“As pessoas são expulsas do Quilombo Lemos, localizado próximo ao terreno do Beira Rio, na mesma movimentação da expulsão das pessoas da Ilhota para a Restinga nos anos 60, para fins do ‘progresso’. Chega com atropelo uma contrapartida que não contempla nada na situação de quem mora no entorno.” – Liderança do Quilombo Lemos
Previsto para entrar em votação na Câmara dos Vereadores de Porto Alegre, o projeto de lei complementar 004/19, que inclui um artigo na Lei 1.651, sancionada em 1956, institui as duas maiores torres do Rio Grande do Sul no terreno do Estádio Beira-Rio, cedido pelo Governo Brizola para a construção de um espaço de esporte e lazer. Como contrapartida para usar o espaço que hoje é ocupado por quilombos, escolas de samba e população em geral, o megaempreendimento movido pela especulação imobiliária coloca a duplicação da rua José de Alencar, a restauração do Asilo Padre Cacique, a remodelação do posto de saúde Santa Marta, no centro da Capital, e a instalação de um projeto cicloviário. Nada é falado sobre o terreno de escolas de samba tradicionais que integram o Carnaval de Porto Alegre e os quilombos que compõem a região – que provavelmente serão despejados e forçados a viver em regiões mais periféricas; sobre como ficará a situação do pôr do sol e da luminosidade no bairro, do aumento do número de veículos circulando, causando congestionamento; ou sobre os impactos ambientais causados pelos edifícios gigantes.
O projeto pretende autorizar a venda do terreno que hoje é o estacionamento do estádio, em frente à estátua do Fernandão e do Portão 7, ou seja, um terreno que pertence ao complexo do Beira Rio. Movimentos sociais, quilombolas, grupos de torcedores e torcidas organizadas do Inter contrários ao projeto querem evitar que aquele terreno seja vendido para a empreiteira construir prédios de luxo para moradia e escritórios de trabalho. Ou seja, prédios altamente elitizados, quem morará? Quem vai lucrar? Por que não houve debate sincero com a torcida colorada sobre o que fazer com um pedaço do seu patrimônio? Para o povão colorado que vai ver o jogo ao redor do estádio, que tenta entrar, vai diminuir consideravelmente o espaço e a capacidade de pessoas, e sabemos como é preconceituosa, racista, machista a “segurança” da elite. Se o território for vendido, o Inter e a torcida perderão para sempre um local que podem usar – e que está sendo vendido para a iniciativa privada a preço de banana.
Em reunião realizada em 28 de dezembro pelos movimentos contrários à instalação das torres no terreno do Internacional, foi reiterada a necessidade de não aceitar nenhuma contrapartida que não beneficiasse toda a população do entorno. Para isso, estão sendo reivindicadas a regularização fundiária dos quilombos localizados nos arredores, a realização de um estudo de impactos ambientais e a entrega legal dos terrenos das escolas de samba para estas. Sendo assim, é visível o alinhamento do poder público com a burguesia, já que privilegiam nas compensações do projeto apenas serviços para a classe média, como o alargamento de uma faixa para automóveis. Nada se é falado sobre a construção de moradias populares para de quem será tirada a casa.
O que se vê na cidade de Porto Alegre é uma constante entrega dos espaços públicos para a iniciativa privada. Como observado neste projeto, é a alteração do regime urbanístico em detrimento do ambiente e da sociedade, garantindo ganhos milionários ao proprietário privilegiado, da indústria da construção civil e da especulação imobiliária.
É necessário, portanto, mobilizar-se contra mais uma entrega do patrimônio porto-alegrense para a iniciativa privada. Não às torres do Inter! Não ao PLC 004/19!
Diversas atividades estão programadas para o final de semana, além de uma noite de vigília no domingo. A reintegração de posse pode ocorrer já na segunda-feira (12/11). Região do Morro Santa Teresa é alvo histórico da especulação imobiliária em Porto Alegre. Informações atualizadas na página do Facebook Somos Quilombo Lemos.
O Quilombo Lemos, sétimo quilombo urbano de Porto Alegre, está ameaçado de despejo. Recebeu a visita de oficiais de justiça e do Batalhão de Choque da Brigada Militar na quarta-feira (7/11), acompanhados de escavadeiras. Entraram sem convite, fechados a qualquer diálogo. Água e luz foram cortadas. O plano era despejar as pessoas sem respeitar os trâmites legais: não houve conversa prévia com moradores; não haviam sido intimados a Defensoria Pública nem o Conselho Tutelar – ações necessárias, uma vez que entre as pessoas ameaçadas de serem jogadas às calçadas das avenidas duplicadas e da orla do Guaíba “revitalizada” estão também crianças. Retiremapenas os pertences pessoais, era a ordem do apressado oficial de justiça. Que quem estava em casa – era o meio da manhã de uma quarta-feira, dia útil, e muitos trabalhavam ou estudavam no momento – corresse a juntar o que conseguisse de suas coisas e partisse dali logo, sem rumo certo. Foi dado meia-hora para isso, e azar dos ausentes: voltariam aos escombros, somente; a escavadeira se atiçava ao lado do terreno, sedenta pelo cimento, tijolos e madeiras a serem derrubados das cinco casas onde hoje moram cerca de 60 pessoas. Bem a tempo, porém, avisados por redes sociais e telefonemas, uma defensora pública e um procurador do Ministério Público Federal apareceram: cumpra-se a lei.
Contrariado, o oficial de justiça se viu obrigado a recuar, junto a seus soldados mascarados e não identificados e sua escavadeira. Saíram com a promessa de voltar, o que pode acontecer já na segunda-feira (12/11). Diversas atividades culturais estão programadas para o final de semana no quilombo, para que se fortaleçam as redes de apoio. Doações são pedidas. Os trâmites jurídicos para reverter a decisão seguem, com a atuação do Ministério Público Federal e do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária). Nesta quinta-feira (08/11), foi oficializada a certificação da Fundação Palmares ao Quilombo Lemos, dando ainda maior segurança jurídica às famílias – isso, claro, fosse a justiça justa. O Conselho Estadual de Direitos Humanos do Rio Grande do Sul recomendou a suspensão de ordem de reintegração de posse.
De quem é a terra? Mas por que vieram sem aviso estes homens todos, no meio de uma manhã de quarta-feira, invadir a terra da família Lemos? Essa é uma pergunta que nos remete a alguns anos atrás: o pedido de despejo para o Quilombo Lemos parte do Asilo Padre Cacique, instituição franciscana conhecida por cuidar de idosos há anos na avenida de mesmo nome. Curioso que o desejo de jogar famílias à rua, idosos entre eles, parta de uma instituição que se vangloria e se sustenta a partir da solidariedade de outros (mas não só disso, afinal o asilo possui mais de trinta imóveis em seu nome). O terreno hoje em disputa é de posse dos Lemos há mais de meio século: eles ocuparam a área ao lado do asilo e a ele se dedicaram a vida inteira: a matriarca Delzia Lemos serviu ao asilo por 35 anos. Após 46 anos de serviços prestados, Jorge Lemos, o patriarca, faleceu em 2008, logo que chegou em casa do trabalho. Seus últimos esforços em vida foram ainda dedicados à instituição que agora quer tirar o teto de seus descendentes – foi após a morte de Jorge que o Asilo Padre Cacique deu início ao imbróglio judicial para retirar os Lemos de sua terra, em 2009. Antes disso, há cerca de duas décadas, já havia sido feito o usucapião da área, momento no qual os responsáveis pelo asilo convenientemente “esqueceram” da presença das trabalhadoras e trabalhadores que viviam ao lado para lhes servir. A terra em disputa, portanto, não é (como o asilo diz ser) uma cedência; foi uma área devoluta ocupada pelos mais velhos para que estivessem mais próximos do asilo onde trabalhavam.
A dedicação integral dos Lemos ao asilo não deve ser novidade a ninguém, infelizmente: as famílias negras sempre cuidaram das brancas, de crianças a idosos, ao custo de seu próprio bem-estar e o de suas famílias. Leia bem as entrelinhas da ordem de despejo, o que está dito é: negro aqui, só se for pra trabalhar. Pois recuemos um pouco mais no tempo, é importante lembrar a raiz das querelas de hoje e em determinado momento não havia ali sequer asilo: a própria edificação, hoje tombada, foi erguida por mãos e suor de negros, escravos que habitavam já o local. Diga-me você portanto de quem é a terra: de quem sempre viveu nela, de quem cuidou dela, de quem cresceu nela, de quem plantou e construiu o que nela há ou de quem na terra nunca viu valor, apenas um espaço para seus servos recuperarem as energias para lhe servirem com maior vigor em seguida – e que agora, falecido o zelador-faz-tudo, veem como mais proveitoso a venda do local a gananciosas construtoras que entendem estar ali um ponto ideal para montar seus edifícios e torres e condomínios, privatizando um pouco mais da maior riqueza natural porto-alegrense, o Rio Guaíba?
Há aí mais que os olhos podem ver: ora, a região desperta a ganância daqueles que vislumbram uma orla “revitalizada” livre da negritude e da cultura popular.Onde hoje há um quilombo, pretendem os desejosos do despejo, haverá torres, shoppings, cercas. E gente branca, claro, a não ser para trabalhar. Para fins de localização geográfica: o Quilombo Lemos fica na avenida Padre Cacique, número 1.250, exatamente ao lado do asilo. O terreno se estende mais aos fundos, já que na parte da frente foi esmagado pela construção de uma revendedora de carros, construída sob um terreno que o asilo não se importou em entregar e nem aparenta ter interesse agora. Com a remoção, a terra ancestral negra corre o risco de ser perfurada pelas pedras fundamentais de condomínios luxuosos e atropelada pelas rodas das caminhonetes e carros das classes média e alta e branca. Esse é o plano: uma ponta a orla do Guaíba já pertence à Uber; a outra, à Melnick Even. No meio, com uma vista vislumbrante para o principal cartão-postal de Porto Alegre, as águas do Guaíba onde o sol se põe, está o Morro Santa Teresa, que tem aos pés a avenida Padre Cacique e, ali, o Quilombo Lemos. Nada do que acontece é por acaso: a tentativa de entrega dessas áreas à especulação imobiliária é histórica. O terreno da Fase (Fundação de Atendimento Socio-Educativo), vizinho dos Lemos à direita, foi por anos alvo das construtoras – e de um estranho silêncio midiático –, assim como outras famílias que vivem na região. Com os conflitos, a Lei Complementar nº 717/2013 declarou a área do morro como “Área Especial de Interesse Ambiental”, com identificação de Área de Proteção do Ambiente Natural, de Área de Interesse Cultural, bem como Área Especial de Interesse Social (AEIS). Nada está entregue ainda: há resistência, sempre houve, e as famílias do Quilombo Lemos não têm nenhuma intenção em deixar a terra onde cresceram e firmaram suas raízes há 60 anos.
Atividades, vigília, união: os esforços para se manter sob seu território Após a tentativa de invasão do oficial de justiça e dos soldados e das escavadeiras na quarta-feira, uma vigília se formou no quilombo. Moradores, família, amigas e amigos, organizações parceiras, defensoras e defensores dos direitos humanos, advogadas e advogados, comunicadoras e comunicadores, muitos corpos se juntaram em um, colocando-se no caminho da violência dos invasores. De quarta para quinta-feira (8/11), a noite foi mal dormida: nublada e cheia de dúvidas, era palpável a tensão imposta pelo não-saber sobre o destino que viria com a alvorada. Tente compreender: o quão bem se pode dormir sob a ameaça de um despejo? O dia nasceu ensolarado, entretanto: o amanhã tem sido sempre outro dia, alimentando essa esperança insistente que não desiste do sonho de um futuro melhor. Havia sol, que melhor presságio se poderia ter?
Enquanto a centena de pessoas se reunia no quilombo em vigília, atentas às ameaças do horizonte – e sempre que sirenes soavam e luzes vermelhas e azuis piscavam na rua os corações perdiam uma batida, apreensivos –, a alguns quilômetros dali uma reunião era travada entre lideranças quilombolas, representantes da família Lemos, o comando da polícia e o oficial de justiça, ainda chateado por ver frustrada sua primeira tentativa de jogar as pessoas à rua – porém convicto de sua missão, independente das ilegalidades acusadas e confirmadas em sua ordem de despejo. Dali, resolveu-se que no mínimo até a segunda-feira (12/11) se daria uma certeza às famílias: não ocorrerão ações ao longo do final de semana, a fim de que os ritos antes desrespeitados pelo oficial sejam agora cumpridos, caso o juiz mantenha a opinião favorável ao despejo. Mas se espera que não cheguemos a tanto. Os trâmites judiciais devem ser levados à esfera federal, com a atuação do MPF, do Incra e com a certificação da Fundação Palmares – a ação tramitava na 17ª Vara Cível de Porto Alegre, instância indevida para tratar de questões fundiárias dos povos originários e tradicionais.
Não deve haver desmobilização, porém: o discurso da presidência do Asilo Padre Cacique não permite relaxamento. Na figura de seu presidente, Edson Brozoza, a instituição tem se mostrado intransigente, rebaixando-se a ofensas de cunho racista que não poderiam ser aceitas pela sociedade ou pela justiça. Ao tomar conhecimento de que o despejo não poderia ocorrer devido a irregularidades no processo, o senhor Brozoza perguntou, de maneira muito agitada, a quem estava à volta, ‘quantos dias, meses, horas e minutos faltavam para o presidente Bolsonaro assumir’. Estava ‘muito ansioso por isso, pra acabar com esse tipo de palhaçada aqui do lado’, o que ele afirmou se tratar de uma ‘invasão afrodescendente’. Caso se cumpra o reconhecimento da terra como pertencente à família Lemos, fez ainda a promessa de pintar a pele de vermelho e vestir um colar, para alegar que aquela terra é, na verdade, indígena, estendendo seu preconceito, para além de negras e negros, aos povos originários – e mostrando também desprezo pelas leis que garantem os direitos dessas populações. Agressivo, disse também que, se puder, ‘leva uma dezena pro inferno’: ‘vai dar morte e não quer nem saber’. São verdadeiras ameaças feitas às vidas das famílias quilombolas. Em contraste, e perceba a maravilha da simultaneidade: ao mesmo tempo em que Brozoza derramava ódio e racismo em sua sala com ar-condicionado no asilo, Mestre Jaburu pegava seu berimbau no quilombo e convidava todas e todos a cantar: na Igreja bate o sino, na senzala bate o tambor.
A agressividade do presidente do Asilo Padre Cacique e de uma lei que acorda famílias com soldados mascarados e escavadeiras prontas para derrubar suas casas não permite o descanso. A mera palavra do homem branco já se mostrou indigna de confiança muitas vezes.A noite de domingo será mais uma de sono perturbado, e outro amanhecer de dúvidas virá na segunda-feira.
(foto da capa: Joana Berwanger/Sul21. Mais fotos AQUI)
Potente a matéria da Débora Fogliatto no Sul21 em cima das declarações racistas do Presidente do Asilo Padre Cacique. Absurdo o que fala Edson Brozoza.
Na matéria, ele diz que o dinheiro oriundo do aluguel de 33 imóveis que o Asilo possui não é suficiente para sustentar o local. Nós, como Revista Bastião, temos que prestar contas por acreditar na transparência financeira; por que não exigimos isso de uma instituição como o Asilo Padre Cacique?
Quais são os interesses no terreno em frente à Orla do Guaíba? A área mais perto do Gasômetro foi recém reformada, e agora tem a administração da manutenção feito pela empresa estadunidense Uber. Ali perto está o Anfiteatro Por do Sol, um dos principais espaços públicos pensados, um palco enorme, a céu aberto, na beira do rio, em que a Samsung prepara seu segundo grande festival de música dos últimos meses. Samsung, da Coreia do Sul, uma das empresas que mais vende celular e provavelmente pensa a inteligência artificial.
Nas ruas centrais, na beira do rio, a Heineken, marca de cerveja holandesa, promoverá uma exibição da corridas de carros da Fórmula 1. Pelas ruas do centro da cidade. As ruas estão trancadas, algumas coms entido invertido, vários agentes da EPTC – Empresa Pública de Transporte e Circulação (oficial) mobilizados nestes últimos dias. Trânsito prejudicado. Faz dois dias que ruas calmas estão congestionadas, com motoristas apressados. Seguirão assim nos próximos dias. Onde estão os repórteres que alertam para o transtorno no trânsito que um protesto provoca? Onde estão as pessoas que diz que o mais significativo de uma manifestação é o seu impacto no trânsito? E a Heineken e o Marchezan? O que a Heineken está investindo na Prefeitura de Porto Alegre?
Em uma área há alguns metros do Somos Quilombo Lemos, existe o Pontal do Estaleiro. Área em frente a Fundação Iberê Camargo, na beira do Rio. Ali surgirá um dos três Hub de Saúde. Parceria da Hospital Moinhos de Vento, Grupo Zaffari, Construtora Melnick Evens, em parceria com a Prefeitura de Porto Alegre. Shopping Borboun e hospital no mesmo espaço. Vai ser mais fácil cuidar dos seus velhos no hospital podendo comer um Big Mac entre uma dormida e um horário da visita. Quantos terrenos o Grupo Zaffari possui na cidade? E, pensando no Hub de Saúde, você acha que você vai poder pagar por esse atendimento? Se cortarem o SUS tu acha que as empresas privadas vão construir hospitais para os pobres ou classe média? Vão construir é para os ricos, como esse Hub de Saúde. A não ser que achem um jeito de lucrar ainda mais com as nossas doenças. Ou usar corpos em situação de vulnerabilidade para seus experimentos, como a empresa Bayer (aglutinada com a maior empresa de agrotóxicos do planeta, a Monsanto), que fechou um convênio com a Prefeitura de Porto Alegre para doar medicamentos ultraconceptivos de longa duração (processo de esterilização?!?) para mulheres que vivem em abrigos de Porto Alegre. Considerando que a maioria das mulheres nesta condição são negras, seria essa ação uma ação de eugênia? De evitar que pessoas negras nasçam? É um absurdo testar fórmulas químicas em qualquer ser vivo, principalmente quando se usa a força o aparato do Estado e a situação de vulnerabilidade das pessoas – que se for a fundo, se vê que também é provocada pelo Estado e pelos seus tentáculos (latifundiários, milícias, empresas multinancionais, racismo estrutural).
O processo de reintegração de posse do Quilombo do Lemos começou em 2008, anos antes antes da Copa de 2014 (o terreno do Quilombo fica quase em frente ao Estádio Beira Rio, estádio que sediou jogos da Copa na cidade). Copa, megaevento produzido pela FIFA que arrasou vilas inteiras de Porto Alegre, jogando comunidades para ocupações vulneráveis ou para vilas mais periféricas, ignorando condições de trabalho, exposição a toda uma nova dinâmica de deslocamento. Fora todo transtorno de uma vida expulsa pelo Estado, sem nenhuma consideração, planejamento ou dignidade.
É nessa cidade, é na influência dessas empresas, é legitimado pelas ideias e exposições públicas do presidente Bolsonaro, com esse contexto, que o Presidente do Asilo diz que os moradores da Família Lemos devem sair. Ele está dizendo que os quilombolas, descendentes de quem construiu aquele Asilo e cuidou da manutenção do lugar por anos, não merecem estarem ali. Pessoas descendentes de pessoas mais velhas, negras, que dedicarm seu tempo, sua vida, para cuidar dos idosos brancos. E hoje o Asilo quer colocar os mais velhos dessa família na rua.
O Asilo Padre Cacique diz que negros não podem estar na Beira do Rio, principal área de interesse especulativo na cidade. Quais os interesses na encosta do Morro Santana? Quantos condomínios cabem no Mato atrás do Quilombo e do Asilo Padre Cacique? O interesse, ao fim e ao cabo, é racista e é territorial. Contra isso que temos que nos opor e fincar pé.
Leiam o que diz o presidente do Asilo para a repórter Débora Fogliatto:
“Segundo ele, funcionários foram ameaçados com facão e houve também ameaças por parte dos moradores de invadir o asilo. Brozoza disse que irá dormir no local e que, se houver invasão por parte da família, “vai dar morte”. “Eles só vão entrar no asilo passando por cima de mim. Uma dezena pelo menos, eu levo pro inferno. Não vão explorar o asilo, tomar conta do patrimônio do asilo”. Embora de início tenha falado que os moradores eram “invasores”, depois contou a história de como a família chegou ao local. “Na marra, no tapetão, ninguém vai ganhar, e esses invasores vão sair daí nem que seja a última coisa que eu faça na minha vida, de qualquer jeito. E se invadirem nosso lar, vai dar morte”, colocou.