho fez despertar José Marques da Costa, trabalhador rural de Alenquer, pequeno município do Pará com pouco mais de 50 mil habitantes. Dos 53 anos que José carrega nas costas, boa parte deles foram de noites mal dormidas: assim são as noites em muitos recantos do Brasil para aqueles que ousam defender os direitos de quem trabalha na terra – exatamente o que ele faz, e quando ouviu o quarto vruuum José Marques se pôs em pé, alerta.

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INTRODUÇÃO
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Parte 2: Quem é favorecido com as respostas de Bolsonaro às queimadas?
Parte 3: O “ganha-ganha” das empresas com a financeirização da natureza
Parte 4: Mas afinal, quem está por trás desses crimes?

HISTÓRIAS
1) O cerco explicado em um mapa
2) Um porto entalado na boca do rio
3) Antes do porto chegar (se chegar), chegaram já os impactos
4) Posto de saúde e escola quilombola: a luta muda a vida
5) Curuaúna: de um lado, a soja; do outro, a soja também
6) O rosto estampado na camiseta
7) [você está aqui] A noite das motos
8) Se organizar, todo mundo luta

Poucos meses antes, novas mensagens haviam chegado até ele (sempre de maneira indireta, aviso acovardado, “manda dizer”) – Vamos matar uns cinco, nem vão saber e – A Justiça é lenta, na bala a gente resolve mais rápido, e se antes José dormia com um olho aberto, passou a abrir os dois em noites de pouco ou nenhum descanso. E se a televisão parecia bom remédio para trazer o sono, o que ocorria na verdade era o oposto: a voz arrastada do atual presidente da República, Jair Bolsonaro, ecoava do aparelho e apenas agravava a insônia ao dizer coisas como – Quem tinha que estar preso era o pessoal do MST, gente canalha e vagabunda. Os policiais reagiram para não morrer, e Vamos fuzilar a petralhada do Acre, hein!, discursos de ódio que incentivam e materializam a violência contra trabalhadoras e trabalhadores rurais na Região Amazônica e no Brasil – ou seja, contra ele, José. A primeira fala de Bolsonaro faz referência ao Massacre de Carajás, quando policiais militares do Pará assassinaram a sangue frio 19 trabalhadores sem terra; a segunda foi feita durante a campanha presidencial de 2018.

Vruuuum vruum seguia o barulho, e José Marques arriscou espiar a rua.

Motos. Muitas motos – Uma, duas, três, meia dúzia, nove, dez, ia contando ele, mas a tarefa era dificultada pelo constante movimento circular dos veículos, que aceleravam e desaceleravam em frente à casa. Umas vinte, devia ser algo em torno disso, e logo José passou a se concentrar não nas motos, mas em quem as pilotava: essa era certamente questão de maior importância. Foi aí que viu vizinhos, amigos, colegas, e o medo que havia se instalado no peito cedeu um pequeno espaço para a curiosidade – O que fazem aqui a essa hora? e, em seguida, para a comoção: o circo ali montado não era uma emboscada. Pelo contrário: era uma escolta para protegê-lo exatamente de um ataque e possível assassinato.

Desde o fim do dia corria pela pequena cidade o boato de que pistoleiros – Todos muito traiçoeiros, ainda tomam um café na tua casa antes de te matar, esses traiçoeiros pistoleiros estavam à espreita na estrada, prontos para atacar José Marques quando ele saísse de casa. Morte encomendada pelos grandes fazendeiros da região. As vinte e tantas motos serviriam – e serviram de fato – de escudo para levar José Marques até algum lugar seguro. Assim foi que ele subiu em sua moto, em meio à noite da pequena Alenquer, arrancou e viveu para lutar mais um dia entre e pelos seus.

No topo, José Marques; nas duas fotos seguintes, registros de irregularidades e violações de direitos cometidos pelos grileiros, que derrubaram árvores e destruíram a ponte de acesso ao local. Fotos: Carol Ferraz / Amigos da Terra Brasil

Grilagem: CAR sobreposto e “Quatro Anos de Tormenta”
O que levou pistoleiros a perseguirem José Marques tem relação com o cargo de nome comprido que ele carrega: presidente da Associação Comunitária de Moradores e Pequenos Agricultores da Comunidade de Limão Grande, localizada em Alenquer. Ali viviam e trabalhavam 86 famílias em uma área de cerca de dez mil hectares – até que, em 2016, começou o que José chama de “Quatro Anos de Tormenta”.

Primeiro, houve a requisição, por parte de fazendeiros, de três mil hectares da área onde viviam as famílias. Em consulta ao Incra, com o apoio do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras Familiares de Alenquer (STTR-ALQ), viu-se que o pedido era justo: as famílias aceitaram se retirar daquela área, redistribuindo-se irmãmente nos sete mil hectares restantes. Nesse meio tempo, foi realizado um georreferenciamento do terreno, passo necessário para que a comunidade fizesse seu cadastro no CAR (Cadastro Ambiental Rural).

Trabalho feito, voltaram ao Incra e aí a surpresa: quinze dias antes, diversas pessoas haviam cadastrado aquelas áreas como suas. De repente, a terra onde as famílias viviam desde 2007 tinha “donos” – e eram outros. Nunca houve fiscalização por parte do Incra para verificar se aqueles que fizeram o CAR de fato ocupavam a terra autodeclarada; houvesse uma, seria simples constatar quem de fato ocupa a área – Eles não sabem nem onde fica, contudo José sabe e isso parece de nada adiantar.

O cadastro, feito a partir das informações prestadas pelo requerente, não tem prazo para verificação pelo órgão público competente: alguns estados afirmam que a análise dos cadastros demoraria entre 25 e 100 anos. Entretanto, contrariando o imaginário popular de morosidade da Justiça e do poder público, antes que a devida vistoria pudesse ocorrer, foi decretada a reintegração de posse do local, o que aconteceu com forte aparato policial. Resumo: 86 famílias foram postas na rua, com requintes de crueldade. Tudo o que tinham ficou para trás – carroças, plantações, casas -, e o que ficou para trás foi incendiado e posto abaixo.

Os vídeos acima foram gravados pelas produtoras e produtores locais. O primeiro deles mostra o fogo consumindo uma construção ao lado de uma plantação; o segundo mostra as ruínas que restaram; o último vídeo denuncia a destruição da única ponte de acesso à área, serviço executado pelos capangas dos grileiros. Na foto, também disponibilizada por moradoras e moradores de Limão Grande, seguranças privados fortemente armados proíbem a circulação dos trabalhadores rurais no território em disputa.

 

Hoje, seguranças privados rondam o território. As espingardas falam alto e quem se aventura a buscar algo que talvez tenha restado em pé (e às vezes o desespero é afeito a aventuras) corre grave risco de ser atacado pelos capangas dos grileiros. E é isso o que houve: grilagem a partir da sobreposição de terras no CAR, que é autodeclarado. Diferentes CPFs se intitularam donos de uma área que não ocupam, antecipando-se aos verdadeiros ocupantes que preparavam os trâmites para se cadastrar no sistema. Sem vistoria alguma, a Justiça determinou a reintegração de posse em nome dos interesses dos grileiros.

Um detalhe chama atenção e evidencia a intenção de tomada total do território dos trabalhadores rurais: ao realizarem o CAR em diversos CPFs laranjas, uma área de quase 600 hectares não foi sobreposta – seria, portanto, direito das famílias permanecerem ali. No momento da reintegração de posse, porém, toda a área foi despejada, não restando nada nem ninguém para trás — Não houve qualquer respeito ao protocolo de remoções, reclama José, mas na terra em que a posse da terra é de quem não vive nem trabalha nela, espera-se quase nada de uma Justiça e de uma polícia a serviço dos grandes fazendeiros.

Desigualdade agrária e violência no campo
Os números da desigualdade agrária no Brasil são alarmantes: quase metade da área rural do país pertence a apenas 1% dos latifundiários. Dados do Censo Agropecuário de 2017 mostram que os grandes estabelecimentos rurais elevaram a concentração de terras para 47,5%, enquanto as pequenas e pequenos agricultores, cujas propriedades têm até 10 hectares de terra e representam metade das fazendas do país, ocupavam apenas 2,2% do território produtivo.

Tal desigualdade na distribuição de terras, além de ressaltar a urgência de uma reforma agrária, gera violência: os conflitos por terra mataram 2.262 pessoas entre 1964 e 2010 no Brasil. Só em 2017, foram 70 assassinatos, segundo dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT). Ora, e tente adivinhar quem morre nesses conflitos? Sempre os pequenos: o Brasil está no topo de lista de países onde mais se mata defensoras e defensores dos direitos dos povos sobre seus territórios, divulgada em 2016 pela ONG Global Witness. E são exatamente essas pequenas e pequenos agricultores, perseguidos por defenderem seus territórios, que produzem mais de 70% dos alimentos que chegam à mesa dos brasileiros, já que as grandes monoculturas exportam a maior parte da sua produção. Porém, o governo Bolsonaro escolhe privilegiar os interesses dos ruralistas, intensificando os ataques aos povos originários e tentando legalizar a grilagem com o PL 2633, o famigerado PL da Grilagem.

Todas essas informações estão contidas na Resolução nº10 do Conselho Nacional dos Direitos Humanos, de 17 de outubro de 2018.

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Leia também as partes 2, 3 e 4 da introdução:
Quem é favorecido com as respostas de Bolsonaro às queimadas?
O “ganha-ganha” das empresas com a financeirização da natureza
Mas afinal, quem está por trás desses crimes?

E as histórias:
1) O cerco explicado em um mapa
2) Um porto entalado na boca do rio
3) Antes do porto chegar (se chegar), chegaram já os impactos
4) Posto de saúde e escola quilombola: a luta muda a vida
5) Curuaúna: de um lado, a soja; do outro, a soja também
6) O rosto estampado na camiseta
7) [você está aqui] A noite das motos
8) Se organizar, todo mundo luta

Se organizar, todo mundo luta

O trajeto era longo, entre Santarém e Alenquer são duas horas de balsa e mais três ou quatro horas de estrada, parte em asfalto, parte em terra, então o Totó, homem silencioso, e a Mara, mulher falante, aproveitaram para contar algumas histórias que presenciaram, ele como ex-presidente e hoje vice-presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras Familiares de Alenquer (STTR-ALQ), ela como a atual presidenta da organização. Em todos os relatos, destaca-se a importância do sindicato para a conquista e garantia de direitos, para serviços de assistência técnica e para a segurança das e dos trabalhadores rurais.

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INTRODUÇÃO
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Parte 2: Quem é favorecido com as respostas de Bolsonaro às queimadas?
Parte 3: O “ganha-ganha” das empresas com a financeirização da natureza
Parte 4: Mas afinal, quem está por trás desses crimes?

HISTÓRIAS
1) O cerco explicado em um mapa
2) Um porto entalado na boca do rio
3) Antes do porto chegar (se chegar), chegaram já os impactos
4) Posto de saúde e escola quilombola: a luta muda a vida
5) Curuaúna: de um lado, a soja; do outro, a soja também
6) O rosto estampado na camiseta
7) A noite das motos
8) [você está aqui] Se organizar, todo mundo luta

Alenquer é pequena, pouco mais de 50 mil habitantes. E é instável: prefeitos não tem o hábito de completar seus mandatos, já se tornou tradição. Naquele dia mesmo, enquanto Totó e Mara contavam histórias, o presidente da Câmara de Vereadores assumia o cargo de prefeito, em mais uma reviravolta da política local. Pois em determinado momento, anos atrás, indignados com a ausência de políticas públicas na região…

Uma pausa: Totó, que se chama João Gomes da Costa e tem 47 anos, olha o retrovisor e vê uma grande caminhonete branca ultrapassar. Já à frente do carro, ela passa a andar lentamente. Em seguida, acelera bruscamente e desaparece no horizonte. Mara, abreviação de Aldemara Ferreira de Jesus, 37 anos, percebe que a placa era de Santarém.

…indignados com a ausência de políticas públicas; com os salários atrasados das professoras e professores e dos profissionais da saúde; com a péssima condição das estradas; enfim, um pacote completo de indignações: aí que o povo resolveu trancar a estrada que dá acesso à cidade. Isso porque, antes, o prefeito se recusou em diversas ocasiões a dialogar – chegou a expulsar Totó e Mara de reuniões – e levou seu desinteresse a ponto de a estrada ter que ser trancada.

Uma multidão de trabalhadoras e trabalhadores de diferentes áreas se aglomerou no local – estavam ali trabalhadoras e trabalhadores rurais, organizadas pelo sindicato, e também a classe de professores e da saúde, e os garis, e o pessoal da paróquia, era todo mundo mesmo – e aí rapidinho apareceu o prefeito e secretários e juiz e desembargador e ficou combinada uma reunião na Câmara de Vereadores mais tarde naquele dia. Combinou-se que apenas 50 representantes da sociedade civil poderiam entrar e apresentar suas demandas. Ok.

Mara, presidenta do Sindicato Rural de Alenquer. Foto: Carol Ferraz / Amigos da Terra Brasil
Totó, ex-presidente do sindicato e, hoje, vice. Foto: Carol Ferraz / Amigos da Terra Brasil

Só que antes dos 50 chegarem chegou o “tático” da polícia, um grande exagero, e foi aquele constrangimento quando até as irmãs e os padres foram revistados pra entrar no local da reunião. Ali, o povo falou e, imediatamente depois, sem qualquer resposta ou manifestação ou uma mínima indicação de que prestou atenção, o prefeito se retirou.

Mara e Totó foram até a frente da Câmara de Vereadores contar o que havia ocorrido e se surpreenderam com a massa de gente que esperava o resultado da conversa, mais de mil pessoas que obviamente não se alegraram com a notícia: uma chuva de ovos e tomates caiu sobre as paredes e em escudos da polícia. De um canto, um grito desesperado – Totó, controla o povo, ao que ele, Totó, pensou – Como? mas respondeu – Se tem alguém descumprindo algo aqui são vocês, se comprometeram a dialogar e não dialogaram, e seguiam voando e zunindo e explodindo no prédio ovos e tomates, a multidão aumentando o tom, até que reaparecem o prefeito e os secretários, dessa vez todos muito dispostos a escutar. Retomada a reunião, finalmente acordos são feitos e compromissos, firmados. Mara ri – Se os trabalhadores unidos entendessem a força que têm… Não tomavam desaforo de ninguém.

Perseguição e ameaças
– Se posicionar do lado dos pobres tem uma consequência, diz o Totó, e ele bem sabe: preocupa-se com as ameaças que recebe, preocupa-se por ele e pela filha e pelo filho, e demorou alguns segundos até ele conseguir dizer – Eu tenho medo sim, a gente perde a liberdade. Penso nos horários, os meus e dos meus filhos, fico atento a qualquer coisa que esteja diferente, penso em como vai ser a chegada em casa, se tem alguma emboscada. Mas o sono é tranquilo, ele garante – A gente tem a consciência tranquila, embora sempre atenta e preocupada.

Preocupação que Mara compartilha, como quando sua filha pergunta – Mãe, o que é isso que estão falando de você no Facebook?, e até explicar a uma criança o que se passa é complicado, é complexo, é desgastante e é grave: é grave porque por vezes as ameaças vêm do próprio Estado, representado nos homens de farda que deveriam dar proteção a todos. Totó relata receber ligações com ameaças de policiais – Estamos com o fazendeiro tal, dizem na intenção de intimidá-lo. A mensagem é clara e – Ali onde você acharia alguma proteção você não tem nenhuma. Ele reclama e reza, confia em Deus: e para alguns, frente à negligência do Estado, resta apenas a proteção divina mesmo – útil quando somada à união e à força das e dos trabalhadores.

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Leia também as partes 2, 3 e 4 da introdução:
Quem é favorecido com as respostas de Bolsonaro às queimadas?
O “ganha-ganha” das empresas com a financeirização da natureza
Mas afinal, quem está por trás desses crimes?

E as histórias:
1) O cerco explicado em um mapa
2) Um porto entalado na boca do rio
3) Antes do porto chegar (se chegar), chegaram já os impactos
4) Posto de saúde e escola quilombola: a luta muda a vida
5) Curuaúna: de um lado, a soja; do outro, a soja também
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Quem é favorecido com as respostas de Bolsonaro às queimadas?

Adiantamos, já de início: somente o mercado, os grileiros, o agronegócio. E o PL 2633 (antiga MP 910, a famigerada MP da Grilagem), é a maior evidência disso. E bem… Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente, também deixou isso bem claro quando disse que a pandemia do coronavírus é uma grande oportunidade para desmantelar a regulamentação ambiental já que todo mundo está olhando para outro lado.

Frente à urgência e à crescente preocupação da comunidade internacional em relação às queimadas de 2019, a gestão Bolsonaro reagiu com saídas voltadas a interesses financeiros, que de forma alguma abrangem os problemas enfrentados pelos povos da Amazônia. Ao contrário, os colocam em risco ao privilegiar políticas favoráveis aos ruralistas e ao fortalecer medidas de financeirização da natureza. Avançaram no Congresso Nacional projetos que fortalecem medidas como o PSA (Pagamento por Serviços Ambientais), ao mesmo tempo que o governo aproveitou para avançar na proposta de anistia a grileiros de terra, expressa no PL 2633 – incentivando exatamente a prática que está por trás do aumento das queimadas.

Mesmo em meio à pandemia do coronavírus, o PL 2633 pode ser votada a qualquer momento no Congresso Nacional; se aprovado, facilitará ainda mais a ação de invasores de terras públicas. Para o Grupo Carta de Belém, ” […] a legislação permite liquidação das terras e patrimônio público a preço de banana em favor de médios e grandes grileiros” – lembrando ainda que, enquanto isso, “a reforma agrária e a titulação de territórios coletivos seguem paralisadas”.

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Parte 2: [você está aqui] Quem é favorecido com as respostas de Bolsonaro às queimadas?
Parte 3: O “ganha-ganha” das empresas com a financeirização da natureza
Parte 4: Mas afinal, quem está por trás desses crimes?

E veja também: O cerco explicado em um mapa

Para além da ameaça da grilagem de terras, surgem no horizonte como suposta solução aos problemas climáticos as medidas de “pagamento por serviços ambientais”. Em suma, são uma maneira de monetizar a relação com a natureza; a depender dos fluxos financeiros, pode ser interessante preservá-la em pé ou não. Tais medidas não enfrentam as questões estruturais da problemática do clima e muito menos protegem os povos e seus territórios: ao contrário, deixa-os à mercê das grandes indústrias poluidoras, que invadem a Amazônia para “compensar” suas violações de direitos em outros lugares e a poluição inerente a suas atividades. As comunidades perdem a autonomia sobre seus próprios territórios, transformados em ativos em bolsas de valores e em “fazendas de captura de carbono”, o que leva à criminalização de práticas e culturas ancestrais.

O documentário “Mercado verde: a financeirização da natureza” explica e denuncia as falsas soluções que o capitalismo propõe para os males que ele próprio causa.

A terra, assim, atende somente aos humores do Mercado. A ele que Bolsonaro e o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, respondem, em detrimento da agro-socio-bio-diversidade amazônica. E vejam como não é acaso a escolha das palavras: o atual governo pensa a Amazônia sob o prisma da “bioeconomia”, ou seja, com o viés da exploração dos bens comuns em nome do lucro de poucos. É explícito: para eles, a Amazônia precisa de “soluções capitalistas”. Em outras palavras: devastação, exploração, privatização.

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Continue lendo a introdução:
parte 3: O “ganha-ganha” das empresas com a financeirização da natureza
parte 4: Mas afinal, quem está por trás desses crimes?

9 ações para defender a Amazônia todos os dias

Dia 5/9 é conhecido como Dia da Amazônia. Listamos aqui 9 ações para defendê-la todos os dias!

 

1. Lute pelos direitos dos povos indígenas
É sabido: as terras indígenas combatem o desmatamento e a emissão de gases de efeito estufa. E, sempre que preciso, são os povos da floresta que erguem-se em sua defesa, ocupando o vazio do Estado.

2. Rejeite as falsas soluções do capitalismo “verde”
O capitalismo se alimenta da miséria e, em momento de crise, ressurgirão como solução as políticas de financeirização da natureza, como REDD (Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação florestal) e PSA (Pagamento por Serviços Ambientais – lê aqui a posição crítica do Grupo Carta de Belém sobre isso). São as falsas soluções do capitalismo verde, que privatizam as terras dos povos e comunidades tradicionais e transformam a natureza em ativos em bolsas de valores, a serem negociados para compensar os danos ambientais causados pelas grandes empresas poluidoras. Se interessou? Entenda mais sobre ”mercado de carbono” e “financeirização da natureza” assistindo ao nosso documentário “Mercado Verde: a financeirização da natureza” – aqui o link pro vídeo completo no YouTube.

3. Apoie organizações e movimentos que lutam juntos aos povos e comunidades
A luta pelos direitos coletivos e dos povos sempre foi criminalizada – e a violência tem aumentado no atual cenário político de ascensão fascista: aqui uma matéria bacana do Brasil de Fato sobre o assunto. E não só apoie: some-se à luta, participe e construa o poder popular desde baixo!

4. Valorize as instituições ambientais e de pesquisa
Os investimentos em educação pública, pesquisa e tecnologia devem ser amplamente defendidos. Somente assim a soberania e controle de nosso próprio território são possíveis – ora, não por acaso Bolsonaro elegeu a ciência e as instituições ambientais como inimigos. Uma candidatura (e agora governo) baseada em notícias falsas e desinformação jamais se manteria firme frente a dados científicos e apurações aprofundadas. Assim que Ibama, ICMBio, universidades públicas e institutos federais sofrem com sucateamento e recorrentes cortes em seus orçamentos. Por exemplo: “Governo corta R$ 187 milhões do MMA“; “Corte de recursos do Ibama ampliará desmatamento“; “Corte de R$926 milhões na Educação foi para pagar emendas parlamentares, diz ministro“; “Reitores de universidades federais do RS falam em ‘desastre’ e ‘atraso’ após cortes de verbas de pesquisa“.

5. Apoie a Reforma Agrária
Os assentamentos da Reforma Agrária trazem trabalho e futuro para famílias antes sem acesso à terra. São desses locais que vêm muitos dos produtos agroecológicos depois consumidos nas cidades. Vale lembrar: se o campo não planta, a cidade não janta! Aqui outro material bacana do Brasil de Fato, falando de como a agroecologia é contraponto às queimadas na produção agrícola.

6. Não vote na bancada ruralista
O governo Bolsonaro obedece cegamente aos interesses ruralistas: “Esse governo é de vocês”, afirmou ele. O agronegócio é um dos principais causadores e interessados na queima da Amazônia, em especial das áreas de proteção e terras demarcadas. Assim, podem avançar seus latifúndios, monoculturas e pasto, ganhando território – com a garantia de que, mais tarde, essa invasão será “legalizada” por este governo que os obedece (e não seria a primeira vez que isso ocorreria: é a legalização da grilagem). Também os madeireiros lucram: a terra queimada para a expansão do agronegócio foi antes ilegalmente desmatada. Aliás: quem é bancada ruralista? Descubra.

7. Responsabilize as empresas
Não é desastre nem acidente: por trás de cada tragédia ambiental está a ação de transnacionais multimilionárias que lucram com a devastação que deixam para trás. Brumadinho e Mariana nunca mais! Por isso é importante que avance um Tratado Vinculante na ONU que responsabilize as transnacionais, a maioria do Norte Global, por seus crimes, normalmente cometidos no Sul Global. Mais sobre a luta por um Tratado Vinculante você encontra no site da Campanha Global para Desmantelar o Poder Corporativo. Hoje, os Estados do Sul têm pouco poder frente às fortunas ostentadas pelas empresas, que compram o que precisarem (da mídia ao sistema judiciário, de políticos a associações civis) para saquear as riquezas que lhes interessarem.

8. Combata o patriarcado (e, em consequência, o neoliberalismo)
O combate deve ser contra as estruturas que mantém há séculos o poder nas mãos brancas e masculinas que queimam a Amazônia: um dos pilares que sustenta a lógica entreguista e colonial desse governo é o patriarcado. Assim, são leiloados os bens comuns dos povos brasileiros, pondo em risco todos os territórios – desde os corpos até as espiritualidades e terras em sentido estrito. Sobre isso, olha que legal esse texto da Marcha Mundial das Mulheres: “Desde o nosso feminismo, reafirmamos que é preciso fazer uma crítica integral ao sistema capitalista, patriarcal e racista. O desafio é conectar as lutas por autonomia sobre o corpo, a sexualidade e a vida, com as resistências às novas estratégias de colonização dos nossos corpos e territórios”.

9. Acredite e lute!
A desesperança e o sentimento de impotência não ajudam nem constroem nada! São muitos os exemplos de lutadoras e lutadores nos territórios que nos inspiram: as resistências indígenas, negras, feministas, campesinas! A luta contra o capitalismo e a devastação que esse sistema injusto causa nas relações sociais e ambientais são históricas, e o embate seguirá sendo travado: cabe a nós acreditar num outro mundo, fazendo aquilo que estiver ao alcance, pouco que pareça. Por isso terminamos aqui com o manifesto construído na Marcha das Mulheres Indígenas, que reuniu mais de 130 povos indígenas em agosto, em Brasília: “Somos totalmente contrárias às narrativas, aos propósitos, e aos atos do atual governo, que vem deixando explícita sua intenção de extermínio dos povos indígenas, visando à invasão e exploração genocida dos nossos territórios pelo capital. (…) Por isso, o território para nós não é um bem que pode ser vendido, trocado, explorado. O território é nossa própria vida, nosso corpo, nosso espírito”.

Grandes empresas frigoríficas e de laticínios estão aquecendo o planeta, e logo serão as maiores poluidoras

Novo relatório revela como as estratégias de crescimento das 35 maiores empresas frigoríficas e de laticínios do mundo aumentam suas emissões, prejudicando esforços globais para evitar perigosas mudanças climáticas.

As maiores empresas globais de carnes e laticínios podem virar os piores poluidores do planeta nas próximas décadas, segundo um novo relatório do Instituto para Políticas em Agricultura e Comércio (IATP) e da GRAIN. Quando o planeta mais precisa reduzir suas emissões de gases de efeito estufa, os imensos frigoríficos e laticínios promovem o consumo excessivo ao acelerarem a produção e as exportações, apesar dos compromissos que algumas delas assumiram para reagir à mudança do clima.

O relatório completo em português pode ser lido AQUI.

ALGUNS DADOS RELEVANTES ALCANÇADOS:

  • As cinco maiores empresas de carne e laticínios  do mundo: JBS (Brasil), Tyson Foods, Cargill e Dairy Farmers (US) e Fonterra (Nova Zelândia),  já são responsáveis por mais emissões anuais de gases de efeito estufa do que as petroleiras ExxonMobil, Shell ou BP.
nota: o que não significa desresponsabilizar as petroleiras por seus crimes e abusos. A Amigos da Terra Holanda recentemente levou a Shell aos tribunais; aqui no Brasil, a empresa agiu fortemente no lobby pela estrangeirização do pré-sal, contribuindo para o golpe que esfarelou a nossa democracia

 

  • As emissões combinadas das 20 maiores empresas de carnes e laticínios superam as emissões de nações inteiras, como Alemanha, Canadá, Austrália ou Reino Unido e França.
  • 10 companhias controlavam perto de ¼ de toda a produção global de carne e laticínios em todo o mundo em 2016, com operações concentradas em poucos países com alta produção e consumo de carne e leite, chamados de bloco de proteína excedente, que, somados à China, respondem por cerca de ¾ da emissões globais do setor de carne e laticínios.
  • A maioria das 35 principais empresas de carnes e laticínios não consegue relatar completamente as emissões ou exclui suas emissões da cadeia de fornecimento (emissões da produção de ração animal até o metano gerado pelo gado), que respondem por 80-90% de suas emissões. Ao contrário, relatam aumento da produção, principalmente através de subsídio no preço dos grãos para ração produzido pelo agronegócio e acordos comerciais para diminuir qualquer barreira tarifária a fim de garantir o aumento da exportação.
  • Apenas 14 das 35 maiores empresas de carne e laticínios anunciaram algum tipo de metas de redução de emissões. Destes, apenas 6 incluem as emissões da cadeia de fornecimento e 4 companhias fornecem estimativas abrangentes de emissões:  Nestlé (Suíça), Danone (França), Friesland/Campina (Holanda) e NH Foods (Japão). Entretanto, apenas duas empresas se comprometeram a reduzir suas emissões absolutas: Nestlé, a maior companhia de alimentos do mundo, em 50% até 2050; e Danone, a segunda maior receita da cadeia de laticínios, se comprometeu a chegar a “emissões líquidas zero” em 2050. Lembrando que tais metas são voluntárias, sem contar com um  sistema independente de monitoramento e verificação.
nota: sempre desconfie das promessas de grandes empresas: não é novo, por exemplo, o interesse da Nestlé em privatizar fontes de água – encontro do CEO da empresa com Michel Temer em Davos e o Fórum Mundial da Água [o fórum empresarial oposto ao FAMA, este sim um fórum popular que defende a água como um direito de todas e todos], ocorrido em março deste ano, recolocaram a discussão em pauta

 

  • Entre as empresas que possuem estratégia de redução de emissões, há, contraditoriamente, previsão de aumento de sua produção global entre 2015-2030, como no caso da Danone, em 70%. A redução das emissões de GEE neste período se daria com a adoção conjugada da i) diminuição da intensidade de emissões por kg por parte dos agricultores fornecedores da cadeia de produção (Danone, Fonterra) e; ii) adoção de mecanismos de compensação (offset), por meio de plantio de árvores e conversão de fazendas no Sul Global por meio de práticas agrícolas sustentáveis, embora o Acordo de Paris não aceite compensações para o cumprimento das metas voluntárias.
    nota: tais medidas de compensação fazem parte das falsas soluções que o capitalismo verde prega para que siga poluindo e violando direitos em territórios; o assunto foi tema de debate recente no IV Encontro do Povos das Florestas Contra as Falsas Soluções, no qual o Amigos da Terra participou – leia aqui a carta produzida na ocasião denunciando estas falsas soluções
  • Se o crescimento da indústria global de carne e laticínios continuar conforme projetado, o setor pecuário como um todo poderia responder por 80% do orçamento anual de gases de efeito estufa do planeta até 2050.

Devlin Kuyek, pesquisador da Grain:

“Ao invés de ter que suportar os custos da intensidade de suas emissões para proteger a agenda de crescimento das grandes companhias de carne e leite, agricultores podem, por meio do suporte de programas públicos, realizar uma transição para praticas agroecológicas (…)

Shefali Sharma, diretora do IATP:

“Não existe carne barata. É hora de percebermos que o consumo excessivo está diretamente ligado aos subsídios que fornecemos à indústria para continuar desmatando, esgotando nossos recursos naturais e criando um grande risco à saúde pública por meio do uso excessivo de antibióticos — alerta. Agora, o relatório mostra o papel fundamental que estas companhias desempenham também para as mudanças climáticas.”

No relatório completo você pode saber mais sobre:

Concentração corporativa e de emissões no bloco de países com proteína excedente mais China;

– Portas giratórias ou captura corporativa do Estado e das negociações internacionais;

– Enfoque na redução de intensidade de emissões e transferência da responsabilidade ambiental para os agricultores fornecedores;

– Aumento da produção/exportação de carnes e laticínios, tratados de livre comércio e pressão sobre pequenos agricultores.

Declaração de Sena Madureira, 17 de junho de 2018

Povos das florestas se reuniram em Sena Madureira, Acre, para denunciar as falsas soluções do capitalismo verde e exigir o direito a suas terras. A retomada dos Jaminawa de seu território foi celebrada como exemplo da força da união dos povos.

 

Entre 15 e 17 de junho de 2018, povos indígenas e de comunidades que vivem e trabalham na floresta se reuniram em Sena Madureira, Acre, para denunciar as falsas soluções propostas pelo capitalismo verde para as degradações ambientais e climáticas – causadas, paradoxalmente, pela própria lógica capitalista de produção e consumo insustentáveis. Denunciou-se os projetos que creem na falácia de que é possível seguir poluindo a terra, a água e a atmosfera em determinado ponto do planeta e “compensar” esta poluição por meio da manutenção de florestas em outra região. Além da impossibilidade, tais medidas acabam por prejudicar as populações que de fato se relacionam com as florestas de maneira equilibrada – os indígenas e as pequenas comunidades que trabalham nas florestas -, que acabam por perder a autonomia sobre seus territórios a sua capacidade de produção e subsistência.

O estado do Acre é tido como um “laboratório” para estas políticas de “compensação” e ali as comunidades tradicionais vêm sofrendo com estes projetos, sejam de REDD, REDD+, REM, PSA – as siglas são várias. Os nomes também, e ainda mais complicados: REDD significa “Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal”; o REM é “REDD Early Movers”, que são, na tradução, os “pioneiros do REDD”; PSA quer dizer “Pagamento por Serviços Ambientais”. Em comum entre estas siglas e nomes todos é que são as medidas do capitalismo verde para seguir poluindo livremente, às custas dos direitos de populações indígenas e tradicionais, que, quando enganadas a aceitarem tais projetos, perdem o direito sobre suas terras.

Em suma, governos e empresas poluidoras do norte global compram “créditos de poluição”, tirando das comunidades do sul o direito ao manejo de suas próprias terras: compram o direito a seguir poluindo, por meio da violação de direitos em outro local, desafiando a soberania dos povos sobre seu território. Privatizam e financeirizam a natureza. Confundem as comunidades com nomes estranhos, em uma linguagem distante das pessoas, e as seduzem com falsas promessas – confundir para dividir, dividir para dominar: assim age o capitalismo verde. Pois em Sena Madureira, assim como antes em Xapuri, os povos das florestas mostram o antídoto a estes ataques: união para resistir, resistir para libertar.

Como que para ressaltar a importância deste encontro, enquanto ocorria o diálogo em Sena Madureira, as empresas de aviação se reuniam em Montreal, Canadá, para discutir tais medidas de “compensação”, que em nada diminuem os níveis de poluição e ainda causam violações de direitos nos territórios onde agem. A expansão de aeroportos no mundo e da indústria aeroviária, altamente poluente, também foi criticada, e é exemplo de como funciona a lógica da “compensação”: há violações de direitos em uma ponta e na outra, enquanto as empresas mantêm seu “discurso verde”, como se de fato enfrentassem os problemas que elas próprias causam. Em Porto Alegre, por exemplo, a Fraport, empresa alemã que opera o aeroporto local, pretende expulsar a Vila Nazaré, que está há 60 anos na região, para que possa estender a pista de pouso por mais umas centenas de metros. A expulsão das pessoas, como de praxe, ocorre de maneira violenta e arbitrária, sem nenhuma transparência no processo – contra o que a comunidade da Vila Nazaré resiste.

De um lado uma comunidade sendo expulsa de sua terra para a expansão de um aeroporto; do outro, populações perdendo o direito a seu território devido aos projetos de “compensação”; no meio, uma lógica destrutiva, que ataca as comunidades nas florestas e nas cidades, e contra a qual estes povos se levantam.

Leia abaixo a íntegra do documento construído no encontro em Sena Madureira, Acre, do qual participaram indígenas Apurinã, Huni Kui, Jaminawa, Nawa, Nukini, Jamamadi, Manchineri, Ashaninka do Envira e Yawanawa, representantes de comunidades tradicionais do interior do Acre, seringueiros e seringueiras de Xapuri, além de organizações como Amigos da Terra Brasil, Conselho Indigenista Missionário (CIMI) e Movimento Mundial pelas Florestas Tropicais (WRM, da sigla em inglês).

DECLARAÇÃO DE SENA MADUREIRA, 17 DE JUNHO DE 2018

Nós, moradores da floresta, seringueiras e seringueiros, indígenas presentes Apurinã, Huni Kui, Jaminawa, Nawa, Nukini, Jamamadi, Manchineri, Ashaninka do Envira, Yawanawa, integrantes de organizações solidárias provenientes de diversos estados do Brasil – como Acre, Amazonas, Mato Grosso, Rio Grande do Sul e Rondônia, professores e professoras de universidades, reunidos em Sena Madureira, Acre – terras ancestrais do povo Jaminawa – para o “IV Encontro de Formação e Articulação dos Povos das Florestas no Enfrentamento das Falsas Soluções”, no período de 15 a 17 de junho de 2018, declaramos:

– Reforçamos as demandas e denúncias da Declaração de Xapuri, em especial o repúdio às falsas soluções do capitalismo verde, tais como o REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal), o PSA (Pagamento por Serviços Ambientais), a exploração madeireira, travestida de manejo florestal, assim como qualquer medida de “compensação” climática ou ambiental por meio da compra de créditos de poluição ou similares;

– Comprometidos com a Declaração de Xapuri, levamos adiante o espírito de união entre os povos e de enfrentamento às “soluções” dadas pelo capitalismo às crises que ele próprio causa;

– A retomada e ocupação Jaminawa de seus territórios ancestrais – Cayapucã, São Paulino e Caieté – nos dá exemplo desta força de união e de enfrentamento aos ataques do poder capitalista contra os povos. Esta conquista revigora e dá forças para que cada um de nós, comunidades, povos e organizações presentes, leve nossa luta comum adiante;

– Enfatizamos a importância das palavras do Papa Francisco na Encíclica Laudato-Si (parágrafo 171): “A estratégia de compra-venda de ‘créditos de emissão’ pode levar a uma nova forma de especulação, que não ajudaria a reduzir a emissão global de gases poluentes. Este sistema parece ser uma solução rápida e fácil, com a aparência dum certo compromisso com o meio ambiente, mas que não implica de forma alguma uma mudança radical à altura das circunstâncias. Pelo contrário, pode tornar-se um diversivo que permite sustentar o consumo excessivo de alguns países e sectores”.

– Da mesma forma, ressaltamos a condenação às medidas de financeirização da natureza contidas no parágrafo 11 da Declaração da Aliança dos Guardiões e Filhos da Mãe Terra (de 28 de novembro de 2015), que diz, a respeito das áreas de floresta primária do planeta que estão tradicionalmente sob os cuidados de povos indígenas: “Estes ecossistemas não devem ser utilizados no contexto de um mercado de carbono que quantifica e transforma a Mãe Terra em mercadoria, nem servir de pagamento para serviços ecossistêmicos, para o comércio de carbono, para as compensações de carbono, para as tarificações de carbono, para os Mecanismos de Redução de emissões decorrentes do desmatamento e da degradação de florestas (REDD), para os Mecanismos de Desenvolvimento Limpo (MDL), ou para mecanismos de compensação da biodiversidade e de financeirização da natureza, transformando-a em ‘partes’ à venda nos mercados financeiros”.

– Rejeitamos o programa REM (REDD Early Movers – “Pioneiros do REDD”, em português), financiado pelo banco público alemão KfW, que induz as comunidades a aceitarem a lógica do capitalismo verde e usa o estado do Acre, indevidamente, como exemplo de “sucesso” em desenvolvimento sustentável. Na verdade, o programa divide as comunidades e ameaça a autonomia dos povos sobre o uso da terra em seus próprios territórios, colocando em risco sua soberania alimentar e seus costumes e saberes tradicionais. Estes mesmos problemas podem acontecer no Mato Grosso, estado no qual recentemente o programa vem sendo implementado;

– Além disso, o dinheiro proveniente destes projetos não responde aos anseios e necessidades das populações originárias e tradicionais, como, por exemplo, a demarcação das terras indígenas e regularização fundiária dos pequenos agricultores e agricultoras de áreas atingidas por medidas de capitalismo verde. Ainda hoje não há transparência sobre como tais recursos são aplicados, como já havíamos denunciado na Declaração de Xapuri. Cobramos do Ministério Público Federal que exija a prestação de contas dos projetos;

– Desautorizamos qualquer política construída dentro de gabinetes sem a devida consulta prévia (em acordo com a Convenção 169 da OIT) e participação das populações indígenas e tradicionais. Qualquer definição de medidas que concernem estas populações deve partir da base, de dentro das comunidades;

– Prestamos solidariedade aos povos de todos os estados do Brasil e dos países do sul global que sofrem estas mesmas violências do capitalismo verde; apelamos aos povos dos países do norte para que não caiam nas artimanhas do “discurso verde” de empresas, governos e ONGs e questionem as aplicações financeiras tais como do programa REM e do Fundo Amazônia, entre outros;

– Repudiamos veementemente a perseguição, difamação e criminalização de defensoras e defensores dos territórios, que tem a coragem de se manifestar e denunciar os ataques dos promotores do capitalismo verde.

Por fim, fortalecidos pelo intercâmbio de experiências entre os mais variados povos durante estes três dias, seguimos com a cabeça erguida e crentes que, unidos, temos plenas condições de lutar contra as falsas soluções do capitalismo verde e de construir formas alternativas de vida sustentável a partir dos territórios, respeitando a pluralidade dos povos. Convidamos todos os povos das florestas e comunidades que sofrem as violações deste sistema desumano e predatório para seguirmos juntos, caminho através do qual será possível superar a lógica destrutiva do capital.

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