Demarcação Já! Retomada Kaingang Gãh Ré completa 2 anos no Morro Santana, em Porto Alegre (RS)

A Retomada Gãh Ré do povo indígena Kaingang, no Morro Santana, em Porto Alegre (RS), completou 2 anos em 18 de outubro. A comemoração contemplou memórias, ações e anseios expressos em rodas de conversa (com chimarrão e fogo), plantio de mudas nativas, pinturas, caminhadas, roda de capoeira e partilha de refeições.

Gah Te, kujá e cacica, juntamente de sua família, recebeu todos os visitantes e apoiadores com sorriso no rosto, convidando enxergar, na pedreira do morro, para além da ferida da exploração à força da natureza pelos não indígenas: ver a memória das casas subterrâneas tradicionais Kaingang no local.

A Retomada Gãh Ré (@retomadagahre) evidencia a sábia relação dos Kaingang com o território. O Morro Santana é o morro mais alto de Porto Alegre, bastante reconhecido por sua biodiversidade. O manejo da mata, realizado pelas famílias indígenas, reforça a importância das espécies nativas de flora como alimento para a fauna e proteção das nascentes de água do local. A permanência dos indígenas na área barra a especulação imobiliária, que com força tem avançado sobre áreas de relevância ambiental na capital gaúcha.

A palavra “retomada”, para os Kaingang, remete à “volta para casa”. Além do retorno ao território, a retomada Kaingang no morro mobiliza os rituais, a língua e outros aspectos centrais do modo de viver. “Retomar” é reencontrar-se e reconstruir o território onde os antepassados nasceram, viveram e morreram. É viabilizar, no tempo presente, o encontro entre as marcas do passado e os meios para um futuro digno.

A Amigas da Terra Brasil saúda a Retomada Gãh Ré e seus dois anos de resistência! Apoiamos a luta do Povo Kaingang pela demarcação do território, que ganha força na semana em que 7 territórios Guarani tiveram importantes avanços nos seus processos de demarcação.



#marcotemporalnao
#demarcaçãojá


📷 Amigas da Terra Brasil/ ATBR

Hyvu Porã: Fórum das Retomadas Mbyá Guarani no Rio Grande do Sul

No dia 14 de setembro, lideranças de algumas retomadas Guarani do Rio Grande do Sul estiveram na Casanat, casa sede da Amigas da Terra Brasil, para o primeiro encontro do Hyvu Porã: Fórum das Retomadas. Estiveram presentes a Retomada Mbyá Guarani Tekoa Yjerê, da Ponta do Arado, que fica no bairro Belém Novo, Porto Alegre, a Retomada Karanda Ty, de Cachoeirinha e a Retomada Ka’aguy Porã, de Maquiné.

Confira como foi o primeiro encontro do Fórum das Retomadas:

Representando seus territórios, os mbyá presentes partilharam suas histórias, evocando temas que envolvem seus direitos, que precisam urgentemente ser assegurados e constantemente são feridos pelo mundo e lógicas dos juruá (brancos). Partilharam também sobre diversidade e a particularidade de cada território, que tem lutas e processos singulares, sobre o marco temporal, a demarcação de territórios, as retomadas de parentes e a importância desse movimento e de estarem juntos. “Juruá tomou o nosso território. Agora queremos voltar. Nosso território foi tomado, e agora nós temos que retomar. A retomada é para sobrevivência. Temos nossos filhos para criar, onde vamos criar se não fizermos retomadas?”, disse o cacique André Benites, de Ka’aguy Porã.

O encontro faz parte de uma articulação da ATBr com estes territórios pelo seu direito de ser e existir, que também é a sobrevivência das terras onde coabitam em comunidade com sonhos, águas, frutos, ventos, montanhas e matas. As retomadas são a volta aos territórios ancestrais, onde o modo de ser Mbyá pode ser plenamente vivido. Sem falsas fronteiras inventadas pelo mundo branco, ou cercas que impeçam a liberdade, seja para se locomoverem em terras que sempre foram indígenas, seja para serem em plenitude. É a busca pelo bem viver. Cultura viva, revivida a cada dia. Ao retomar suas terras, os Mbyá preservam seus valores, saberes e tradições, em comunhão com a terra e suas raízes.

Fotos por Maí Yandara

Confira aqui a cobertura fotográfica do primeiro Encontro das Retomadas 

#demarcaçãojá #nãoaomarcotemporal #emergênciaindígena #retomadas #guaraní #mbya

Curta-documentário mostra Retomada Mbyá Guarani do Arado Velho (RS)

 

Hoje, o Arado é ancestral! O curta-documentário Opy Nhemombaraete Karai nos mostra a comunidade Mbyá Guarani da Retomada do Arado Velho, no extremo Sul de Porto Alegre (RS), revivendo sua história, sua cosmologia, erguendo a Opy’i (casa de reza Mbyá Guarani).

Levantar a casa sagrada de contato com os deuses e ancestrais significa força política, social, espiritual; na cosmologia Mbyá é a Vida Bela, em que força, saúde e espiritualidade são belezas.

Num contexto de disputas territoriais, a grandeza da ancestralidade Mbyá se aterra por Tupã para se transformar em território de VIDA!

Este curta-documentário foi produzido e lançado no final de 2023 na Casanat, sede da Amigas da Terra Brasil (ATBr), na capital gaúcha. Agora, disponibilizamos o vídeo no nosso canal de Youtube (@AmigasdaTerraBrasil) para que todos e todas possam assistir e prestigiar a luta dos Mbyá Guarani, do cacique Timóteo e de seus parentes pelo seu modo de ser e de existir!

Curta-documentário no Youtube:


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Amigas da Terra Brasil

 

Retomadas: uma forma de re-existir nos territórios tradicionais

 

Os povos indígenas no Brasil vivem cercados por interesses sobre seus territórios. Não apenas no passado “colonial” foram alvo de expropriação, hoje os contínuos interesses capitalistas como o agronegócio, a mineração, a extração de madeira e os grandes empreendimentos reproduzem as formas de acumulação por dependência, fazendo das terras indígenas alvo constante de desterritorialização e reproduzindo um padrão de poder colonial.

Tal situação se agrava diante da não efetivação da promessa constitucional de demarcar os territórios indígenas num prazo de cinco anos a contar da promulgação em 1988. Como se a morosidade não fosse o bastante para causar insegurança às comunidades indígenas, criou-se ainda a tese do marco temporal, na qual se reinterpreta a Constituição para afirmar que os indígenas só teriam direito às suas terras se estivessem nelas na data da promulgação, em 5 de outubro de 1988. Ainda que tal tese tenha sido derrubada no Supremo Tribunal Federal (STF), ao compreender que a Constituição não estabelece tal limitação, a força do agronegócio no Congresso Nacional apresenta a Lei n.º 14701/2023, para regulamentar o art. 231 sobre as terras indígenas.

Diante desse cenário de precariedade da efetivação dos direitos às suas terras, povos indígenas de todo o Brasil organizam as chamadas retomadas. Partindo do entendimento do intenso processo de expropriação de seus territórios, da violência empreendida para retirar indígenas de suas terras e do acesso aos seus modos de produção e reprodução da vida, organizam-se e retornam às terras originárias, construindo o processo das retomadas.

Retomar é retornar aquilo que um dia foi seu, tomar para si a posse da terra, que lhe foi usurpada. Para o cacique Babau Tupinambá: “Retomar é um ritual de recuperar não só a terra: é tomar na mão a vida que foi tirada”. Segundo o professor Tonico Benites, liderança Guarani e Kaiowá, as retomadas são uma reação à violência sofrida, tendo como objetivo frear o processo sistemático de expulsão e dispersão (denominado em guarani de sarambi). Por meio das retomadas, os povos indígenas estão se reconectando às suas terras, ancestralidade, e com isso reproduzindo os seus modos de vida. Por isso, em muitas áreas retomadas, crianças indígenas estão podendo reproduzir seus ritos de passagem e aprender a se relacionar com a terra.

Tanto os Tupinambás na Bahia, como os Guarani e Kaiowá no Mato Grosso do Sul, ou mesmo os Mbya Guarani no Rio Grande do Sul, afirmam que as retomadas são momentos de muita espiritualidade, marcadas por rituais, pelo encontro com seus encantados. O cacique André Benites, da retomada Tekoa Ka’aguy Porã, que resiste há 7 anos em Maquiné, no litoral norte do Rio Grande do Sul, em área estadual da extinta FEPAGRO (Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária), afirma que estar na terra não é só “retomar o território, é retomar a vida, retomar tudo”. Inclusive, uma das atividades recentes na retomada foi a realização da feira da biodiversidade, espaço de troca de sementes e de estabelecimento de conexões com as redes de agroecologia e de economia solidária, integradas na Teia dos Povos. Outro exemplo é a Retomada Tekoha Nhe’engatu, área Mbya Guarani retomada este ano na cidade de Viamão (RS), depois de anos de acampamento na beira da estrada, olhando para suas terras originárias.

As retomadas são efetivamente uma prática política insurgente de acesso ao território. Um ato de resistência a todas as formas de exploração e dominação colonial que se colocam sobre os corpos-território dos povos indígenas no Brasil. Cada território indígena, retomada, é uma terra a menos no mercado de capital. Não à toa, a contraofensiva conservadora tem sido tão dura. Fazendeiros se reúnem em sindicatos rurais, agregam caminhonetes e armas e vão realizar despejos, como a movimentação Invasão Zero. E mesmo no Poder Judiciário, explodem casos envolvendo conflitos na discussão dos direitos originários a suas terras e à propriedade de fazendeiros.

Retomar a terra que lhes foi tirada, devolvendo a terra aos povos que cuidaram dela ao longo de séculos de sua existência. Retomar como ato político de resistir às formas de produzir a vida distintas da lógica do capital. Retomar e cultivar sementes, ancestralidades. Retomar um sonho de uma Constituição que queria efetivar direitos sociais. Retomar é ter esperança de vida, de corpos-vivos e de cultura viva. Apreender os tantos significados de retomar, e o que eles nos inspiram a pensar em como apoiar tais iniciativas, sobretudo aqueles que nutrem no coração um sonho de uma outra integração latino-americana, com escuta, solidariedade, valorização dos saberes e da unidade na diversidade dos povos da Terra.

* Coluna publicada no site da ATBR em 1º de março de 2024 neste link: https://www.brasildefato.com.br/2024/03/01/retomadas-uma-forma-de-re-existir-nos-territorios-tradicionais

Todo apoio à Retomada Guarani Mbyá Nhe`engatu de Viamão (RS)

Nós, Povo Guarani Mbyá, do Rio Grande do Sul, estamos cansados de viver nas margens de nossas terras originárias, dentro de áreas degradas ou em acampamentos de beira de estradas. Em função disso decidimos retomar um pequeno pedaço do nosso grande território ancestral, o qual chamamos de Tekoá Nhe’engatu, localizado no município de Viamão, Rio Grande do Sul.

Com essa retomada também homenageamos ao nosso avô, Turíbio Gomes, que morreu com 101 anos de idade, e todos os nossos anciões e anciãs que lutaram e padeceram pela busca de uma vida mais digna para o povo Guarani Mbyá, eles não conseguiram, ao menos passar alguns de seus dias de existência, dentro da terra demarcada.

Não temos mais paciência. O tempo passa e nossos Xeramoī, como nosso avô Turíbio, e nossas Xejaryi, como a Laurinda, estão morrendo.

Não é justo vermos nossas crianças nascerem e crescerem em situação de profunda vulnerabilidade, sem perspectivas de uma vida tranquila, justa e saudável.

Passamos nossos anos em casas improvisadas – barracos de lonas – sem terra para plantar nossas roças, sem água potável para beber, sem mato e, sequer temos um lugar para construir nossa Opy, casa de Reza. Não aceitamos mais essa dura e degradante realidade.

Diante desse contexto de desrespeito aos nossos direitos fundamentais, decidimos ingressar nessa área em Viamão, fazendo memória de nossos velhos e velhas, que lutaram, mas não puderam ver garantidos os seus direitos.

Por causa deles, que nos inspiram e nos guiam, estamos aqui, nessa Tekoá Nhe’engatu, dizendo que esta terra tem dono.

Tornamos o grito de Sepé Tiaraju, nosso grande líder e guerreiro, o nosso grito por terra e vida.

Requeremos, nesse momento, que a Funai assuma suas obrigações e agilize os procedimentos de demarcações de terras para nosso povo. Que sejam retomados os procedimentos paralisados e que se inicie a demarcação dessa nossa Tekoá Nhe’engatu, agora ocupada pelos Guarani Mbyá.

Também requeremos a presença das equipes da SESAI, responsável pela assistência de saúde. Pedimos o apoio do Ministério Público Federal, aquele que tem o dever de fazer a defesa de nossos direitos, e principalmente do Ministério dos Povos Indígenas, assim como queremos a participação da Defensoria Pública da União, como órgão que nos auxilie nas demandas jurídicas.

Contamos também com apoio das demais comunidades Guarani Mbyá do Rio Grande do Sul e os apoios dos parentes Kaingang, Xokleng e Charrua.
Seguimos todos nas mesmas lutas, por terra, território e justiça. Demarcação já!

Viamão, 14 de fevereiro de 2024.

Retomada Nhe’engatu



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