Distrações perigosas e financiamento insuficiente prejudicam os resultados da COP28

O resultado da COP28 (Conferência das Partes do Clima da ONU), que aconteceu em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, não passou nos principais testes sobre a eliminação rápida, justa, financiada e completa dos combustíveis fósseis que o mundo agora precisa para evitar uma catástrofe climática. Embora as delegações oficiais aplaudam o “Consenso dos Emirados Árabes Unidos” alcançado na 28ª Cúpula Climática da ONU (Organização das Nações Unidas), a Federação Amigos da Terra Internacional (FoEI) está alarmada com as enormes lacunas incluídas nesse consenso, que só servem para prolongar a era dos combustíveis fósseis.

“O acordo da COP28 ficou aquém dos compromissos significativos sobre a eliminação gradual dos combustíveis fósseis e do financiamento climático urgentemente necessário. O acordo abre as portas para distrações perigosas – como captura, uso e armazenamento de carbono, hidrogênio, energia nuclear, tecnologias de remoção de carbono por geoengenharia e outras engenhocas que mercantilizam a natureza – que impedirão uma transição energética justa e equitativa. E não há nada que impeça que centenas de milhões de toneladas de carbono registradas como créditos de carbono ou compensações sejam contabilizadas como ‘reduções de emissões não contabilizadas'”, explicou Sara Shaw, da ATI (Amigos da Terra Internacional).

O resultado é fraco em termos de equidade, pois não faz uma distinção adequada entre o papel dos países desenvolvidos e em desenvolvimento na transição para longe dos combustíveis fósseis, apesar de suas responsabilidades históricas diferenciadas pelas emissões. Ele inclui uma meta global de energia renovável, mas não o dinheiro para torná-la realidade.

“Países ricos como os EUA (Estados Unidos), o Reino Unido e a UE (União Europeia) comemoraram com alegria a linguagem sobre a transição para o abandono dos combustíveis fósseis. Mas não nos esqueçamos de que eles estão entre os maiores poluidores históricos, todos com enormes planos de expansão de combustíveis fósseis, o que expõe sua postura jubilosa como claramente calculada e hipócrita. Eles também não forneceram o financiamento climático devido e necessário para as reduções de emissões, adaptação e perdas e danos nos países em desenvolvimento, seja nesta cúpula ou nas décadas anteriores. É inaceitável que agora eles estejam se apresentando como campeões do clima”, continuou Shaw.

O estabelecimento do mercado global de carbono foi adiado para o próximo ano, após o colapso das negociações do mercado de carbono (nos termos do Artigo 6 do Acordo de Paris) na COP28. Essa é uma vitória para os movimentos de justiça climática que lutam para impedir a inundação de certificados de compensação de carbono, prejudiciais e sem valor, que ocorrerá quando esse mercado entrar em operação.

O fundo de perdas e danos foi lançado no início da COP28, mas ainda há grandes dúvidas sobre sua acessibilidade, uma vez que ele será hospedado pelo Banco Mundial. As contribuições prometidas em Dubai estão muito aquém do necessário: apenas US$ 700 milhões, quando, por exemplo, estima-se que as inundações devastadoras de 2022 no Paquistão tenham causado danos entre US$ 30 a US$ 40 bilhões (1).

“Como esperado, vimos os países mais ricos se esquivarem de suas obrigações nesta COP. Sem dinheiro e sem meios de implementação, os lugares mais afetados pelas mudanças climáticas ficam com as mãos e promessas vazias. Precisamos de trilhões de dólares e recebemos migalhas, além de mais dívidas”, alertou Bareesh Chowdhury, da Associação de Advogados Ambientais de Bangladesh (BELA – Amigos da Terra/AT Bangladesh).

Mais de 2.400 representantes de grupos de lobby de combustíveis fósseis estiveram presentes na cúpula (2), que se caracterizou pela forte repressão às vozes dos povos, tanto na UNFCCC (Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima) quanto no contexto nacional (3).

“Enquanto a COP28 estendia o tapete vermelho para as grandes empresas, os apelos dos ativistas por resultados justos para povos e comunidades eram censurados. Não pode haver justiça climática sem respeito aos direitos humanos, e não seremos silenciados enquanto continuar a chover bombas em Gaza e a Palestina prosseguir ocupada; enquanto as grandes empresas esmagarem os territórios indígenas e os detentores do poder considerarem descartáveis os povos e as pessoas que estão na linha de frente dos impactos da crise climática”, disse Lise Masson, da Campanha Internacional pela Justiça Climática da FoEI.

Referências:

(1) Números do Conselho de Mudança Climática do Paquistão. Veja o artigo: https://www.bloomberg.com/news/articles/2022-10-19/flood-losses-now-estimated-at-40-billion-pakistan-officals-say 

(2) Números da coalizão Kick Big Polluters Out. Veja o comunicado à imprensa: https://kickbigpollutersout.org/articles/release-record-number-fossil-fuel-lobbyists-attend-cop28 

(3) Enquanto a atenção do mundo estava voltada para a COP28, o país anfitrião reprimiu os dissidentes. Veja o artigo: https://www.ft.com/content/f9249386-fb39-4786-b43d-f27933475b87

 

 

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A COP28 deveria proporcionar uma ação climática justa e equitativa, não falsas soluções, alerta a Federação Amigos da Terra Internacional (FoEi)

A segunda semana da COP28 começou com fortes bloqueios aos princípios da justiça climática e um texto aberto às falsas soluções

A causa Palestina é também de direitos humanos e justiça climática

 

Encontro no Acre debate impactos dos projetos REDD , de mercados de carbono e de soluções baseadas na natureza

A Amigos da Terra Brasil participou do encontro “Quando vale uma floresta? Quem paga pode poluir?”, que aconteceu no final de semana e encerrou na 2ª feira (12/06), na cidade de Assis Brasil, estado do Acre, na fronteira do Brasil com o Peru e a Bolívia.

A atividade foi organizada pelo CIMI Amazônia Ocidental (Conselho Indigenista Missionário) e contou com a participação de povos indígenas, comunidades e trabalhadores rurais da Amazônia e organizações sociais.

O principal assunto debatido foram os impactos dos projetos e programas REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação florestal), de mercados de carbono e de soluções baseadas na natureza, que têm crescido no Acre, no Pará e na Amazônia em geral.

Os participantes e as participantes trocaram informações e socializaram experiências, abordando também mecanismos como o PSA (pagamentos por serviços ambientais) e o manejo florestal, falando das ameaças que esses projetos trazem para os povos. O encontro resultou num posicionamento comum entre os presentes, formalizado em um documento aprovado pela plenária do encontro. Esta declaração já manda um forte recado para a cúpula de presidentes dos países amazônicos, que deve ocorrer em Agosto, em Belém (no Pará). Acesse o documento na íntegra AQUI.


À esquerda, Valdenice Nukini puxando o grito: #MarcoTemporalNÃO!
À direita, Seu Pedro Teles, seringueiro, sindicalista e liderança histórica de Xapuri, no Acre. Fotos Lúcia Ortiz/ATBr

Nas fotos, Valdenice Nukini, do Rio Môa no município de Cruzeiro do Sul/Acre, e Pedro Teles, liderança da Resex Chico Mendes (Reserva Extrativista), situada na cidade de Xapuri (Acre). Em sua fala, Valdenice rechaçou o marco temporal e criticou os projetos de REDD e de mercado de carbono. Seu Pedro chamou os povos a se organizarem para terem seu próprios projetos de vida e para não aceitarem projetos que vêm “de fora pra dentro”.

A natureza não é mercadoria! A Constituição Brasileira, em seu artigo 225, estabelece que o meio ambiente ecologicamente equilibrado é bem de uso comum do povo. Entendemos que os processos com os quais a floresta sustenta a vida, como regulação do clima, estocagem de carbono, purificação das águas, preservação da biodiversidade e do solo, precisam ser preservados e defendidos por nós como sociedade e pelo poder público.

NÃO À FINANCEIRIZAÇÃO DA NATUREZA!

*Com informações de Lucia Ortiz (ATBr) e CIMI Amazônia Ocidental

Quem é favorecido com as respostas de Bolsonaro às queimadas?

Adiantamos, já de início: somente o mercado, os grileiros, o agronegócio. E o PL 2633 (antiga MP 910, a famigerada MP da Grilagem), é a maior evidência disso. E bem… Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente, também deixou isso bem claro quando disse que a pandemia do coronavírus é uma grande oportunidade para desmantelar a regulamentação ambiental já que todo mundo está olhando para outro lado.

Frente à urgência e à crescente preocupação da comunidade internacional em relação às queimadas de 2019, a gestão Bolsonaro reagiu com saídas voltadas a interesses financeiros, que de forma alguma abrangem os problemas enfrentados pelos povos da Amazônia. Ao contrário, os colocam em risco ao privilegiar políticas favoráveis aos ruralistas e ao fortalecer medidas de financeirização da natureza. Avançaram no Congresso Nacional projetos que fortalecem medidas como o PSA (Pagamento por Serviços Ambientais), ao mesmo tempo que o governo aproveitou para avançar na proposta de anistia a grileiros de terra, expressa no PL 2633 – incentivando exatamente a prática que está por trás do aumento das queimadas.

Mesmo em meio à pandemia do coronavírus, o PL 2633 pode ser votada a qualquer momento no Congresso Nacional; se aprovado, facilitará ainda mais a ação de invasores de terras públicas. Para o Grupo Carta de Belém, ” […] a legislação permite liquidação das terras e patrimônio público a preço de banana em favor de médios e grandes grileiros” – lembrando ainda que, enquanto isso, “a reforma agrária e a titulação de territórios coletivos seguem paralisadas”.

Essa é a parte 2 da introdução da reportagem “A história do cerco à Amazônia”. Navegue pelo conteúdo voltando à página central ou clicando nos links abaixo:

Parte 1 (página central): A história do cerco à Amazônia
Parte 2: [você está aqui] Quem é favorecido com as respostas de Bolsonaro às queimadas?
Parte 3: O “ganha-ganha” das empresas com a financeirização da natureza
Parte 4: Mas afinal, quem está por trás desses crimes?

E veja também: O cerco explicado em um mapa

Para além da ameaça da grilagem de terras, surgem no horizonte como suposta solução aos problemas climáticos as medidas de “pagamento por serviços ambientais”. Em suma, são uma maneira de monetizar a relação com a natureza; a depender dos fluxos financeiros, pode ser interessante preservá-la em pé ou não. Tais medidas não enfrentam as questões estruturais da problemática do clima e muito menos protegem os povos e seus territórios: ao contrário, deixa-os à mercê das grandes indústrias poluidoras, que invadem a Amazônia para “compensar” suas violações de direitos em outros lugares e a poluição inerente a suas atividades. As comunidades perdem a autonomia sobre seus próprios territórios, transformados em ativos em bolsas de valores e em “fazendas de captura de carbono”, o que leva à criminalização de práticas e culturas ancestrais.

O documentário “Mercado verde: a financeirização da natureza” explica e denuncia as falsas soluções que o capitalismo propõe para os males que ele próprio causa.

A terra, assim, atende somente aos humores do Mercado. A ele que Bolsonaro e o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, respondem, em detrimento da agro-socio-bio-diversidade amazônica. E vejam como não é acaso a escolha das palavras: o atual governo pensa a Amazônia sob o prisma da “bioeconomia”, ou seja, com o viés da exploração dos bens comuns em nome do lucro de poucos. É explícito: para eles, a Amazônia precisa de “soluções capitalistas”. Em outras palavras: devastação, exploração, privatização.

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Continue lendo a introdução:
parte 3: O “ganha-ganha” das empresas com a financeirização da natureza
parte 4: Mas afinal, quem está por trás desses crimes?

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