Visita ao assentamento Apolônio de Carvalho e ao loteamento Guaíba City evidencia danos sociais e ambientais do projeto Mina Guaíba, da Copelmi

Visita às comunidades que serão atingidas pelo projeto da Mina Guaíba – que pretende ser a maior mina de carvão a céu aberto do Brasil -, comprova os impactos socioambientais do empreendimento. Plano é instalar mina a cerca de 15km do centro de Porto Alegre, à beira do Delta do Jacuí. Narrativa que Copelmi, empresa responsável pelo projeto, tenta construir é a de que as pessoas destas comunidades vivem sem “dignidade humana” e que a empresa melhoraria suas vidas. Ora, fomos até lá fazer o que a Copelmi não fez: ouvi-las.

Junto à AMA Guaíba, ao MAM (Movimento pela Soberania Popular na Mineração), ao grupo de pesquisa TEMAS (Grupo de Pesquisa em Tecnologia, Meio Ambiente e Sociedade), da UFRGS, e a comunicadores do Jornal Sul21 e do Coletivo Catarse, visitamos no último sábado (1/6) o Loteamento Guaíba City e o Assentamento Apolônio de Carvalho, território conquistado por lutadoras e lutadores pela reforma agrária do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) em 2007. A área fica entre os municípios de Charqueadas e Eldorado do Sul e estas são as comunidades que a empresa Copelmi quer “reassentar involuntariamente” devido a implantação da Mina Guaíba: se for adiante, ela será a maior mina de carvão do Brasil, à beira do Delta do Jacuí, uma das últimas áreas de proteção ambiental da Região Metropolitana e cujas águas abastecem todo o sistema hídrico  da região com mais de 4 milhões de habitantes, que serão atingidas caso o projeto avance – hoje, ainda precisa de licenciamento ambiental fornecido pela Fepam (Fundação Estadual de Proteção Ambiental). No dia 27 de junho, haverá uma audiência público relativa ao tema.

Sordidamente, a proposta da empresa prevê que as pessoas só seriam retiradas de suas casas e terras após 5 anos de extração do mineral. Ou seja: seriam 5 anos convivendo dia e noite com perfurações, detonações com dinamite, alto fluxo de veículos pesados e ainda a operação das plantas de beneficiamento dos minerais extraídos. Tais atividades trariam impactos como piora da qualidade do ar, ruído e rebaixamento do lençol freático, de onde as comunidades captam sua água para abastecimento. Um dos argumentos que a Copelmi utiliza em seu favor é a geração de empregos. Contudo, a promessa é vazia: serão apenas 331 postos de trabalho criados nestes primeiros anos, durante a fase de implementação; e até 2042, prometem-se outros 823. Deve-se ainda questionar a qualidade dos empregos ofertados; a saúde de trabalhadoras e trabalhadores na extração mineira é extremamente danosa à saúde e uma atividade perigosa: a mineração é a maior responsável por mortes no trabalho ao redor do mundo.

A narrativa que a Copelmi tenta construir é a de que as pessoas destas comunidades vivem sem “dignidade humana” e que a empresa iria melhorar suas vidas. Ora, fomos até estas comunidades fazer o que a Copelmi não fez: ouvi-las. E o que vimos e ouvimos é o oposto do que o engenheiro Cristiano Weber, principal porta-voz da empresa (o nome bonito dado a seu cargo é de gerente de Sustentabilidade Corporativa), declara, com certa arrogância, nos solenes debates em que participa.

É bem verdade que há uma evidente negligência dos poderes públicos municipais, principalmente quanto à qualidade das estradas e ao posto de saúde fechado há mais de dez anos; porém, estes foram os únicos aspectos negativos nas falas de moradoras e moradores. O que vimos foram duas comunidades angustiadas pela incerteza e pela possibilidade de perderem seu “paraíso” (palavra usada por mais de uma das pessoas ouvidas); e indignadas pelas afirmações da empresa, que as trata como indignas, claramente uma mentira. Há muita vontade de lutar pela permanência na área. No dia 11 de junho, haverá uma assembleia popular para tratar do tema; no final do mês, 27 de junho, uma nova audiência pública acontecerá.

O Loteamento Guaíba City é o lar de muitas famílias: algumas já vivem ali há 3 gerações. Há aquelas pessoas que vão somente aos finais de semana pois ainda têm que trabalhar na cidade, mas que pretendem ir para lá definitivamente ao se aposentarem: é seu plano de vida. Outras já conseguiram este feito de “fugir” da cidade. Nos lotes, que são pequenas chácaras, construíram suas casas, perfuraram seus poços, criam galinhas, vacas leiteiras, cavalos, têm pequenas roças e hortas, além de pescarem nos arroios locais (que serão desviados pela mina) e no Rio Jacuí. As crianças vão a pé ou de bicicleta para a escola Osmar Hoff Pacheco, ou de transporte escolar (que, segundo os relatos, funciona bem) para as escolas das cidades do entorno.

Em um abaixo-assinado que percorre o loteamento, uma derrota acachapante da Copelmi: em 82 assinaturas, 77 são contrárias ao projeto – apenas 5 estão ao lado da empresa, que não se cansa de tentar ludibriar a comunidade (no mesmo dia da nossa visita,  um micro-ônibus alugado pela Copelmi levou alguns moradores para uma “churrascada”; segundo relatos, já não era a primeira vez que isso acontecia). Cada assinatura representa um lote, correspondendo à quase 250 pessoas; nem todos os lotes assinaram ainda. A maioria das pessoas não cogita sair de lá “nem morto”, até por que lá existe um cemitério que guarda muitos de seus entes queridos.

O Assentamento Apolônio de Carvalho, apesar de ser relativamente novo (foi criado em 2007) e de todas as dificuldades para se implantar um assentamento, está em pleno funcionamento. Abriga 72 famílias, com grande sentimento de pertença ao território conquistado (que antes era um “haras” de um poderoso traficante). O carro-chefe do Apolônio é a produção do arroz orgânico, o terceiro maior produtor do país, que em conjunto aos demais assentamentos do RS forma nada menos que a maior produção de arroz orgânico da América Latina. Mas a produção vai além do arroz: o assentamento produz “de tudo” – e sem veneno: hortaliças, tubérculos, frutas, chás, temperos, leite, queijo, ovos, carne, peixes, sementes, compotas. Quase tudo necessário à subsistência, e o excedente é comercializado em dezenas de feiras ecológicas em Porto Alegre e Região Metropolitana (ainda atende locais específicos, como, por exemplo, uma clínica oncológica – e por que será?). Produzem também conhecimento e tecnologia, que tem muitos nomes: agricultura orgânica de base agroecológica, controle biológico de enfermidades nos cultivos, permacultura, agrofloresta, bioconstrução. Enfim, mostram na prática uma alternativa viável, que constrói vidas simples mas abundantes e em harmonia com o ambiente. Não seria esta a verdadeira sustentabilidade?

Após algumas tentativas da Copelmi de fingir que as comunidades, tanto do Guaíba City quanto do Apolônio, estariam dispostas a deixar o local onde vivem, foi necessário demarcar suas posições de maneira clara: “Somos contra, porque somos a favor da vida”. Além do que já conseguiram alcançar (terra para plantar, casa para morar, luz, água, o sustento garantido pelo lote), todos tem ainda muitos sonhos: aumentar a produtividade do arroz, ter demanda mais garantida (além das feiras e clientes específicos, faz falta o fornecimento antes feito a escolas através do PNAE [Programa Nacional de Alimentação Escolar], praticamente acabado no contexto atual), que a cidade valorize mais o alimento produzido sem veneno no campo. Ficam a imaginar o quanto de alimentos sem veneno pode ser produzido e posto na mesa de famílias no campo e na cidade ao longo dos 23 anos que a mina pretende operar…

Em suma, é isto que existe a 30 minutos de Porto Alegre e 100 metros acima de um carvão com alto teor de cinzas e baixo poder calorífico. Há, por trás de tudo, a intenção dos países ricos de se livrarem dos danos causados pelas minas, seus impactos sociais, ambientais e trabalhistas: a contaminação das águas; os riscos de explosões e deslizamentos; o trabalho é exaustivo e arriscado; e há ainda a convivência com uma poeira que corrói os pulmões pouco a pouco. No ano passado, a Alemanha se despediu de sua última mina de carvão e o jornal “Bild” publicou o retrato da “última vítima das minas”, Markus Zedler, um trabalhador de 29 anos que falecera dias antes durante as obras de desmontagem de uma mina em Ibbenbüren. Vale ressaltar que a Copelmi conta com o investimento da norte-americana Air Products e da chinesa Zhejiang Energy Group, que serão também operadoras da planta carboquímica.

(O Sul21 também publicou hoje matéria sobre a visita, com relatos das pessoas que serão atingidas pelo projeto da Copelmi – as vozes se erguem contra o projeto de morte da mineração!)

Grandes empresas frigoríficas e de laticínios estão aquecendo o planeta, e logo serão as maiores poluidoras

Novo relatório revela como as estratégias de crescimento das 35 maiores empresas frigoríficas e de laticínios do mundo aumentam suas emissões, prejudicando esforços globais para evitar perigosas mudanças climáticas.

As maiores empresas globais de carnes e laticínios podem virar os piores poluidores do planeta nas próximas décadas, segundo um novo relatório do Instituto para Políticas em Agricultura e Comércio (IATP) e da GRAIN. Quando o planeta mais precisa reduzir suas emissões de gases de efeito estufa, os imensos frigoríficos e laticínios promovem o consumo excessivo ao acelerarem a produção e as exportações, apesar dos compromissos que algumas delas assumiram para reagir à mudança do clima.

O relatório completo em português pode ser lido AQUI.

ALGUNS DADOS RELEVANTES ALCANÇADOS:

  • As cinco maiores empresas de carne e laticínios  do mundo: JBS (Brasil), Tyson Foods, Cargill e Dairy Farmers (US) e Fonterra (Nova Zelândia),  já são responsáveis por mais emissões anuais de gases de efeito estufa do que as petroleiras ExxonMobil, Shell ou BP.
nota: o que não significa desresponsabilizar as petroleiras por seus crimes e abusos. A Amigos da Terra Holanda recentemente levou a Shell aos tribunais; aqui no Brasil, a empresa agiu fortemente no lobby pela estrangeirização do pré-sal, contribuindo para o golpe que esfarelou a nossa democracia

 

  • As emissões combinadas das 20 maiores empresas de carnes e laticínios superam as emissões de nações inteiras, como Alemanha, Canadá, Austrália ou Reino Unido e França.
  • 10 companhias controlavam perto de ¼ de toda a produção global de carne e laticínios em todo o mundo em 2016, com operações concentradas em poucos países com alta produção e consumo de carne e leite, chamados de bloco de proteína excedente, que, somados à China, respondem por cerca de ¾ da emissões globais do setor de carne e laticínios.
  • A maioria das 35 principais empresas de carnes e laticínios não consegue relatar completamente as emissões ou exclui suas emissões da cadeia de fornecimento (emissões da produção de ração animal até o metano gerado pelo gado), que respondem por 80-90% de suas emissões. Ao contrário, relatam aumento da produção, principalmente através de subsídio no preço dos grãos para ração produzido pelo agronegócio e acordos comerciais para diminuir qualquer barreira tarifária a fim de garantir o aumento da exportação.
  • Apenas 14 das 35 maiores empresas de carne e laticínios anunciaram algum tipo de metas de redução de emissões. Destes, apenas 6 incluem as emissões da cadeia de fornecimento e 4 companhias fornecem estimativas abrangentes de emissões:  Nestlé (Suíça), Danone (França), Friesland/Campina (Holanda) e NH Foods (Japão). Entretanto, apenas duas empresas se comprometeram a reduzir suas emissões absolutas: Nestlé, a maior companhia de alimentos do mundo, em 50% até 2050; e Danone, a segunda maior receita da cadeia de laticínios, se comprometeu a chegar a “emissões líquidas zero” em 2050. Lembrando que tais metas são voluntárias, sem contar com um  sistema independente de monitoramento e verificação.
nota: sempre desconfie das promessas de grandes empresas: não é novo, por exemplo, o interesse da Nestlé em privatizar fontes de água – encontro do CEO da empresa com Michel Temer em Davos e o Fórum Mundial da Água [o fórum empresarial oposto ao FAMA, este sim um fórum popular que defende a água como um direito de todas e todos], ocorrido em março deste ano, recolocaram a discussão em pauta

 

  • Entre as empresas que possuem estratégia de redução de emissões, há, contraditoriamente, previsão de aumento de sua produção global entre 2015-2030, como no caso da Danone, em 70%. A redução das emissões de GEE neste período se daria com a adoção conjugada da i) diminuição da intensidade de emissões por kg por parte dos agricultores fornecedores da cadeia de produção (Danone, Fonterra) e; ii) adoção de mecanismos de compensação (offset), por meio de plantio de árvores e conversão de fazendas no Sul Global por meio de práticas agrícolas sustentáveis, embora o Acordo de Paris não aceite compensações para o cumprimento das metas voluntárias.
    nota: tais medidas de compensação fazem parte das falsas soluções que o capitalismo verde prega para que siga poluindo e violando direitos em territórios; o assunto foi tema de debate recente no IV Encontro do Povos das Florestas Contra as Falsas Soluções, no qual o Amigos da Terra participou – leia aqui a carta produzida na ocasião denunciando estas falsas soluções
  • Se o crescimento da indústria global de carne e laticínios continuar conforme projetado, o setor pecuário como um todo poderia responder por 80% do orçamento anual de gases de efeito estufa do planeta até 2050.

Devlin Kuyek, pesquisador da Grain:

“Ao invés de ter que suportar os custos da intensidade de suas emissões para proteger a agenda de crescimento das grandes companhias de carne e leite, agricultores podem, por meio do suporte de programas públicos, realizar uma transição para praticas agroecológicas (…)

Shefali Sharma, diretora do IATP:

“Não existe carne barata. É hora de percebermos que o consumo excessivo está diretamente ligado aos subsídios que fornecemos à indústria para continuar desmatando, esgotando nossos recursos naturais e criando um grande risco à saúde pública por meio do uso excessivo de antibióticos — alerta. Agora, o relatório mostra o papel fundamental que estas companhias desempenham também para as mudanças climáticas.”

No relatório completo você pode saber mais sobre:

Concentração corporativa e de emissões no bloco de países com proteína excedente mais China;

– Portas giratórias ou captura corporativa do Estado e das negociações internacionais;

– Enfoque na redução de intensidade de emissões e transferência da responsabilidade ambiental para os agricultores fornecedores;

– Aumento da produção/exportação de carnes e laticínios, tratados de livre comércio e pressão sobre pequenos agricultores.

Declaração de Sena Madureira, 17 de junho de 2018

Povos das florestas se reuniram em Sena Madureira, Acre, para denunciar as falsas soluções do capitalismo verde e exigir o direito a suas terras. A retomada dos Jaminawa de seu território foi celebrada como exemplo da força da união dos povos.

 

Entre 15 e 17 de junho de 2018, povos indígenas e de comunidades que vivem e trabalham na floresta se reuniram em Sena Madureira, Acre, para denunciar as falsas soluções propostas pelo capitalismo verde para as degradações ambientais e climáticas – causadas, paradoxalmente, pela própria lógica capitalista de produção e consumo insustentáveis. Denunciou-se os projetos que creem na falácia de que é possível seguir poluindo a terra, a água e a atmosfera em determinado ponto do planeta e “compensar” esta poluição por meio da manutenção de florestas em outra região. Além da impossibilidade, tais medidas acabam por prejudicar as populações que de fato se relacionam com as florestas de maneira equilibrada – os indígenas e as pequenas comunidades que trabalham nas florestas -, que acabam por perder a autonomia sobre seus territórios a sua capacidade de produção e subsistência.

O estado do Acre é tido como um “laboratório” para estas políticas de “compensação” e ali as comunidades tradicionais vêm sofrendo com estes projetos, sejam de REDD, REDD+, REM, PSA – as siglas são várias. Os nomes também, e ainda mais complicados: REDD significa “Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal”; o REM é “REDD Early Movers”, que são, na tradução, os “pioneiros do REDD”; PSA quer dizer “Pagamento por Serviços Ambientais”. Em comum entre estas siglas e nomes todos é que são as medidas do capitalismo verde para seguir poluindo livremente, às custas dos direitos de populações indígenas e tradicionais, que, quando enganadas a aceitarem tais projetos, perdem o direito sobre suas terras.

Em suma, governos e empresas poluidoras do norte global compram “créditos de poluição”, tirando das comunidades do sul o direito ao manejo de suas próprias terras: compram o direito a seguir poluindo, por meio da violação de direitos em outro local, desafiando a soberania dos povos sobre seu território. Privatizam e financeirizam a natureza. Confundem as comunidades com nomes estranhos, em uma linguagem distante das pessoas, e as seduzem com falsas promessas – confundir para dividir, dividir para dominar: assim age o capitalismo verde. Pois em Sena Madureira, assim como antes em Xapuri, os povos das florestas mostram o antídoto a estes ataques: união para resistir, resistir para libertar.

Como que para ressaltar a importância deste encontro, enquanto ocorria o diálogo em Sena Madureira, as empresas de aviação se reuniam em Montreal, Canadá, para discutir tais medidas de “compensação”, que em nada diminuem os níveis de poluição e ainda causam violações de direitos nos territórios onde agem. A expansão de aeroportos no mundo e da indústria aeroviária, altamente poluente, também foi criticada, e é exemplo de como funciona a lógica da “compensação”: há violações de direitos em uma ponta e na outra, enquanto as empresas mantêm seu “discurso verde”, como se de fato enfrentassem os problemas que elas próprias causam. Em Porto Alegre, por exemplo, a Fraport, empresa alemã que opera o aeroporto local, pretende expulsar a Vila Nazaré, que está há 60 anos na região, para que possa estender a pista de pouso por mais umas centenas de metros. A expulsão das pessoas, como de praxe, ocorre de maneira violenta e arbitrária, sem nenhuma transparência no processo – contra o que a comunidade da Vila Nazaré resiste.

De um lado uma comunidade sendo expulsa de sua terra para a expansão de um aeroporto; do outro, populações perdendo o direito a seu território devido aos projetos de “compensação”; no meio, uma lógica destrutiva, que ataca as comunidades nas florestas e nas cidades, e contra a qual estes povos se levantam.

Leia abaixo a íntegra do documento construído no encontro em Sena Madureira, Acre, do qual participaram indígenas Apurinã, Huni Kui, Jaminawa, Nawa, Nukini, Jamamadi, Manchineri, Ashaninka do Envira e Yawanawa, representantes de comunidades tradicionais do interior do Acre, seringueiros e seringueiras de Xapuri, além de organizações como Amigos da Terra Brasil, Conselho Indigenista Missionário (CIMI) e Movimento Mundial pelas Florestas Tropicais (WRM, da sigla em inglês).

DECLARAÇÃO DE SENA MADUREIRA, 17 DE JUNHO DE 2018

Nós, moradores da floresta, seringueiras e seringueiros, indígenas presentes Apurinã, Huni Kui, Jaminawa, Nawa, Nukini, Jamamadi, Manchineri, Ashaninka do Envira, Yawanawa, integrantes de organizações solidárias provenientes de diversos estados do Brasil – como Acre, Amazonas, Mato Grosso, Rio Grande do Sul e Rondônia, professores e professoras de universidades, reunidos em Sena Madureira, Acre – terras ancestrais do povo Jaminawa – para o “IV Encontro de Formação e Articulação dos Povos das Florestas no Enfrentamento das Falsas Soluções”, no período de 15 a 17 de junho de 2018, declaramos:

– Reforçamos as demandas e denúncias da Declaração de Xapuri, em especial o repúdio às falsas soluções do capitalismo verde, tais como o REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal), o PSA (Pagamento por Serviços Ambientais), a exploração madeireira, travestida de manejo florestal, assim como qualquer medida de “compensação” climática ou ambiental por meio da compra de créditos de poluição ou similares;

– Comprometidos com a Declaração de Xapuri, levamos adiante o espírito de união entre os povos e de enfrentamento às “soluções” dadas pelo capitalismo às crises que ele próprio causa;

– A retomada e ocupação Jaminawa de seus territórios ancestrais – Cayapucã, São Paulino e Caieté – nos dá exemplo desta força de união e de enfrentamento aos ataques do poder capitalista contra os povos. Esta conquista revigora e dá forças para que cada um de nós, comunidades, povos e organizações presentes, leve nossa luta comum adiante;

– Enfatizamos a importância das palavras do Papa Francisco na Encíclica Laudato-Si (parágrafo 171): “A estratégia de compra-venda de ‘créditos de emissão’ pode levar a uma nova forma de especulação, que não ajudaria a reduzir a emissão global de gases poluentes. Este sistema parece ser uma solução rápida e fácil, com a aparência dum certo compromisso com o meio ambiente, mas que não implica de forma alguma uma mudança radical à altura das circunstâncias. Pelo contrário, pode tornar-se um diversivo que permite sustentar o consumo excessivo de alguns países e sectores”.

– Da mesma forma, ressaltamos a condenação às medidas de financeirização da natureza contidas no parágrafo 11 da Declaração da Aliança dos Guardiões e Filhos da Mãe Terra (de 28 de novembro de 2015), que diz, a respeito das áreas de floresta primária do planeta que estão tradicionalmente sob os cuidados de povos indígenas: “Estes ecossistemas não devem ser utilizados no contexto de um mercado de carbono que quantifica e transforma a Mãe Terra em mercadoria, nem servir de pagamento para serviços ecossistêmicos, para o comércio de carbono, para as compensações de carbono, para as tarificações de carbono, para os Mecanismos de Redução de emissões decorrentes do desmatamento e da degradação de florestas (REDD), para os Mecanismos de Desenvolvimento Limpo (MDL), ou para mecanismos de compensação da biodiversidade e de financeirização da natureza, transformando-a em ‘partes’ à venda nos mercados financeiros”.

– Rejeitamos o programa REM (REDD Early Movers – “Pioneiros do REDD”, em português), financiado pelo banco público alemão KfW, que induz as comunidades a aceitarem a lógica do capitalismo verde e usa o estado do Acre, indevidamente, como exemplo de “sucesso” em desenvolvimento sustentável. Na verdade, o programa divide as comunidades e ameaça a autonomia dos povos sobre o uso da terra em seus próprios territórios, colocando em risco sua soberania alimentar e seus costumes e saberes tradicionais. Estes mesmos problemas podem acontecer no Mato Grosso, estado no qual recentemente o programa vem sendo implementado;

– Além disso, o dinheiro proveniente destes projetos não responde aos anseios e necessidades das populações originárias e tradicionais, como, por exemplo, a demarcação das terras indígenas e regularização fundiária dos pequenos agricultores e agricultoras de áreas atingidas por medidas de capitalismo verde. Ainda hoje não há transparência sobre como tais recursos são aplicados, como já havíamos denunciado na Declaração de Xapuri. Cobramos do Ministério Público Federal que exija a prestação de contas dos projetos;

– Desautorizamos qualquer política construída dentro de gabinetes sem a devida consulta prévia (em acordo com a Convenção 169 da OIT) e participação das populações indígenas e tradicionais. Qualquer definição de medidas que concernem estas populações deve partir da base, de dentro das comunidades;

– Prestamos solidariedade aos povos de todos os estados do Brasil e dos países do sul global que sofrem estas mesmas violências do capitalismo verde; apelamos aos povos dos países do norte para que não caiam nas artimanhas do “discurso verde” de empresas, governos e ONGs e questionem as aplicações financeiras tais como do programa REM e do Fundo Amazônia, entre outros;

– Repudiamos veementemente a perseguição, difamação e criminalização de defensoras e defensores dos territórios, que tem a coragem de se manifestar e denunciar os ataques dos promotores do capitalismo verde.

Por fim, fortalecidos pelo intercâmbio de experiências entre os mais variados povos durante estes três dias, seguimos com a cabeça erguida e crentes que, unidos, temos plenas condições de lutar contra as falsas soluções do capitalismo verde e de construir formas alternativas de vida sustentável a partir dos territórios, respeitando a pluralidade dos povos. Convidamos todos os povos das florestas e comunidades que sofrem as violações deste sistema desumano e predatório para seguirmos juntos, caminho através do qual será possível superar a lógica destrutiva do capital.

Shell enfrenta ação legal histórica na Holanda por não atuar sobre as mudanças climáticas

Amigos da Terra Internacional

Amsterdã, 4 de Abril de 2018: A organização Amigos da Terra Holanda anunciou hoje que levará a Shell ao tribunal caso a empresa não aja de acordo com as exigências de parar com a destruição do clima.

Donald Pols, diretor dos Amigos da Terra Holanda, disse: “A Shell está entre as dez maiores empresas poluidoras do clima a nível mundial. Sabe-se que há mais de 30 anos está a causar uma mudança climática perigosa, mas continua a extrair petróleo e gás e investe bilhões na prospecção e no desenvolvimento de novos combustíveis fósseis.”

O caso é apoiado pelos Amigos da Terra Internacional, federação ambientalista que desenvolve campanhas pela justiça climática e apóia comunidades atingidas por projetos de energia suja e pelas mudanças climáticas. Amigos da Terra Internacional têm 75 grupos membros nacionais ao redor do mundo, muitos deles trabalhando para impedir que a Shell extraia combustíveis fósseis nos seus países.

Karin Nansen, presidenta da federação Amigos da Terra Internacional, comentou: “Esse caso envolve pessoas em todo o planeta. A Shell causa enormes danos, as mudanças climáticas e a energia fóssil têm impactos devastadores pelo mundo afora, mas especialmente no hemisfério Sul. Com esta ação judicial, temos a possibilidade de responsabilizar legalmente a Shell.”

O caso dos Amigos da Terra Holanda faz parte de um crescente movimento global para responsabilizar as empresas transnacionais pela sua contribuição histórica para a mudança climática perigosa, bem como pelas violações dos direitos humanos e dos povos decorrentes de suas operações em todo o mundo.

Em janeiro, a cidade de Nova Iorque foi a tribunal para exigir uma indenização às cinco maiores empresas de petróleo, incluindo a Shell, pelas conseqüências das mudanças climáticas. As cidades de São Francisco e Oakland, assim como vários condados da Califórnia, estão fazendo o mesmo. Um agricultor peruano está processando a empresa alemã de energia RWE por contribuir para que os glaciares derretam acima da sua aldeia, resultado das mudanças climáticas.

Enquanto isso, no Brasil, o presidente ilegítimo Michel Temer indica o nome de ex-executivos da Shell para ocupar a o Conselho de Administração da estatal Petrobrás, fortalecendo os indícios de que o golpe de 2016 teria respondido aos interesses das transnacionais petroleiras. Vale lembrar que uma das primeiras mudanças de lei sancionadas após o impeachment da Presidente Dilma Rousseff foi a de alteração das regras de exploração do pré-sal, beneficiando diretamente as grandes da energia suja, como a Shell”, acrescentou Lúcia Ortiz, dos Amigos da Terra Brasil, coordenadora internacional do Programa de Justiça Econômica da federação.

O caso dos Amigos da Terra Internacional é único porque é o primeiro processo climático a exigir que uma empresa de combustíveis fósseis atue para parar de contribuir com a mudança do clima, ao invés de buscar compensações. Esse caso inovador, se for bem sucedido, limitará significativamente os investimentos da Shell em petróleo e gás a nível global, exigindo que se cumpram as metas climáticas acordadas pelos países na COP de Paris em 2015.

Nansen acrescentou: “Se vencermos este caso, haverá grandes consequências para outras empresas fósseis e se abrirá a porta para mais ações legais contra outros poluidores do clima. Amigos da Terra Internacional quer ver regras obrigatórias e vinculantes para corporações como a Shell, que muitas vezes se consideram acima da lei, inclusive quando se trata das metas climáticas”.

AQUI mais detalhes sobre as violações da Shell ao redor do mundo (em espanhol). Já aproveita e assina a petição online contra a Shell!

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