Nota Técnica da Amigas da Terra Brasil

O Projeto de Lei 442/2023, que tramita na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, quer declarar a aviação agrícola como de Relevante Interesse Social, Público e Econômico no estado. Em seu artigo 2º, o projeto diz que essa técnica é fundamental para a garantia da eficiência produtiva, abastecimento, segurança alimentar e proteção ambiental, e lista como atividades a semeadura, aplicação de fertilizantes e defensivos, repovoamento de águas, combate a pragas e incêndios. E ainda declara que a aviação agrícola seria livre, autorizada e garantida em todo o território gaúcho.

Pode parecer um projeto para valorizar uma atividade econômica, mas representa, na verdade, a pressão do agronegócio para continuar e expandir a pulverização aérea de agrotóxicos no RS. Essa prática vem sendo denunciada por seus impactos a comunidades e produções agrícolas próximas às fazendas que utilizam essa técnica de aplicação de venenos em lavouras.

Em 2020, a mídia mostrou a contaminação por deriva de agrotóxico em parreirais de uva na região da Campanha. Acompanhamos produtores agroecológicos de assentamentos da Reforma Agrária em Nova Santa Rita, Eldorado do Sul e Tapes, cidades próximas de Porto Alegre, que há 4 anos registram prejuízos econômicos e ambientais com as derivas pelo agronegócio na região. Também denunciam problemas na saúde e temem a contaminação de fontes de água, usadas para consumo humano e na criação de animais para alimentação.  

A pressão popular conseguiu alguns avanços na regulação da pulverização aérea de agrotóxico, mas são localizados e não garantem uma proteção efetiva às pessoas e à natureza. Também não viabilizam a produção agroecológica, sem respeitar o direito dos que querem produzir e de quem quer consumir comida sem veneno.

No Ceará, a mobilização popular resultou numa lei estadual de 2019 que proíbe a pulverização aérea de agrotóxico. O agronegócio tentou derrubar, mas o STF (Supremo Tribunal Federal) manteve a lei devido aos riscos do veneno para a saúde humana e o meio ambiente.

Em defesa da vida, a Amigas da Terra Brasil se soma à luta pelo arquivamento do PL 442/2023 e exige o fim da pulverização aérea de agrotóxicos no RS!

DIVULGAMOS, EM PDF, A NOTA TÉCNICA DA AMIGAS DA TERRA BRASIL QUE SUSTENTA O PEDIDO DO ARQUIVAMENTO DO PL 442/2023 E O FIM DA PULVERIZAÇÃO AÉREA.

BAIXE A NOTA TÉCNICA CLICANDO AQUI

Amigas da Terra Brasil

Encontro de atingidos por agrotóxicos debate vitórias conquistadas e próximos passos em defesa dos territórios e da agroecologia

Meio a invasão da fronteira agrícola e a mercantilização da vida, que dilacera o bioma Pampa e traz uma série de violações de direitos, povos e territórios resistem. Organizado por produtores agroecológicos e assentados do Movimento Sem Terra (MST RS) atingidos pela pulverização aérea de agrotóxicos, com a solidariedade de parceiros urbanos, encontro em Nova Santa Rita (RS) pauta estratégias e alianças da luta por agroecologia, direitos humanos e soberania alimentar

O domingo do dia 17 de dezembro foi marcado por confraternização entre famílias gaúchas atingidas pela deriva de agrotóxicos de Nova Santa Rita, Eldorado do Sul e Tapes, e apoiadores. Com o intuito de revisitar o histórico de luta das pessoas atingidas pelo crime de deriva (pulverização aérea de agrotóxicos), a atividade contou com roda de conversa, relatos diversos e levantamento tanto de violações de direitos como das vitórias dos atingidos. Também foram debatidos os caminhos traçados pela resistência ao modelo do agronegócio (de coexistência impossível) além de estratégias e táticas contra a pulverização de veneno, que incide violentamente no cotidiano de indígenas, quilombolas, comunidades periféricas, pessoas assentadas, pequenas produtoras de alimentos e se estende para além do rural, afetando todos ecossistemas e quem vive no meio urbano. Seja no corpo, na água, no ar ou nos alimentos contaminados por agrotóxicos, venenos, pesticidas, fungicidas e defensivos. Nomes tantos que descrevem verdadeiras armas químicas. Nomes que impactam, mas que importam menos do que o seu efeito na realidade: matam uma morte lenta, silenciosa e perversa, que conta com a impunidade corporativa e com a captura do estado, que é conivente com este modelo de aniquilação. 

Para além das articulações da luta, o momento foi importante por ser uma confraternização das famílias que sofrem tantas violências por parte do agronegócio. Um modelo que avança nas vidas carregando uma forma de ação criminosa, que gera impactos para além do envenenamento. “O agronegócio faz todo o contrário do que a reforma agrária faz, e não deixa acontecer o trabalho na terra. Tira e expulsa as pessoas do campo”, salientou Graciela de Almeida, assentada do MST RS,  que produz sem agrotóxicos e de forma agroecológica¹. A assentada contou que por anos as famílias da região vêm sendo afetadas por verdadeiras chuvas de veneno, utilizado pelo agronegócio. Destacou, ainda, a importância de parceiros urbanos e de organizações socioambientais, que também tornam possível que o trabalho de quem vive o rural, assim como as suas lutas, sejam exemplo em outros lugares. 

“Precisamos continuar nessa luta. Resistir para existir, como o povo da Palestina. Não posso deixar de dizer que viva o povo da Palestina”, comentou em solidariedade, trazendo a conexão das lutas para além de fronteiras impostas pelo capital. Graciela defendeu que é preciso disputar espaços e incidir na esfera internacional, como foi realizado em novembro de 2022, quando uma delegação brasileira e a Frente Contra o Acordo Mercosul União Europeia levaram denúncias a cinco países do continente Europeu. “Fomos  para denunciar precisamente a questão dos agrotóxicos no Brasil e como isso impacta nas comunidades, barrando um desenvolvimento realmente sustentável”, explicou.

Jornada na Europa, em 2022.

Na ocasião, a delegação brasileira, composta por representantes da Amigos da Terra Brasil, da APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), da RENAP (Rede Nacional de Advogados Populares) e do MST realizou uma Jornada pela Europa. Além de denúncias, foram feitas reivindicações em debates que ocorreram com parlamentares, jornalistas, acadêmicos e organizações da sociedade civil. O foco foi apresentar os impactos do Acordo Mercosul – União Europeia sob os povos indígenas, comunidades camponesas e produtoras agroecológicas, ecossistemas e populações atingidas pela mineração e pelos agrotóxicos no Brasil. Colonial e violento, o acordo comercial daria lastro ao avanço do agronegócio, ampliando a liberação de agrotóxicos (proibidos em seus países de origem) na América Latina. Aprofundaria, ainda, a relação de dependência econômica do sul global em relação ao norte, intensificando a superexploração da natureza, dos povos e dos territórios na periferia do sistema, onde estamos situados. 

Acesse todos os depoimentos da Campanha Parem o Acordo UE-Mercosul na nossa playlist no Youtube: embedar link

Confira o Posicionamento da Frente Brasileira Contra Acordo Mercosul-UE, que foi apresentado no Parlamento Europeu

¹ A produção de alimentos de forma agroecológica vai além de um método de produção de alimentos, e se conecta ao todo. É muito mais do que produzir sem veneno, embora englobe este quesito. É uma forma de produção alimentar, mas é uma forma de ser e agir no mundo, que constrói outros horizontes de mundos, com base em valores éticos centrados na vida, e não na lógica de lucro, dos negócios, do mercado ou da mercantilização de tudo. É uma luta permanente, e uma construção permanente que está enraizada na luta pela terra, na consciência e luta de classes, na luta contra o patriarcado, anticolonialista, anti-imperialista, anticapitalista e contra qualquer forma de exploração e dominação. Saiba mais aqui 

 

A luta por alimentos, pessoas e ambientes saudáveis pulsa da semeadura à colheita nos assentamentos do MST, que resistem ao envenenamento da vida

Confraternização em Nova Santa Rita (RS), em dezembro de 2023 | CNDH

A região de Santa Rita é reconhecida pelos assentamentos da reforma agrária que produzem alimentos sem veneno, onde se concentram algumas das áreas de maior produção de arroz agroecológico da América Latina. Também é marcada por um conflito que compromete as formas de vida e de produção econômica de inúmeras famílias da agricultura agroecológica – a pulverização aérea de agrotóxicos em fazendas das proximidades. 

O veneno, aliado ao monocultivo e a uma forma única de compreender a relação com a terra – a da mercantilização, contamina solos, águas, ar, gentes, e bichos, e causa impactos irreversíveis na saúde ecossistêmica. Quem trabalha na terra de uma forma justa e harmônica, garantindo alimentos saudáveis de verdade, que abastecem diversas cidades, acaba sofrendo na pele os efeitos das pulverizações. Queimaduras, feridas, alergias, enjoos, mal súbito, câncer, depressão e sufocamento são alguns dos sintomas da exposição aos agrotóxicos. Sintomas, também, de um sistema nefasto que entende que mais importante que alimentar o país, é produzir commodities para o capital estrangeiro. O lucro do agronegócio significa  contaminação. É o empobrecimento das famílias, o empobrecimento geral. 

Fernando Campos, da Amigas da Terra Brasil, expôs:Para nós é muito importante essa virada de ano com uma perspectiva de alguma forma positiva. O que acontece aqui acontece, de alguma forma, em vários lugares. A grande diferença é a gente reunir forças para conseguir enfrentar esse grande setor que é o agronegócio, que tem por trás de si empresas, corporações que estão no mundo inteiro tomando territórios. Expulsando pessoas do campo e levando para a cidade, empobrecendo o nosso povo. Seja com as doenças, seja com a ação permanente de uso dos agrotóxicos como arma química na expansão do território,  impossibilitando quem está na sua volta e que tem outra relação com a agricultura (sem veneno, sem transgênico) de sobreviver.  A decisão do uso destas tecnologias de morte não param na cerca, elas vão para o mundo”. 

Confraternização em Nova Santa Rita (RS), em dezembro de 2023 | CNDH

Tendo isso tudo em vista, os presentes no encontro debateram quais foram os desafios e conquistas de 2023, se posicionando contra o modelo de produção do agronegócio e traçando um horizonte de construção para a soberania alimentar. Foram discutidos aspectos como ferramentas de luta, ferramentas legais, com marcos como a assessoria jurídica aos afetados, além da lei que restringe as pulverizações aéreas na região metropolitana, mais especificamente na zona de amortecimento do Parque do Delta do Jacuí. 

Fernando ressaltou que para avançar na luta contra o veneno é preciso de ferramentas e se instrumentalizar, até mesmo para que seja possível reunir provas e realizar denúncias de forma concisa. A recente garantia de estações climatológicas em cidades que sofrem com a deriva de agrotóxicos foi um dos passos fundamentais nessa direção. “Conseguimos, a partir das conversas e diálogo, garantir para famílias de Nova Santa Rita, do assentamento Santa Rita de Cássia, assim como de Tapes e Eldorado, cada um ter uma estação climatológica para poderem eles mesmos terem seus dados das medições de vento, velocidade, temperatura. Aqui em Santa Rita há uma no parque mesmo, iniciativa muito importante da prefeitura. Mas é importante que as famílias tenham as suas próprias  informações, os seus dados, para bater com os dados do Estado”, analisou. 

A instalação das estações citadas está prevista para janeiro de 2024, junto a um conjunto de iniciativas e ações para fortalecer a luta das famílias afetadas pela deriva. Entre elas, formas para monitorar e documentar violações de direitos. “A gente sabe que ter uma vida, que viver do lado do agronegócio não é possível produzindo agroecologia. A gente precisa de fato mudar essa realidade. Por isso, também, que a ideia da poligonal, de uma área livre de agrotóxicos aqui na região, importa muito”, frisou Fernando. 

Confraternização em Nova Santa Rita (RS), em dezembro de 2023 | CNDH

Emerson José Giacomelli, militante do MST, assentado do Assentamento Capela e Secretário de Agricultura de Nova Santa Rita, destacou a Lei da Deriva e a importância de ferramentas de luta construídas coletivamente.  Mencionou, também, as políticas públicas do município voltadas para a agroecologia, para produtores de melão, pequenos produtores e quanto ao meio ambiente e educação, afirmando que uma diversidade de programas chegam nas propriedades. Citou, ainda, convênio com laboratório de São Paulo, responsável pela análise de amostras para detectar agrotóxicos, que já vem sendo utilizado e será posto à disposição dos assentados. “Começaremos o ano na Secretaria da Agricultura com orçamento de mais de 11 milhões. Poucos municípios têm investimento e prioridade tão fortes para a agricultura familiar como Santa Rita. Mas não podemos nos acomodar, mesmo com novos projetos e parcerias”, destacou, se comprometendo a buscar parceria com o Governo Federal para ampliar o atendimento aos atingidos.

Álvaro Dellatorre, da Cooperativa Central dos Assentamentos do Rio Grande do Sul (Coceargs), definiu a confraternização e o momento trazendo o conceito de agroecologia. “Achávamos que a técnica pela técnica resolvia as questões, mas chegamos no conceito de agroecologia. O que acontece aqui nessa roda de conversa é exatamente essa dimensão, porque percebemos que atrás da técnica há sociologia, antropologia, outras dimensões da vida que explicam a agroecologia, que permitem que entidades e pessoas que não estão produzindo somem nesse processo. Isso é o que vemos aqui”.  

A agroecologia, presente no trabalho do MST e de atingidos pela pulverização de agrotóxicos de Nova Santa Rita, é um exemplo de realização do direito humano à alimentação. Este direito deve tratar da alimentação saudável considerando quantidades adequadas, qualidade dos alimentos, serem livres de substâncias tóxicas e adversas, serem ambientalmente sustentáveis, acessíveis e disponíveis para todos.  A Promotora de Justiça aposentada do Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP RS) e  especialista em Direito Humano à Alimentação Adequada, Miriam Balestro, incidiu na conversa destacando que o direito humano à alimentação adequada tem que ser cada vez mais mobilizado e utilizado como instrumento de luta. 

“O que ocorre hoje no Congresso Nacional é que o agronegócio, por suas curvas, está atacando o direito humano à alimentação adequada previsto no artigo 6º da Constituição Federal. Eles querem trocar a palavra por segurança alimentar. Segurança alimentar não é o direito, é a política. É como dizermos que direito a remédio de hospital é direito à saúde, não é. A construção internacional fala de direito à alimentação”, denunciou. De acordo com Miriam, o Brasil tem a melhor legislação do mundo quanto a direito à alimentação, o problema é que ela é pouco utilizada. 

 

O agro é morte, o agro é emergência climática

Confraternização em Nova Santa Rita (RS), em dezembro de 2023 | CNDH

Para além do agronegócio e da violência do uso de agrotóxicos, assentadas e produtoras rurais enfrentam ainda questões da emergência climática.  Esta, intensificada justamente pela sanha de poder de corporações e empresas, especialmente do setor minerário e do agronegócio, este segundo que impõe o avanço da fronteira agrícola. A consequência é o desmatamento e perda de biomas, para além do extermínio de povos tradicionais e uma série de violações de direitos. No Brasil, sexto maior emissor de dióxido de carbono (CO2), gás poluente que mais tem impacto no aquecimento global, o principal fator de emissão está conectado ao desmatamento, que provém da alteração de uso de solo liderada pelo agronegócio. 

“A questão ambiental é uma questão de direito humano. O que acontece com o problema da deriva, das enchentes, catástrofes ambientais, é problema de direito humano. Estamos vivendo um novo momento histórico. Não existe pensar um mundo diferente se a gente não incorporar a dimensão ambiental no que faz. E o componente carbonero é um componente fundamental da nossa estratégia, a luta só começou”, contextualizou Dellatorre. 

Marina Dermmam, presidenta do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), relatou como este vem trabalhando dentro da temática:  “O CNDH começou atividades hoje cedo nos assentamentos para verificar como a emergência climática têm atravessado a realização dos direitos humanos de vocês. A maioria aqui foi vítima, também, das últimas enchentes. Perderam novamente suas produções. Não bastasse o agronegócio e o veneno, agora vem as questões climáticas. Junto com o Conselho viemos com equipe de relatores aqui para monitorar as violações e conhecer a realidade”. 

Leia também a reportagem do Jornal Brasil de Fato:  Missão do Conselho Nacional de Direitos Humanos visita assentamentos inundados – Objetivo do conselho é elaborar um diagnóstico sobre os impactos das emergências climáticas no direito à alimentação

Fé na luta

Embora a ofensiva do capital e do agronegócio sigam ameaçando a vida, é na organização da luta coletiva que se faz caminho para garantir uma alimentação que considere a potência da sociobiodiversidade, saudável para os povos e para os ecossistemas

“O agronegócio é um setor tóxico, que vive do empobrecimento das pessoas. É muito triste ver pessoas que lutaram pela terra, que buscam os seus direitos, que estão em luta para garantir um ambiente saudável, sendo atacadas permanentemente pelo agronegócio”, expôs Fernando Campos. Apesar de abordar a realidade brutal no campo, Fernando destacou que ao mesmo tempo há muita esperança, e que encontros como este emanam força pois reforçam que não há como defender o indefensável, ou naturalizar o envenenamento massivo. Como retratou: “Estamos do lado certo da história. Não é mais admissível o uso do agrotóxico. O agronegócio é um setor criminoso, formado por pessoas sem escrúpulos, sem ética, que realmente fazem de tudo pelo lucro. A gente lida com questões éticas, ambientais, de cuidado. Eles não” 

Além das iniciativas previstas para 2024, que dão chão para que a luta travada pelos atingidos pela deriva seja mais justa, a sociedade vem se organizando. O próprio PL do Veneno vem sendo acusado. “Todo mundo que tem consciência do mal dos agrotóxicos deve se unir, somar e fazer a sua parte para que a gente possa derrotar esse projeto de morte, que tem matado no meio urbano e no meio rural. Com uma situação muito crítica de contaminação real de químicos”, mencionou Fernando. 

Apesar das dificuldades e do tamanho do inimigo, encoberto em dinheiro marcado à sangue, há uma boa perspectiva de avanços das lutas dos povos. Há um vasto somatório de esforços, de organizações que estão juntas pelo fim da contaminação, para enfrentar o terror. Meio a políticas de morte emergem potências de vida, que vêm dos esforços coletivos, do trabalho árduo no campo e do suor cotidiano de quem produz para alimentar gentes, para correrem livres os rios e os ventos, para crescerem as matas em toda sua diversidade. E neste cuidado com a terra, com os biomas, uns com os outros, que a luta dos assentados contra os agrotóxicos se apresenta também como uma luta pela possibilidade de mundos socialmente justos e ecologicamente equilibrados. 

 

Pulverização de agrotóxicos é debatida no Fórum Social Mundial de Porto Alegre

Famílias assentadas, organizações e movimentos sociais debatem problemáticas da pulverização de agrotóxicos no Fórum Social Mundial de Porto Alegre e constroem aliança para garantir a produção de alimentos sem veneno

Importância da solidariedade internacionalista e da articulação entre países da América Latina para combater o avanço dos agrotóxicos é enfatizada nos debates. Foto: Maiara Rauber

Nos dias 23 e 24 de janeiro, as famílias Sem Terra participaram do Fórum Social Mundial de Porto Alegre e debateram sobre as problemáticas da pulverização aérea de agrotóxicos na mesa ‘Povos contra agrotóxicos na República Sojeira’.

Também estiveram presentes representantes do Movimento Ciência Cidadã, em colaboração com Multisectorial Paren de Fumigarnos (AR), Red Nacional de Accion Ecologista (Renace – AR), Instituto de Salud Socioambiental da Universidad de Rosario (AR), Famílias do PA Santa Rita de Cássia II e Integração Gaúcha, Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares (RENAP), Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Sem Terra (MST RS), Rede Irerê de Proteção à Ciência, Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (InGá), Terra de Direitos, Amigos da Terra Brasil, Associação Brasileira de Agroecologia (ABA), Fórum Gaúcho de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos, Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (AGAPAN), Comissões de Produção Orgânica (CPORG), Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Cooperativa Central dos Assentamentos do RS (COCEARGS), Instituto Preservar, Jornal Brasil de Fato RS, Rede Soberania e GT-Saúde/Abrasco.

A mesa, dividida entre dois encontros, contou com troca de relatos e experiências entre companheiros de luta do Brasil e da Argentina. A partilha foi de vivências forjadas pelas desigualdades do capitalismo, que avança com um modelo de produção de alimentos primário exportador (o agronegócio) de alto impacto negativo nos biomas, responsável por danos irreversíveis nos territórios além de inúmeras violações de direitos destes e dos povos. Modelo assinalado ainda por uma relação de dependência econômica do Sul Global em relação ao Norte, que incide no cotidiano de pequenos produtores rurais por meio da violência, destruição da sociobiodiversidade, poluição, envenenamento, falta de incentivo via políticas públicas, desestruturação de suas formas de produção e de vida e perseguição política.

Mas para além do descaso do estado e do desamparo presente nos relatos, o otimismo da vontade foi o horizonte das pautas discutidas. De forma propositiva, também foram elencadas estratégias para barrar a deriva de agrotóxicos, a pulverização aérea de veneno e as violências contra pequenos produtores rurais, propondo o direito à terra, trabalho, comida e à produção de alimentos saudáveis. Na confluência de saberes e realidades, os movimentos e coletivos presentes se fortaleceram, dando início a uma aliança latinoamericana para dar um basta às violações dos corpos, territórios e da natureza imposta por uma minoria muito rica que comanda o agronegócio.

Visita a assentamentos conta com troca de experiências entre Argentina e Brasil e proposição de reivindicações coletivas para barrar as violências dos agrotóxicos nos países

No primeiro dia da atividade ‘Povos contra agrotóxicos na República Sojeira’’, foi realizado um roteiro de reconhecimento dos espaços atingidos pela pulverização aérea nos últimos anos. Inicialmente os participantes reuniram-se no Viveiro Bourscheid, no Assentamento Santa Rita de Cássia II, em Nova Santa Rita, na região Metropolitana de Porto Alegre (RS). O viveiro é o único com certificado orgânico no Rio Grande do Sul. Espaço que resiste às derivas e as ameaças latentes advindas dos agrotóxicos pulverizados nas proximidades, apontando que outros caminhos para a produção de ervas, temperos, hortaliças e medicinas da natureza, assim como o sonho de uma alimentação saudável, são uma realidade não apenas possível, mas que já vem sendo construído na prática. Realidade que também se traduz na segunda visita do dia, realizada em outra propriedade de assentados da região, muito reconhecida pela produção de morangos orgânicos.

Nos locais os visitantes tiveram uma contextualização histórica sobre o processo de produção de alimentos orgânicos e agroecológicos, assim como das lutas cotidianas travadas pelos assentados. Houve a identificação dos problemas enfrentados, das estratégias adotadas e das implicações das pulverizações de agrotóxicos na vida das famílias afetadas. Também foram apresentadas as articulações com comunidades urbanas e laços estabelecidos com a sociedade local e regional.

O assentado e produtor de mudas Adir Bourscheid, um dos primeiros a relatar a deriva da pulverização de agrotóxicos na região de Santa Rita. Foto: Maiara Rauber

As famílias dos assentamentos de Reforma Agrária Itapuí, Santa Rita de Cássia II e Integração Gaúcha relembram os momentos que enfrentaram em 2020 e 2021, nas quais foram atingidos pela deriva de agrotóxicos pulverizados por aviões agrícolas utilizados por grandes produtores de arroz convencional do município de Nova Santa Rita. Os herbicidas afetaram a saúde de agricultores, moradores, culturas orgânicas, animais e agroecossistemas locais, como consequência de voos rasantes de aviões com agrotóxicos sobre e nas proximidades das áreas dos assentamentos, onde se concentram também algumas das áreas de maior produção de arroz agroecológico da América Latina.

Entre os diversos sentimentos presentes, esteve a tristeza pelas violações nos territórios, com impactos traduzidos em estiagens prolongadas, como a de 2020, no envenenamento das águas, e nas ameaças constantes das pulverizações. Foram evidenciados casos de câncer devido ao contato com o veneno, doenças de pele, alergias, bolhas na pele, adoecimento e enfermidades tantas.

A partilha de relatos sobre a realidade da vida no campo, com enfoque na produção agroecológica, contou com falas como a da companheira argentina Flavia Zenotigh, da organização Mujeres Rurales Campo Hardy y Zona. Ela abordou os impactos do modelo do agronegócio e dos agrotóxicos na vida das mulheres argentinas do campo, que muitas vezes passam por situações como abortos espontâneos pelo contato com o veneno, ou nascimento de crianças com doenças e deformações. Além de um cotidiano evidenciado pela perda de suas crianças, revelou ainda que o câncer alcança índices elevados em seu território, afetando drasticamente as companheiras. Contexto situado dentro da conivência do estado Argentino, que como expôs sua fala, adota políticas que dão as costas aos pequenos agricultores. “E a justiça não nos escuta”, acrescentou. Caso semelhante ao do Brasil, e até mesmo de Santa Rita, com fiscalização que em uma das denúncias feitas demorou 15 dias para ser realizada.

Flavia Zenotigh, da organização Mujeres Rurales Campo Hardy y Zona, abordou os impactos do modelo do agronegócio e dos agrotóxicos na vida das mulheres argentinas do campo na Argentina. Foto: Maiara Rauber

O assentado e produtor de mudas Adir Bourscheid, um dos primeiros a relatar a deriva da pulverização de agrotóxicos na região de Santa Rita, comentou: “Em 2015 fomos atingidos pela primeira vez e ninguém dizia que era veneno, era falado que era falta de água. Tinha veneno por cima de tudo, eu denunciei. Chegamos aqui e construímos o que construímos para persistir na terra, persistir em ir contra o veneno. É difícil fazer uma muda orgânica, mas não vamos parar, porque primeiro de tudo vem a saúde”.

Os impactos das derivas também se dão na vida econômica dos produtores, com perdas que podem comprometer a subsistência das famílias, a ida a feiras e o abastecimento com alimentos em regiões inteiras. Adir resgatou ainda a conexão política com a pauta, mencionando a importância do Movimento Sem Terra e das políticas do governo de Lula para que pudessem tocar o projeto do viveiro.

A questão, que como o próprio assentado e produtor orgânico de morangos, Olímpio Vodzik, ressaltou, vai para além da terra. Olympio, além de contar a história de sua propriedade e a importância da produção agroecológica, que garante inclusive a potabilidade das águas e o equilíbrio ecológico dos locais, destacou a importância dessa forma de produção na fertilidade do solo, na diversidade da vida. E o quanto desde que se assentou no local, numa relação afetuosa com o espaço e sem uso de venenos, foi possível perceber melhorias neste.

A questão, que como o próprio assentado e produtor orgânico de morangos, Olímpio Vodzik, ressaltou, vai para além da terra. Foto: Maiara Rauber

A violência permeia os relatos da resistência contra a pulverização de agrotóxicos no Brasil e na Argentina. Mas para além dela, a indignação, na coletividade e construção das lutas, se torna mobilização para seguir. O assentado do MST, João Vitor de Almeida,  insistiu na cooperação, articulação das lutas, e pressão dos de baixo ao poder público e à justiça para garantir o direito à terra, produção, trabalho e vida digna. “A última vez que nós ficamos muito sufocados era cinco horas da manhã e o avião estava passando. E às cinco da manhã é hora que ninguém fiscaliza. E se as famílias não reclamam, elas não se movimentam. O agronegócio vai corrompendo e vai criando mecanismos que tornam tudo possível novamente. Então a lei é importante, mas mais importante é a consciência e a mobilização das famílias, de que não é possível conviver com agroecologia e agronegócio”, relatou. Evidenciando a importância das alianças de luta, João complementou: “ Temos que juntar todas nossas forças possíveis para que a gente possa produzir alimentos saudáveis, cuidar do ambiente, da terra e do nosso trabalho. E é isso que temos feito nos últimos anos, enfrentando todas as dificuldades possíveis. E o que estamos propondo, diante de todas as dificuldades que enfrentamos é que nós precisamos ampliar essa relação para um processo de luta maior a partir das comunidades locais. Porque uma árvore não se planta de cima para baixo, e nós temos que produzir a luta de baixo para cima”.

Encontro na Assembleia Legislativa apresenta reinvindicações das lutas e proposições para frear o agronegócio

No segundo dia (24) do Fórum Social Mundial de Porto Alegre, o debate da temática, desta vez aberto ao público, teve sequência na Assembleia Legislativa do RS. Lá, trouxe reflexões a nível de América Latina, de Brasil, mas também abordou informações mais específicas dos casos ocorridos em Nova Santa Rita e Eldorado do Sul, assim como em Santa Fé (AR).

Carlos Manessi, da Multisectorial Paren de Fumigarnos (AR), explanou sobre a realidade Argentina. “As condições são as mesmas, temos agora na Argentina  o presidente Alberto Ángel Fernández ,respaldado pelo CEO da Syngenta, principal promotora desse modelo que temos agora em presidência. Falo para que tenham ampla ideia. Manessi acrescentou ainda que em Santa Fé há 20 milhões de hectares cultivados com soja: “Na nossa província, local da qual venho, temos três milhões e meio de hectares, 70% do nosso território está coberto com soja. Isso corresponde a 70% das terras cultivadas. É muitíssimo. É monocultura, monocultivo demais. Demais”, situou.

Em sua fala, abordou os casos de inundações, secas, contaminação de rios e desmontes decorrentes do modelo do agronegócio, diretamente relacionado ao uso de agrotóxicos e transgênicos. “Santa Fé perdeu 50% da colheita. Uma lagoa com 20km de peixes mortos pela seca em grande lagoa que temos. São impactos tremendos que estamos sofrendo”, contou, estabelecendo um paralelo com os impactos na saúde coletiva.  “Os impactos na saúde são muito grandes e não podemos seguir permitindo que nossos vizinhos sofram o que sofrem agora. Então a nossa ideia na Pare de Fumigarnos e esse coletivos de organizações é, para começar, garantir mil metros livres de fumigação… Não podemos permitir mais isso tudo. Vocês no Brasil, nós na Argentina, e paraguaios, uruguaios e bolivianos”.

Manessi também refletiu sobre a importância desse intercâmbio de informações entre organizações e movimentos de luta, inclusive como ação estratégica para frear a emergência climática: “Somos parte do ambiente, a cadeia do sistema agroindustrial é responsável por quase de metade dos gases de efeito estufa de efeito global. A mudança climática que presenciamos e sofremos está fortemente influenciada por esse modelo de produção agroindustrial. Esse sistema de produção agrária com toda cadeia de valor produz mais de 50% por cento dos gases de efeito estufa que nos leva à mudança climática”.

Somando nessa fala, Gabriel Adrian, do Instituto de Saúde Socioambiental da Universidade Nacional de Rosário (AR), elucidou que as articulações de luta reconhecem a necessidade de transformar o modelo do agronegócio, que gera doenças, mortes e consequências socioambientais nefastas. “Nesse século enfrentamos alguns desafios na saúde coletiva que tem a ver com aquecimento global, com surgimento de futuras pandemias. O modelo agroindustrial gera condições para que possam emergir novos microrganismos com potencial pandêmico, com a forma que são criados industrialmente os animais”, explicou, contextualizando que hoje vivemos em ambientes repletos de substâncias tóxicas como nunca ocorreu em outro momento da história. “Frente a todas essas ameaças, o que os companheiros querem reivindicar não se trata de nada mais que uma forma de produzir, um modo de vida.  Entendemos que os modos de vida agroecológicos são reivindicados porque são os modos de vida que nos permitem enfrentar todas essas ameaças e desafios”, sintetizou.

Adrian defendeu ainda que os sistemas agroecológicos são resilientes,  capazes de captar a sociobiodiversidade: “Frente a possibilidade de sofrimento de pandemias, os sistemas agroecológicos são os sistemas que defendem a imunidade coletiva, de toda sociedade. Contra a carga tóxica que há no ambiente, na água, no solo, no ar, os sistema agroecológicos são os que nos permitem recuperar os territórios para vivermos de modo saudável”, demarcou. Em sua exposição, reconheceu a importância da trajetória construída nas lutas, mas questionou quais compromissos  devem ser assumidos desde o setor da saúde para estar à altura histórica do momento em que estamos vivendo. “Por mais que tenhamos ideias e linhas de trabalho, é necessário recuperar desde as vivências que têm as comunidades e povos. É preciso transformar o sistema de saúde atual em um sistema capaz de produzir saúde”, comentou.

Adalberto Martins, da direção nacional do MST, apresentou em dados a problemática do agronegócio em nosso país, relacionando ao caso argentino. Evidenciou que o Brasil é o maior consumidor de veneno,  assinalando  que grande proporção dos agrotóxicos consumidos aqui são proibidos em seus países de origem.  “No Brasil, nas nossas lavouras temporárias que deveriam ser produção de alimentos, estão destinados em três cultivos: soja, milho e cana. Falamos de cerca de 40 milhões de hectares de soja, outros 22 milhões de milho, nove milhões de cana..  Isso implica para nós uma imensa concentração de riqueza, uma imensa concentração de terra, uma imensa concentração de insumos, e nesse caso os agrotóxicos saltam aos olhos no caso brasileiro. Nós somos o maior consumidor de veneno do mundo”, anunciou.

Adalberto Martins, da direção nacional do MST, apresentou em dados a problemática do agronegócio em nosso país, relacionando ao caso argentino. Foto: Maiara Rauber

A advogada e ouvidora da Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul, Marina Dermmam destacou em sua fala o descaso do poder público em relação a fiscalização de crimes vinculados à agrotóxicos, mencionando a relevância do trabalho jurídico realizado para ajudar as famílias atingidas por pulverização aérea de agrotóxicos em Nova Santa Rita. “Os agrotóxicos podem violar uma série de direitos humanos, em especial os direitos que chamamos de DHESCAs (Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais). A gente tem uma série de legislações muito protetivas aqui no Brasil, especialmente que surgiram na década de 80 e 90: o nosso plano nacional de meio ambiente, a política nacional de meio ambiente, leis de crimes ambientais, de fato são muito protetivas, mesmo no que teve em desregulamentação no último momento que vivemos. Mas é um grande desafio quando vamos no sistema de justiça procurar responsabilidade”, mencionou. Marina manifestou ainda a importância dos polígonos de exclusão, locais em que a pulverização de agrotóxicos deve ser proibida.

Acordo Mercosul-União Europeia: acordo comercial sem participação dos afetados intensifica projeto neocolonial de superexploração dos povos e territórios no Sul Global

Para além das lutas cotidianas nas bases dos territórios, abordadas nos encontros do “Povos contra agrotóxicos na República Sojeira”, foi dimensionada como estas se travam dentro da geopolítica global. Na correlação de forças entre centro e periferia do sistema capitalista, países embobrecidos por esta economia hegemônica, como os da América Latina, são grifados pela violenta situação de dependência escancarada no modelo primário agroexportador do agronegócio. Modelo que privilegia o desenvolvimento dos países colonizadores, como os membros da União Europeia, a partir do subdesenvolvimento e superexploração do Sul Global.

Na prática, um acordo que intensifica o racismo ambiental, o ecocídio, a mercantilização da natureza e o genocídio dos povos indígenas, quilombolas,  ribeirinhos, tradicionais, campesinos e das periferias, que são os mais afetados pela emergência climática. Emergência essa causada pelo capitalismo e diretamente fomentada pelo agronegócio, ainda mais tendo em vista que o maior motivo de emissões de gases poluentes da atmosfera no Brasil é a alteração de uso de solos, via desmatamento para a ampliação da fronteira agrícola.

Exemplos que escancaram essa realidade são acordos como a Alca, barrado pelas lutas anos atrás. Caso que a assentada do MST e atingida pela pulverização de agrotóxicos, Graciela Almeida, trouxe a memória evidenciando a necessidade de uma rearticulação para também vetar o Acordo Mercosul- União Europeia, agora em abertura de diálogo no governo Lula.

Graciela Almeida, trouxe a memória evidenciando a necessidade de uma rearticulação para também vetar o Acordo Mercosul- União Europeia, agora em abertura de diálogo no governo Lula. Foto: Maiara Rauber

Logo, na luta contra a exploração dos corpos, territórios e da natureza na América Latina, este acordo é mais um ponto a ser considerado. Ele se relaciona diretamente com o avanço do agronegócio, que traz o uso de agrotóxicos que poluem águas, solos, afetam a saúde e integram um modelo de produção desigual. Graciela abordou essa situação de dependência econômica prolongada pelo Acordo, assim como o uso de agrotóxicos como armas químicas a qual estão submetidas as comunidades. O Acordo Mercosul-União Europeia a maioria das pessoas  desconhece. Quem conhece um pouco, e um pouco porque nem sequer foi traduzido nas línguas dos países que supostamente estão envolvidos, sabe muito bem que é uma nova exploração dos nossos territórios.  É um aprofundamento da exploração do sistema capitalista nos nossos territórios e nos nossos corpos. E isso significa que a fronteira da soja, a república unida da soja como falava a Syngenta, vai querer se expandir muito além. E isso vai acontecer com todas as monoculturas se nós não paramos, não conversamos e dizemos para esse novo governo que não queremos mais exploração nos nossos territórios”, situou Graciela quanto a necessidade de incidência das lutas neste Acordo.

Encontros fortalecem as alianças entre movimentos e organizações que assumem o compromisso no processo de conscientização da sociedade da América Latina

Leonardo Melgarejo, do Movimento Ciência Cidadã, explicou a importância dessa atividade multi-institucional que envolveu ativistas que lutam contra o agrotóxicos na América Latina, e contou com uma comitiva de quatro instituições da Argentina. “Nós discutimos um fato básico, temos doenças que são as mesmas, que afetam as famílias de todos os países da América Latina, que são causadas por agrotóxicos que são os mesmos comercializados com instituições que são as mesmas. Precisamos estabelecer uma forma de defesa conjunta para atuarmos de uma mesma maneira e não isoladamente, para atuarmos conjuntamente contra este problema que se associa aos avanços das lavouras transgênicas, das lavouras geneticamente modificadas tolerantes agrotóxicos que estão inundando os nossos territórios”, declarou.

Foi concluído no final do debate a importância de superar processos de alienação da sociedade de todos os países da América Latina, pois segundo Melgarejo a água que habita, que dá vida aos territórios da América Latina está sendo contaminada de maneira irreversível sendo que essa água faz parte dos organismos, das crianças, idosos, e também nos rios, lagos e aquíferos. “Uma maneira de tirar esse veneno dos espaços é evitando que ele chegue lá. Para isso temos que estabelecer mecanismos de comunicação que ajudem a sociedade a tomar consciência do problema que está em andamento e esses mecanismos exigem que nós pautamos ações em comum em conjunto nos vários espaços ao mesmo tempo”, reforçou o integrante do MCC.

Um dos exemplos citados por Melgarejo é o documento produzido pelas famílias assentadas de Nova Santa Rita, o qual conta a sua história e as estratégias que vem desenvolvendo para estabelecer essas alianças com as populações urbanas. Para fortalecer o documento estão captando assinaturas de adesão para levar adiante a sociedade do que acontece aqui no Rio Grande do Sul e que por extensão é o que acontece em todo o conjunto da América Latina.

Por fim, Melgarejo encarou o encontro positivamente, ao destacar a relação estabelecida com companheiros de lugares diferentes da América Latina. E novas etapas dessa luta conjunta já estão previstas. Segundo Leonardo, em junho deste ano haverá um momento na Universidade de Rosário, na Argentina, durante o Congresso de Saúde Coletiva e Saúde Ambiental. Outro encontro será realizado em novembro na cidade do Rio de Janeiro, no Congresso Brasileiro de Agroecologia (ABA).

“Nesse meio tempo nós temos um compromisso de apoiar as instituições que trabalham nessa linha e ajudar a proteger esses ativistas que estão envolvidos com essas ações de proteção, pois eles são perseguidos, discriminados e ameaçados. Devemos construir gradativamente esse processo de conscientização da sociedade da América Latina, e tomar medidas em conjunto para superar essa crise”, finalizou Leonardo Melgarejo.

Acesse o documento na integra.

Texto por Maiara Rauber e Carolina Colorio Reck

Confira alguns dos registros das atividades na nossa galeria de fotos: 

 

Créditos: Carolina C.

Não foi possível estar presente? Confira a transmissão ao vivo  da atividade na Assembleia Legislativa, que conta com apresentação da Carta dos atingidos pela deriva de agrotóxicos e debate internacionalista, da sociedade civil, movimentos e organizações sobre a pauta

Transmissão ao vivo

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Saiba mais sobre a luta contra o Acordo Mercosul- União Europeia na matéria “Delegação brasileira faz Jornada na Europa para denunciar os impactos do Acordo Mercosul-União Europeia”

E aqui você confere  o posicionamento da Frente Brasileira Contra o Acordo Mercosul-UE, que foi apresentada ano passado no Parlamento Europeu 

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