Enchente no RS: Informe sobre comunidades indígenas, quilombolas e de pesca artesanal

Prezadas amigas e amigos,

Estamos acompanhando as informações acerca das comunidades indígenas, quilombolas e de pesca artesanal que, como toda a população, enfrentam os impactos decorrentes deste último evento climático que bateu recordes no Rio Grande do Sul.

Ontem terminamos um mapeamento das comunidades indígenas que estão sendo mais impactadas pelas águas e identificando os casos mais graves, para posteriormente pensarmos em ações conjuntas de apoio e solidariedade, e subsidiar a tomada de ações pelo Poder Público.

Retomada Arado Velho, em Porto Alegre (RS)

De todas as comunidades indígenas, destacamos três casos Guarani emergenciais:

Comunidade Yjerê da Ponta do Arado, em Porto Alegre (bairro Belém Novo), onde o cacique Timóteo preferiu se manter na área após abandonarem suas casas às margens do Guaíba e se deslocarem para um terreno mais elevado.

Comunidade Pekuruty, em Eldorado do Sul, e Comunidade Pindó Poty, em Porto Alegre (bairro Lami), as quais precisaram deixar suas áreas com apoio da Defesa Civil. No entanto, após a saída das famílias Guarani da comunidade Pekuruty, o DNIT destruiu suas edificações às margens da BR-290, sem qualquer consulta ou justificativa.

As águas ainda seguem subindo na região de Porto Alegre. Nos municípios de Canoas, Esteio, Sapucaia, São Leopoldo, Novo Hamburgo, Guaíba e Eldorado do Sul, Cachoeirinha, além dos bairros de Porto Alegre, especialmente nas zonas Norte e Sul, a situação ainda é desesperadora.

Precisamos que as águas baixem para a gente poder atuar no sentido de assegurar habitação, alimentação e todo o apoio na reconstrução das comunidades indígenas.

Além das comunidades já citadas, realizamos um mapeamento preliminar para identificar as comunidades indígenas mais impactadas em decorrência deste evento climático extremo. O mapeamento foi realizado em conjunto pela Comissão Guarani Yvyrupa, Cimi-Sul, FLD/ Comin/Capa e CEPI, a partir do contato com a a diversas lideranças/representantes indígenas e acessando as informações da Funai e Sesai.

Vídeo da Aldeia Tekoa Ñhu Poty, em Passo Grande (RS): 

 

Até o momento, constam as seguintes comunidades indígenas em situação de emergência:

Água Santa: Kaingang Acampamento Faxinal e TI Carreteiro.

Barra do Ribeiro: Mbyá-Guarani Passo Grande Ponte, Flor do Campo, Yvy Poty, Ka’aguy Porã, Guapo’y e Coxilha da Cruz, Tapé Porã.

Benjamin Constant do Sul: Kaingang TI Votouro.

Bento Gonçalves: Kaingang Acampamento.

Cachoeira do Sul: Mbyá-Guarani Tekoá Araçaty, Mbya Guarani Acampamento Papagaio, Mbya Guarani Acampamento Irapuá.

Cachoeirinha: Mbyá-Guarani Karandaty (Mato do Júlio).

Cacique Doble: Kaingang TI Cacique Doble.

Camaquã: Mbyá-Guarani Yguá Porã (Pacheca), Yvy’a Poty, Tenondé, Ka’a Mirindy, Guavira Poty.

Canela: Kaingag Konhun Mag e Mbyá-Guarani Kurity e Yvya Porã.

Capela de Santana: Kaingang Goj Kosug.

Capivari do Sul: Mbyá-Guarani Acampamento RS-040 e Tekoa Araçaty.

Caraá: Mbya Guarani Varzinha, Tekoa Mbya Varzinha.

Carazinho: Kaingang 2 Acampamentos.

Caxias do Sul: Kaingang Aldeia Forqueta.

Charqueadas: Mbya Guarani Guajayvi.

Charrua: Kaingang TI Ligeiro.

Constantina: Kaingang TI Segu e Novo Xingú).

Cruzeiro do Sul: Kaingang Acampamento TãnhMág (RS-453).

Eldorado do Sul: Mbya Guarani Pekuruty.

Engenho Velho: Kaingang TI Serrinha.

Erebango: Kaingang TI Ventarra, Guarani de Mato Preto.

Estrela Velha: Ka’aguy Poty.

Estrela: Kaingang Jamã Tý.

Farroupilha: Kaingang Pãnónh Mág.

Faxinalzinho: Kaingang TI Kandóia.

Iraí: Kaingang Goj Veso e Aeroporto.

Lajeado: Kaingang , Foxá.

Maquiné: Mbya Guarani Ka’aguy Porã, Yvy Ty e Guyra Nhendu.

Mato Castelhado: Kaingang Tijuco Preto.

Osório: Mbya Guarani Tekoa Sol Nascente.

Passo Fundo: Kaingang Goj Yur, Fág Nor.

Porto Alegre: Charrua Polidoro, Mbyá-Guarani Ponta do Arado e Pindó Poty, Mbya Anhatengua, Kaingang Gãh Ré (Morro Santana), Tupe Pan (Morro do Osso).

Riozinho: Ita Poty.

Rodeio Bonito e Liberato Salzano: TI Rio da Várzea (emergência na Linha Demétrio).

Salto do Jacuí: Kaingang Horto Florestal, Aeroporto e Júlio Borges, Mbyá-Guarani Tekoá Porã.

Santa Maria: Mbya Guarani Guaviraty Porã e Kaingang Kētƴjyg Tēgtū (Três Soitas).

Santo Ângelo: Mbya Guarani Yakã Ju.

São Francisco de Paula: Xokleng Konglui.

São Leopoldo: Kaingang Por Fi Gá.

São Gabriel: Mbya Guarani Jekupe Amba.

São Miguel das Missões: Mbyá-Guarani Koenju.

Tabaí: Kaingang PoMag.

Terra de Areia: Mbya Guarani Yy Rupa.

Torres: Mbya Guarani Nhu Porã.

Palmares do Sul: Mbya Guarani da Granja Vargas.

Viamão: Mbya Guarani Nhe’engatu (Fepagro), Pindó Mirim, Mbya Guarani Jatai’ty TI Cantagalo e Takua Hovy.

Vicente Dutra: Kaingang TI Rio dos Índios.

As Organizações encaminham essa relação, que não é definitiva, pois ainda há informações necessárias a serem acrescentadas, mas através da qual se pede ao Poder Público atenção no sentido de garantir assistência adequada neste tempo de tantas adversidades.

Pede-se também apoio às organizações e entidades da sociedade no sentido de auxiliarem, através de apoios e ações solidárias às comunidades que necessitaram de alimentação, material de higiene e limpeza além de lonas, telhas, colchões e cobertores.

Vídeo da Aldeia Tekoa Ñhu Poty, em Passo Grande (RS): 

Assinam esse documento a Comissão Guarani Yvyrupa, o Cepi, Cimi Sul e FLD/Comin/Capa.

Apoios e ações solidárias às aldeias indígenas:

Aldeias necessitaram de alimentação, material de higiene e limpeza além de lonas, telhas, colchões e cobertores.

👉🏽 Ponto de coleta de doações  para as comunidades indígenas: 
📍Paróquia Menino Jesus de Praga, Rua Dr. Pitrez, 61, bairro Aberta dos Morros, Porto Alegre/RS

👉🏽 Apoiar Retomadas Guarani do RS:
📍 Chave PIX para doações: 21.860.239/0001-01

👉🏽 Apoiar Retomada Mbya Guarani Nheengatu de Viamão:
📍 Chave PIX para doações: CPF: 032.874.330-59 | Laércio Gomes Mariano.

Todo solidariedade e apoio aos territórios de vida!

Vídeo da Retomada Arado Velho, em Porto Alegre, (RS): 

Leia também a nota lançada no dia 03 de maio – Inundação no Rio Grande do Sul: Comunidades indígenas Mbya Guarani impactadas pelas enchentes

Posto de saúde e escola quilombola: a luta muda a vida

Transquilombo: esse é o apelido carinhoso da esburacada estrada que liga todos os quilombos à margem sul do Rio Maicá. É por ela que, saindo do quilombo Bom Jardim, se chega em poucos minutos ao Tiningu. E é no Tiningu que se encontra o Bena, ou melhor: Raimundo Benedito da Silva Mota, personagem histórico da região – Acompanho as lideranças desde os 15 anos, hoje tenho 60: e lá se vão 45 anos de luta. Hoje, Bena é presidente da Associação dos Remanescentes do Quilombo Tiningu e vice-presidente da FOQS (Federação das Organizações Quilombolas de Santarém).

45 anos: Bena viu o mundo ir e vir e voltar e seguir onde está, e por isso fala com calma. E recomenda a calma também – Essa é uma área de fugidos de senzala; é preciso ter paciência com o momento histórico. A comunidade do Tiningu existe desde 1844 – tem 176 anos – e só em outubro de 2018 o Incra publicou no Diário Oficial da União a portaria de reconhecimento e demarcação da comunidade. A burocracia dos brancos atrasou por quase dois séculos – e falta ainda um último passo para a titulação definitiva: a assinatura do presidente da República. Ele, Jair Bolsonaro, o mesmo que disse – Eu fui num quilombo. O afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada. Eu acho que nem para procriador ele serve mais, e também – No que depender de mim, todo mundo terá uma arma de fogo em casa, não vai ter um centímetro demarcado para reserva indígena ou para quilombola. Obviamente esses discursos racistas ecoam nas estruturas racistas do Estado brasileiro: a destinação de recursos públicos para a titulação de territórios quilombolas sofreu uma queda de mais de 97% nos últimos cinco anos.

Essa é uma das histórias da reportagem “História do cerco à Amazônia”. Navegue pelos conteúdos:

INTRODUÇÃO
Parte 1 (página central): A história do cerco à Amazônia
Parte 2: Quem é favorecido com as respostas de Bolsonaro às queimadas?
Parte 3: O “ganha-ganha” das empresas com a financeirização da natureza
Parte 4: Mas afinal, quem está por trás desses crimes?

HISTÓRIAS
1) O cerco explicado em um mapa
2) Um porto entalado na boca do rio
3) Antes do porto chegar (se chegar), chegaram já os impactos
4) [você está aqui] Posto de saúde e escola quilombola: a luta muda a vida
5) Curuaúna: de um lado a soja; do outro, a soja também

Ainda assim, Bena não perde a paciência: o que são quatro anos, ou mais um punhado deles, frente a séculos de resistência – O Tio Babá que me contava as histórias, tinha 108 anos, e Bena ainda hoje mantém a tradição oral viva e conta e reconta as histórias do Tiningu, desde os tempos em que seus vizinhos e familiares tinham que ir embora porque as crianças sofriam de anemia e não tinha posto de saúde perto; então era preciso remar por quase duas horas até chegar a Santarém, mas os adultos também não tinham forças porque faltava alimento para todos, independia a idade, e faltava também educação: assim que ia todo mundo embora para Santarém, ia todo mundo morar na periferia da cidade, deixando para trás sua cultura e seu canto no mundo.

Bena conta e reconta as histórias do Tiningu. Foto: Carol Ferraz / Amigos da Terra Brasil
Bena em frente a um dos igarapés da região, que também geram conflitos com fazendeiros que tentam se apropriar das fontes de água. Foto: Carol Ferraz/Amigos da Terra Brasil
Acesso à educação e à saúde das comunidades são frutos da organização e da luta quilombola. Foto: Carol Ferraz / Amigos da Terra Brasil
Desmatamento gerado pela expansão da soja, além do alto uso de agrotóxicos no cultivo do grão, impactam as comunidades da região. Foto: Carol Ferraz / Amigos da Terra Brasil

Até que um dia eles voltaram, e voltaram porque valia a pena voltar, e depois as famílias pararam de ir embora. Não há nenhum acaso aí: tudo aconteceu devido à organização da luta quilombola, iniciado pelo próprio Bena que, um certo dia, em um seminário em Belém, se descobriu quilombola: ouviu sobre estudos a respeito do território do Tiningu e sua história, que provavam ser ali uma área de remanescentes de escravos. Bena trouxe essa informação à comunidade e se surpreendeu: muitos de seus vizinhos negros se recusaram a ser ditos quilombolas, reproduzindo um discurso de preconceito contra esta população.

Na primeira assembleia convocada para discutir a questão, apenas 17 famílias apareceram – a do Bena, de seu irmão, de seus pais e de seus tios inclusas. Poucos. Mas o tempo passou, a luta seguiu, e a associação quilombola conseguiu, pressionando a prefeitura de Santarém, recursos para um posto de saúde e uma nova escola, agora com ensino fundamental – antes, havia apenas uma escola infantil na região. Assim que hoje, no Tiningu, 90 famílias se autodeclaram quilombolas e aguardam orgulhosas a titulação de sua terra, medida que trará segurança nos conflitos com os fazendeiros locais.

Conflitos com fazendeiros locais: corte no acesso à água e assassinato
Um deles, vizinho em um terreno mais alto, entendendo-se dono do igarapé que há entre ele e o quilombo, cortou o acesso à água de toda a comunidade. Até o posto de saúde ficou desabastecido e teve que cessar os atendimentos. O caso foi judicializado.

Em nome da memória de seu povo, Bena cuida muito bem do cemitério local – a área esteve em disputa com outro fazendeiro, que teve de ceder devido à importância histórica do espaço. O terreno dessa fazenda é agora recortado por um quadrado onde somam-se lápides com corpos e histórias de luta. É ali que ele relembra outro caso, recente: o caseiro de outra fazenda, em um conflito de pouca explicação, assassinou um dos quilombolas, supostamente após uma briga. Está até hoje foragido.

Em nome da memória, Bena traça um plano: transformar a antiga escola infantil em um museu da história quilombola da região. O registro oral de Tio Babá ganhará uma preservação histórica e não mais se esquecerá que a luta muda a vida.

Voltar para a página central “A história do cerco à Amazônia

Leia também as partes 2, 3 e 4 da introdução:
Quem é favorecido com as respostas de Bolsonaro às queimadas?
O “ganha-ganha” das empresas com a financeirização da natureza
Mas afinal, quem está por trás desses crimes?

E as histórias:
O cerco explicado em um mapa
Um porto entalado na boca do rio
Antes do porto chegar (se chegar), chegaram já os impactos
– [você está aqui] Posto de saúde e escola quilombola: a luta muda a vida
Curuaúna: de um lado a soja; do outro, a soja também

Quilombo Paiol de Telha (PR) vence no TRF4 e reintegração de posse é suspensa

Ontem (17/09) a Comunidade Quilombola Invernada Paiol de Telha (PR) teve seu processo de reintegração de posse barrado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) em Porto Alegre. Outro recurso votado trata da decisão que obriga o Estado brasileiro a destinar recursos ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para a titulação da integralidade do território, que foi parcialmente titulado em maio desse ano – apenas 225 dos 2,9 mil hectares foram reconhecidos pelo Incra como de direito da comunidade. A vitória de ontem é parcial, pois cabem ainda recursos, e o Quilombo segue resistindo. Estiveram presentes, somando forças, os 7 Quilombos Urbanos de Porto Alegre e a Frente Quilombola RS, além de organizações como Terra de Direitos, CIMI e Conaq.

Aqui, links de matérias que a Terra de Direitos já produziu sobre a situação da comunidade:

Tribunal Regional Federal julgará destino da titulação do Quilombo Paiol de Telha (10/09/2019);

Invernada Paiol de Telha é o primeiro quilombo titulado no Paraná (30/04/2019);

Compra da terra do Quilombo Paiol de Telha é oficializada e comunidade pode ser primeira a ser titulada no PR (22/01/2019).

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